Economia brasileira: moeda de um real (Marcos Issa/Bloomberg)
João Pedro Caleiro
Publicado em 11 de outubro de 2017 às 13h03.
Última atualização em 11 de outubro de 2017 às 13h14.
São Paulo - Duas estimativas divulgadas nos últimos dias mostram o tamanho do desafio enfrentado pelo Brasil para equalizar as suas contas públicas.
A Instituição Fiscal Independente (IFI), órgão do Senado que monitora o cenário fiscal, divulgou na segunda-feira (09) o seu relatório de outubro com três cenários possíveis.
No mais pessimista, o Brasil cresce apenas 0,3% em 2017 e 0,4% em 2018 e não faz reformas estruturais para conter o aumento de gastos.
O resultado é que a dívida bruta subiria dos atuais 73% para 100% do PIB entre 2020 e 2021. Ou seja, o país teria uma dívida bruta equivalente ao total produzido em bens e serviços no espaço de um ano.
No cenário mais provável, a reforma da Previdência é encaminhada em um prazo maior, o Brasil cresce 0,7% em 2017 e 2,3% em 2018 e a dívida bruta chega a 93,5% do PIB em 2025 para então começar a cair.
"O risco de insolvência fiscal está controlado, mas ele existe", resume o texto assinado pelo diretor-executivo Felipe Salto.
FMI
Na terça-feira, foi a vez do FMI (Fundo Monetário Internacional) lançar um relatório que elevou a previsão de crescimento para o Brasil, de 0,3% para 0,7% em 2017 e de 1,3% para 1,5% em 2018.
Ainda assim, a projeção para a dívida bruta piorou. Nos cálculos do banco, que usa critérios diferentes dos nacionais, a taxa em relação ao PIB iria de atuais 83% do PIB para 96,9% em 2022.
Isso faria o país disparar no ranking dos países com maior dívida bruta relativa: do 40º lugar em 2016 para o 12º lugar em 2022, um salto de 28 posições em apenas 6 anos.
A lista é liderada pelo Japão, com previsão de 233% de dívida em relação ao PIB em 2022, seguido do Líbano com 174% e Grécia com 161% no mesmo horizonte.
Não existe nenhum número seguro ou ideal para o endividamento, e a dívida bruta é um dos principais dados olhados pelas agências de classificação de risco para determinar o risco de calote.
Mas tudo depende do perfil e da trajetória da dívida e se, em última análise, elas estão contribuindo para formar economias sólidas e produtivas.
Os Estados Unidos, por exemplo, estão em 9º lugar mundial com previsão de dívida bruta de 109,6% do PIB em 2022, mas seus títulos seguem como referência de segurança no mundo.
Déficit, teto e Previdência
Os déficits primários do governo brasileiro começaram em 2014 e só vem crescendo desde então. Em agosto, as metas de rombo foram ampliadas de R$ 139 bilhões para R$ 159 bilhões negativos em 2017 e de R$ 129 bilhões para R$ 159 bilhões em 2018.
De acordo com o IFI, a reversão de déficit para superávit primário ocorrerá apenas em 2022 no cenário otimista, em 2024 no cenário-base e em 2028 no cenário pessimista.
Isso ocorre porque há fatores positivos no cenário, como inflação e juros menores, assim como recuperação da atividade e da receita, mas insuficientes para contrabalançar a alta das despesas obrigatórias.
O teto de gastos aprovado no final de 2016 exige que as despesas não podem mais ter altas reais, sendo corrigidas apenas pelo ritmo da inflação do ano anterior.
O problema é que cerca de 90% dos gastos são obrigatórios por lei, forçando o governo a cortar o pouco que está a seu alcance (principalmente investimentos) enquanto o resto cresce por inércia.
"Diante da impossibilidade operacional de cortar 100% dos gastos que compõem a margem fiscal sob o risco de paralisar o funcionamento da máquina pública (shutdown), fica evidente o senso de urgência em torno do avanço da revisão dos gastos obrigatórios", diz o relatório do IFI.
O maior gasto atualmente é a Previdência, que deve atingir 58% de todos os gastos em 2018 com previsão de déficit total de R$ 300 bilhões no sistema.
"Abordar a insustentabilidade dos gastos, incluindo pela reforma do sistema de pensões, é de importância de primeira ordem para restaurar uma confiança mais forte e incentivar um crescimento sustentado no investimento privado", diz o relatório do FMI.
Sempre foi claro que o teto de gastos não sobrevive sem uma reforma da Previdência, "mas não é porque precisa que vai ser feito", resumiu André Perfeito, economista-chefe da Gradual Investimentos, em evento recente.
O enfraquecimento político do governo após as denúncias de corrupção e a proximidade cada vez maior das eleições fazem crescer as apostas de que só será possível aprovar uma reforma da Previdência bem menos abrangente do que aquela aprovada em relatório.