Economia

Classes populares estão próximas do limite de endividamento

Pesquisa mostra que disposição para contrair novos financiamentos para compra de bens está se deslocando para os consumidores de maior poder aquisitivo

EXAME.com (EXAME.com)

EXAME.com (EXAME.com)

DR

Da Redação

Publicado em 9 de outubro de 2008 às 10h24.

Os consumidores de baixa renda estão perto do limite de endividamento e, por isso, nos próximos meses, tenderão a evitar novas compras baseadas na concessão de crédito. Com a maior parte da renda comprometida com gastos básicos, como habitação e transporte, essas famílias dispõem de 11 a 15% de seu orçamento para compras de bens duráveis e outros artigos que exigem crédito. O problema é que esta fatia de recursos já está bastante tomada por financiamentos anteriores, segundo uma pesquisa do Programa de Administração de Varejo da Fundação Instituto de Administração (FIA).

"Até o segundo trimestre, a intenção de utilizar crediário nas compras concentrava-se nas classes mais populares", afirma Claudio Felisoni de Angelo, coordenador da pesquisa. Agora, a disposição de se endividar está migrando para os consumidores de maior renda. Na pesquisa anterior, por exemplo, que indicou a intenção de compras para o período de abril a junho, 70% das famílias com renda mensal até 390 reais planejavam recorrer ao crediário para comprar bens de linha branca. No trabalho divulgado nesta quarta-feira (6/7), que cobre o período de julho a setembro, a porcentagem caiu para 33%.

Ao mesmo tempo, a parcela de famílias da classe A (renda mensal acima de 7 900 reais) que pretende financiar a compra desses mesmos produtos subiu de 42,9%, na pesquisa anterior, para 100%, nesta (veja tabela abaixo com a intenção de uso de crediário para diversas categorias de bens). Para Luiz Paulo Lopes Fávero, que também coordenou o trabalho, isso mostra que, embora as classes populares sejam as que mais precisem de crédito para expandir o consumo, sua pequena parcela de renda disponível já está quase toda tomada.

"Para as famílias com renda até 390 reais mensais, a parcela disponível para compras programadas é de 40 reais, ou seja, muito pequena", diz. Já as famílias de classe A dispõem de 9,2% de seu orçamento mensal para esse tipo de compra, ou quase 800 reais por mês.

Inadimplência

Um efeito colateral do endividamento dos consumidores mais pobres é o aumento da inadimplência. Felisoni lembra, por exemplo, dados da Serasa que indicam um patamar elevado de cheques sem fundos até maio. Para cada 1 000 cheques compensados, 19,2 foram devolvidos por falta de recursos no mês retrasado. Em maio de 2004, essa proporção era de 16,4 para cada 1 000 compensações.

Além do limite de saturação de crédito das famílias mais pobres, os juros altos praticados pelo comércio em geral são outra causa da inadimplência, segundo Felisoni. "Quanto maior a taxa cobrada, maior também é o risco de não-pagamento", diz.

Demanda reprimida

Mesmo sem poder aumentar seu grau de endividamento, as famílias com menor renda são as que apresentam as maiores intenções de compra o que indica uma certa demanda reprimida nessas camadas de consumidores. Dos entrevistados com renda familiar até 390 reais, 34,1% desejam comprar móveis nos próximos três meses, por exemplo, contra 11,4% das famílias com renda acima de 7 900 reais. Para produtos de foto e ótica, a diferença é ainda maior: 53% contra 0%, respectivamente.

Realizada entre os dias 10 e 22 de junho, a pesquisa ouviu 500 consumidores na cidade de São Paulo. Desse total, 35,4% declararam que não pretendem adquirir nenhum bem durável ou semidurável nos próximos três meses. A porcentagem foi maior que os 31,8% verificados na pesquisa anterior, que mediu a intenção de compras para o período de abril a junho. Entre os que desejam adquirir algum bem, os telefones celulares são o item mais citado (13% das intenções de compra), seguido por materiais de construção (10,6%) e eletroeletrônicos (10%).

No geral, os consumidores estão dispostos a gastar menos em cada compra. Para os equipamentos de informática, por exemplo, os entrevistados planejam gastar, em média, 1 521,43 reais, cifra 14,37% menor que os 1 461,43 reais declarados no segundo trimestre. No caso dos telefones celulares, o tíquete médio baixou 15,5%, de 441,72 reais para 373,28 reais.

Cai o interesse pelo crediário nas famílias mais pobres
(intenção de uso de crédito - em %)
Entre julho e setembro
Entre abril e junho
Segmento
Famílias com renda mensal até 390 reais
Famílias com renda mensal acima de 7 900 reais
Famílias com renda mensal até 390 reais
Famílias com renda mensal acima de 7 900 reais
Linha branca 33 100 70 42,9
Móveis 80 80 64,3 20
Eletroeletrônicos 26,7 100 80 50
Material de construção 31,6 8020 0,0
Informática 0,0 25 20 0,0
Foto e ótica 0,0 0,0 0,0 0,0
Telefonia e celulares 4,0 75 ND 0,0
Cama, mesa e banho 22,2 66,7 16,7 0,0
Autopeças 0,00,0 0,0 25
Automóveis 100,0 0,0 2533,3
Fonte: Provar/FIA
Acompanhe tudo sobre:[]

Mais de Economia

Para investidor estrangeiro, "barulho local" sobre a economia contamina preços e expectativas

Qual estado melhor devolve à sociedade os impostos arrecadados? Estudo exclusivo responde

IPCA-15 de novembro sobe 0,62%; inflação acumulada de 12 meses acelera para 4,77%

Governo corta verbas para cultura via Lei Aldir Blanc e reduz bloqueio de despesas no Orçamento 2024