Economia

Campos Neto sobre juros: “Quanto mais fortes as instituições, mais intenso pode ser o debate”

Presidente do Banco Central disse que há "boa vontade" internacional com o Brasil e que melhoria da credibilidade deve ser prioridade

Campos Neto: é "justo questionar os juros altos", mas BC precisa olhar "ciclo mais longo" (Wilson Dias/Agência Brasil)

Campos Neto: é "justo questionar os juros altos", mas BC precisa olhar "ciclo mais longo" (Wilson Dias/Agência Brasil)

Carolina Riveira
Carolina Riveira

Repórter de Economia e Mundo

Publicado em 14 de fevereiro de 2023 às 11h15.

Última atualização em 14 de fevereiro de 2023 às 12h21.

O presidente do Banco Central, Roberto Campos Neto, afirmou nesta terça-feira, 14, que "é justo questionar os juros altos" e que o debate pode ser aprimorado quanto mais fortes forem as instituições, mas que a prioridade do Brasil deve ser melhorar a credibilidade para atrair investimentos.

Campos Neto participou nesta manhã do CEO Conference, evento organizado pelo BTG Pactual (do mesmo grupo de controle da EXAME). A declaração acontece em meio a debate no governo do presidente Lula sobre se o Brasil deveria alterar suas metas de inflação e se o BC tem condições de reduzir a taxa Selic para menos do que os atuais 13,75%.

"O debate é sempre importante, mas acho que no Brasil a gente não está agora em um período em que seria bom experimentar", disse Campos Neto. Ele afirmou que o principal objetivo, na visão atual do Banco Central, é entender "como a gente faz melhorar a credibilidade."

O presidente do BC disse que há "uma enorme boa vontade" nos fluxos de investimentos para o Brasil e que esse momento pode ser aproveitado se houver credibilidade e instituições fortes.

Para ele, no entanto, não é papel da autoridade monetária interferir na decisão sobre as metas de inflação, embora participe do debate. "É importante respeitar as instituições e jogar com as regras do jogo", disse, afirmando que é o governo quem determina a meta de inflação, via Conselho Monetário Nacional (CMN), e que esse não é um instrumento de política monetária do BC.

Na fala, Campos Neto voltou a defender que a autonomia do Banco Central como ocorre no Brasil desde 2021 é "muito importante" e tem sido mantida em países vizinhos mesmo com mudanças de governo e crises, como no Chile ou no Peru. “Quanto mais fortes as instituições, mais intenso pode ser o debate”, disse.

"É justo questionar os juros altos"

Campos Neto também elogiou o governo em alguns momentos de sua fala e disse que tem havido "boa vontade enorme do ministro Haddad [Fazenda]" ao seguir um plano fiscal e trabalhar um arcabouço a ser apresentado ao Congresso.

O presidente do BC afirmou, ainda, que acredita ser possível consolidar políticas sociais e responsabilidade fiscal, e que faz parte do papel do governo questionar o patamar dos juros e impacto no crescimento.

Campos Neto manteve o tom de conciliação que já havia adotado em entrevista ao Roda Viva, da TV Cultura, na segunda-feira, 13.

"É justo questionar os juros altos, acho que é importante ter alguém que faça esse papel no governo sempre, faz parte do jogo, do equilíbrio natural", disse.

"Acho que quando o juro real está alto, ter um debate sobre por que ele está alto é super legítimo, e é um trabalho do Banco Central esclarecer e melhorar a comunicação."

Mas afirmou, também, que é papel do BC olhar "um ciclo mais longo".

O presidente do BC disse que o Brasil, que iniciou trajetória de alta de juros ainda em 2021, antes dos países desenvolvidos, viu de forma mais adiantada os riscos da inflação global que hoje assola países como EUA e Europa. "Nossa experiência brasileira nos leva a ter algumas vantagens nesse processo", disse.

Pressões inflacionárias continuam, diz Campos Neto

Embora os choques da covid-19 e da guerra na Ucrânia tenham sustentado a tese de que a inflação global é sobretudo de oferta (não sendo, portanto, resolvida somente com alta de juros), Campos Neto afirma que essa teoria é hoje menos clara — como mostra o mercado de trabalho forte nos EUA e a pressão gerada pelo lado da demanda.

O banqueiro citou o fato de os governos terem inserido entre 8 e 9 trilhões de dólares em um PIB global de 80 trilhões, além de cenário de taxas quase zeradas de juros nos países ricos antes da guerra. "Nossa opinião é de que não foi uma coisa clássica de oferta", disse. "Foi um fiscal muito forte e um monetário muito forte, e a gente vê deslocamento das demandas em vários lugares."

Metas de inflação

O cenário global vai impactar o quanto o Brasil terá espaço para começar a baixar os juros sem gerar descontrole na inflação. Atualmente, a meta de inflação do Brasil para 2023 é de 3,25% (com tolerância de 1,5 ponto percentual, isto é, com teto de 4,75%) e de 3% para 2024. Como de praxe, o CMN deve discutir esses valores nos próximo meses.

O Brasil descumpriu a meta de inflação em 2021 e 2022, e o mesmo deve ocorrer em 2023, se as projeções atuais se cumprirem. Descumprimentos sucessivos da meta podem fazer com que as expectativas fiquem desancoradas, fazendo com que juros altos sejam necessários.

O governo ainda não bateu o martelo sobre trabalhar para mudar a meta, mas tem feito o debate internamente, segundo ministros.

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