Exportação: menos de 20 mil empresas no Brasil acessm os mercados internacionais, quase o mesmo número observado na Noruega (Germano Lüders/EXAME)
Da Redação
Publicado em 1 de fevereiro de 2015 às 15h49.
O Brasil é um dos países mais fechados entre as maiores economias mundiais e paga um preço alto por isso. Essa é a conclusão de um estudo do economista Otaviano Canuto, ex-secretário de Assuntos Internacionais do Ministério da Fazenda e consultor-sênior do Banco Mundial.
Para ele, o País ficou isolado de uma revolução nos processos globais, na qual as cadeias de valor se fragmentaram, ou seja, com diversas etapas sendo feitas em países diferentes.
De acordo com o levantamento de Canuto, a corrente de comércio brasileira (importações mais exportações) representa apenas 27,6% do PIB, contra uma média de 55% das seis maiores economias globais.
Dado o tamanho da economia brasileira, o economista estima que a corrente de comércio deveria ser de quase 85%. Mesmo levando em conta a dimensão territorial e populacional do País, assim como fatores tradicionalmente associados à abertura comercial, como urbanização e participação da indústria no PIB, o Brasil ainda fica para trás.
O artigo afirma que pouquíssimas companhias brasileiras exportam. São menos de 20 mil empresas acessando os mercados internacionais, quase o mesmo número observado na Noruega.
Entretanto, com uma população de 5 milhões de habitantes, os noruegueses têm uma exportadora por cada 250 pessoas, enquanto no Brasil esse número é de uma para 10 mil. Mesmo dentre os exportadores brasileiros, a concentração é muito grande. Os 25% maiores exportadores respondem por 98% das receitas obtidas.
"A extraordinária falta de abertura do Brasil e seu pequeno número de exportadores estão fortemente relacionados com o fato de que as empresas brasileiras são pobremente integradas nas cadeias de valor transnacionais", diz Canuto no artigo.
Segundo ele, existem diversos fatores para explicar a não inserção do País nas cadeias globais, como as condições logísticas precárias e os altos custos de transação relacionados ao comércio internacional, assim como políticas deliberadas para favorecer o conteúdo local.
Em entrevista exclusiva ao Broadcast, serviço de notícias em tempo real da Agência Estado, Canuto afirma que a chamada política de "campeões nacionais" do Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social (BNDES) colabora para a manutenção do cenário descrito acima. Lembrando que existe um processo natural de sobrevivência das companhias que conseguem auferir ganhos de escala, o economista diz que não há necessidade de ampliar essa assimetria, ainda mais "dada a escassez e o custo de financiamento de longo prazo no Brasil".
Ele defende que é preciso abrir a economia brasileira, permitindo que setores ineficientes sejam expostos à competição internacional e fortalecendo as áreas nas quais o Brasil possui vantagens comparativas. Logicamente, existe o risco de aumento do desemprego em meio a esse processo de transição, pelo menos no curto prazo.
Canuto diz que, primeiramente, o aumento do desemprego é um risco, não certeza. Além disso, a experiência mostra que "quanto menos barreiras se colocam para a transferência de mão de obra, quanto menos foco houver na retenção de empregos que já existem, o custo de ajustamento é mais baixo". Outro fator é que o custo de manter artificialmente setores ineficientes é maior do que o possível custo social, já que os empresários que atuam nessas áreas sabem que não têm muito futuro e acabam abandonando os investimentos.
Ao mesmo tempo, ele afirma perceber uma postura menos defensiva do empresariado brasileiro, que vem mostrando maior receptividade a uma agenda mais agressiva de abertura comercial. "As entidades de classe estão mais conscientes de que isso não será suficiente e que é preciso dar um passo diferente e fortalecer o que tem condições de sobreviver no longo prazo", afirma.
Entre esses setores nos quais o Brasil teria vantagens comparativas, estão aqueles ligados à extração de recursos naturais. Canuto diz que ainda existe um certo "preconceito" com o setor, já que parte dos analistas acredita que a indústria manufatureira seria um caminho melhor porque gera produtos com maior valor agregado e seria uma base mais forte para erigir uma matriz produtiva intensiva em ciência e tecnologia. Mas ele não concorda inteiramente com essa visão.
"Entre uma agricultura sofisticada como a brasileira e a capacidade de prospecção e produção de petróleo em águas profundas que nós temos, em comparação com uma atividade de montagem com base em mão de obra não qualificada como vemos em muitas indústrias, eu prefiro muito mais os primeiros casos", comenta.
Segundo o estudioso, todos os casos de sucesso de integração ao comércio global tiveram de combater pressões políticas que defendiam maior proteção da indústria local. Ele aponta como exemplo o México, que abriu parte de sua economia e não tem apresentado taxas de crescimento muito maiores que o Brasil nos últimos anos. Entretanto, os segmentos que foram expostos à competição internacional são justamente aqueles que mais crescem e geram uma renda per capita muito mais elevada que o Brasil.
"O México só não cresce mais por conta da ineficiência da penetração das mudanças. O país corre a duas velocidades, entre os setores que foram abertos e aqueles que continuaram protegidos. Mesmo assim, a experiência mexicana revela justamente o custo que é para o Brasil se manter fechado", diz Canuto.