Economia

Brasil pode repetir fiasco do trânsito sul-africano na Copa de 2014

Especialistas ouvidos pelo site EXAME apontam os principais problemas que precisam ser resolvidos antes da competição

Especialistas alertam que Brasil pode repetir congestionamentos da África do Sul (.)

Especialistas alertam que Brasil pode repetir congestionamentos da África do Sul (.)

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Da Redação

Publicado em 10 de outubro de 2010 às 04h10.

São Paulo e Brasília - Os grandes congestionamentos estão entre os maiores problemas enfrentados pelos torcedores na Copa do Mundo na África do Sul – principalmente na capital Johannesburgo. É preciso sair do hotel horas antes da partida para não perder o espetáculo. Para o doutor em engenharia de transportes e logística e professor da Fundação Dom Cabral, Paulo Resende, o Brasil corre o mesmo risco na Copa de 2014. "Teremos dificuldades principalmente em São Paulo e no Rio de Janeiro", diz.

A opinião do professor Resende não é isolada. Vários especialistas ouvidos pelo site EXAME preveem sérios problemas se não houver planejamento e execução de obras viárias e de transporte público (leia as reportagens específicas sobre São Paulo, Rio de Janeiro e Brasília).

O Rio de Janeiro, por exemplo, teve transtornos no trânsito no dia da estreia do Brasil contra a Coreia do Norte. A enorme quantidade de pessoas tentando voltar para casa ao mesmo tempo gerou congestionamentos. O diretor de desenvolvimento da Companhia de Engenharia de Tráfego (CET) da capital fluminense, Ricardo Lemos, aposta na experiência adquirida com os grandes clássicos no Maracanã para controlar a situação em 2014. "Quando tiver jogo, a quantidade de pessoas indo para o Maracanã não vai ser muito diferente de dias de clássico como "Fla-Flu" (Flamengo x Fluminense). Além disso, o estádio tem um acesso razoável via transporte público. Ônibus, metrô e trem param na porta. Não tem necessidade de usar automóvel", afirma.

Está prevista a construção de um corredor de ônibus do sistema BRT (sigla em inglês para Bus Rapid Transit) ligando a Barra da Tijuca, na zona Oeste, ao Aeroporto Internacional Tom Jobim. Porém, o engenheiro Fernando MacDowell, especialista em trânsito e transportes, diz que a obra não é suficiente. "O trânsito na Copa só não terá problemas se, por exemplo, o metrô do Rio estiver operando conforme o previsto."

 


A situação em São Paulo também é delicada. A exemplo dos moradores de Johannesburgo, que sofriam com congestionamentos antes mesmo da Copa, os paulistanos estão acostumados a enfrentar, diariamente, dezenas de quilômetros de congestionamento. Em dias de jogos, o trânsito piora nos arredores dos principais estádios como Morumbi, Pacaembu e Palestra Itália. Como o Morumbi foi descartado recentemente pela FIFA, os governos estadual e municipal estão revendo algumas prioridades estabelecidas para obras viárias e para o transporte público.

Para os especialistas, a solução mais óbvia e eficiente para a capital paulistana é a expansão dos transportes sobre trilhos. Os planos do Governo do Estado de São Paulo sugerem que há sintonia entre esta opinião e as obras que serão realizadas. Por meio de sua assessoria de imprensa, a Secretaria dos Transportes Metropolitanos informou que o governo pretende ampliar as linhas do metrô e trens até 2014. Os investimentos nos trechos que passarão pelo local em que os jogos ocorrerem serão priorizados. A expectativa é que a malha de trilhos na cidade (somando metrô e trens) passe de 240 quilômetros em 2010 para 420 quilômetros em 2014.

Em Brasília, entre as principais apostas de mobilidade urbana para a Copa de 2014 está a construção do veículo leve sobre trilhos (VLT). A obra, no entanto foi embargada - pela terceira vez - na última sexta-feira (18) por determinação do Instituto do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional (Iphan). Há falhas na documentação e o Iphan alega que parte do metrô leve passa por área tombada da capital federal. O Metrô-DF afirmou que já enviou versões atualizadas dos documentos exigidos pelo instituto e que as obras devem ser retomadas nos próximos dias.

O coordenador de pesquisa do Centro Interdisciplinar de Estudos em Transportes (Ceftru) da Universidade de Brasília (UnB), Joaquim Aragão, acredita que o trecho que liga o aeroporto ao Mané Garrinha (estádio onde ocorrerão os jogos) não deve ficar pronto até o mundial. "Mas isso não causará um pandemônio", disse ele. Para resolver os possíveis problemas com congestionamento na capital nos dias de jogos, uma operação logística que organize o trânsito já deve trazer resultados aceitáveis, avalia Aragão.


Por outro lado, o professor da Fundação Dom Cabral, Paulo Resende, diz que declarar ponto facultativo ou até mesmo feriado na cidade onde o jogo acontecerá para diminuir a quantidade de gente na rua seria uma forma de esconder o problema. "Essa estratégia passaria a impressão de que não existe problema de trânsito, mas isso só serviria para aquele horário. Quando tudo voltasse ao normal, os turistas perceberiam que houve uma certa maquiagem". Resende avalia que a capacidade das vias nas cidades-sedes não suportaria a quantidade de carros na rua. "Há risco de congestionamentos inclusive durante os jogos".

O professor lamenta que o tempo seja curto para construir soluções logísticas de longo prazo. "As cidades não estão pensando em deixar um legado, como acesso metroviário, por exemplo", critica. Receoso, acredita que grandes projetos serão deixados para trás e teme que os problemas sejam resolvidos "no improviso".

Já para o coordenador do Núcleo de Transportes (NUCLETRANS) da Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG), David José Ahouagi, o problema poderá ser resolvido com alternativas atrativas para transporte coletivo. "É difícil falar para quem usa automóvel deixar ou carro na garagem e pegar o ônibus comum sabendo que em horários de pico - como em jogos do mundial - as pessoas ficariam espremidas no coletivo", pondera.

Nas contas do professor da UFMG, os congestionamentos poderiam ser evitados com medidas simples. "Os automóveis normalmente transportam uma ou, no máximo, duas pessoas. Dois carros ocupam o mesmo espaço de um microônibus, com capacidade para 20 pessoas sentadas confortavelmente, podendo ter até TV, ar condicionado etc". O coordenador do NUCLETRANS acredita que os motoristas deixariam seus carros na garagem em troca desse conforto. "Não precisar procurar vagas de estacionamento e ainda evitar o estresse ao volante servem de atrativos", diz Ahouagi.

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