Samuel Pessôa: economista alerta sobre a baixa produtividade do trabalhador (Um Brasil/Divulgação)
Repórter de Brasil e Economia
Publicado em 9 de março de 2024 às 11h00.
Última atualização em 9 de março de 2024 às 13h14.
Sistema tributário complexo, infraestrutura deficiente, desequilíbrios fiscais e desindustrialização são apontados por economistas como alguns dos maiores problemas econômicos do país. Para Samuel Pessôa, economista e pesquisador do FGV, o grande obstáculo ao desenvolvimento econômico do Brasil é a baixa produtividade do trabalhador.
"Somos subdesenvolvidos por causa da baixa produtividade. O trabalhador brasileiro produz em uma hora apenas 20% do que o americano produz no mesmo período. É um baita de um problema", diz Pessôa em entrevista para o programa Brasil com S, programa de entrevistas do Canal Um Brasil e da EXAME, com realização da FecomercioSP.
O pesquisador explica que a causa da improdutividade pode ser igualmente dividida em dois motivos. O primeiro estaria ligado às características embutidas ao trabalhador, relacionadas principalmente à educação formal, que não prepararia o trabalhador para lidar com os desafios e exigências do mercado do trabalho.
"A educação de qualidade dá duas coisas para o trabalhador. A primeira é a cognitiva, que seria a capacidade de resolver problemas, raciocínio lógico e comunicação clara, que você aprende nos bancos escolares. E a segunda seriam as habilidades socioemocionais, a capacidade de aguentar frustação, persistência, cálculo prospectivo, capacidade de operar em grupo. Não nascemos sabendo dessas coisas. Segundo os estudos que conheço sobre o assunto, a falta dessas qualidades é responsável por 50% da baixa produtividade do trabalhador", diz.
O segundo problema, porém, estaria ligado às ineficiências que formam o Custo Brasil, que custam anualmente R$ 1,7 trilhão ao país. A cifra se aproxima de um quinto do PIB nacional – 19,5%.
“Temos uma legislação tributária muito complexa que gera um litígio enorme e que demanda um número exorbitante de contadores para que as empresas paguem as obrigações. Gastamos muito dinheiro resolvendo litígios nas esferas administrativa e judicial, fora o que já foi gasto para processar o pagamento de impostos", diz Pessôa. "Isso ‘desvia’ recursos da atividade de inovação tecnológica, de melhora do produto, e, então, a produtividade cai. E isso vale para diversas atividades; há muitas coisas que fazemos porque a regulação é ruim.”
Segundo o economista, a saída para resolver o problema não é simples: passa por melhorar a educação pública, com foco no ensino fundamental e ensino médio, além de medidas como a reforma tributária para melhorar o ambiente para as empresas brasileiras.
"Paramos de alcançar a produtividade do mundo há 40 anos, desde 1980, perdemos o pé lá. E as contas que eu vi, com muita incerteza, mostram que a reforma tributária vai gerar nos 20 anos depois da implementação um ganho do nível de PIB de 20 pontos percentuais acima do que seria se não houvesse a reforma. Então, seria perto de 2050", diz.
Ao analisar os próximos anos do governo Lula, Pessôa vê um cenário promissor, com a queda da inflação dos alimentos, o robusto superávit na conta comercial e aumento na taxa de crescimento do Produto Interno Bruto (PIB) potencial em relação ao previsto pelo mercado inicialmente.
Por outro lado, ele alerta para que a questão fiscal ainda é um risco estrutural do país.
“Quando se olha o ‘pacote Brasil’, estamos melhores. Isso gera um fôlego para que a gente resolva nossas ‘pendengas’ internas. O presidente Lula consegue navegar no terceiro mandato com alguma tranquilidade. Contudo, é evidente que o desequilíbrio fiscal aumentará. O próximo presidente — que, inclusive, pode ser o Lula — terá de lidar com uma dívida pública em 10 ou 12 pontos porcentuais acima do que ele ‘herdou’ de Bolsonaro”, diz.
Sobre a próxima grande reforma necessária para o Estado brasileiro, o pesquisador afirma que existem elementos na Constituição para que a Reforma Administrativa seja levada adiante, sem a necessidade de que se crie uma Proposta de Emenda Constitucional (PEC) para isso, como foi o caso da tributária.
“O que precisamos, então, é pegar ponto a ponto e ver o que não está funcionando. E, talvez, evitar as grandes lutas, tal como o fim da estabilidade, que possivelmente nem seja tão importante. A questão dos supersalários, por sua vez, é uma das brigas que precisamos enfrentar, assim como melhorar o concurso público para selecionar os melhores servidores, não os melhores concurseiros”, conclui.