Economia

Setores do governo querem relaxar teto de gastos; Maia e Guedes são contra

A possibilidade de flexibilizar limite de alta de gastos à inflação divide as alas política e econômica do governo Bolsonaro, que sinaliza apoio

Bolsonaro: "Eu vou ter que cortar a luz de todos os quartéis do Brasil, por exemplo, se nada for feito" (Adriano Machado/Reuters)

Bolsonaro: "Eu vou ter que cortar a luz de todos os quartéis do Brasil, por exemplo, se nada for feito" (Adriano Machado/Reuters)

R

Reuters

Publicado em 4 de setembro de 2019 às 11h23.

Última atualização em 4 de setembro de 2019 às 17h30.

São Paulo — O presidente Jair Bolsonaro indicou nesta quarta-feira ser favorável a uma flexibilização do teto de gastos públicos, afirmando que vai ser obrigado a "cortar a luz de todos os quartéis do Brasil" se nada for feito a respeito.

"Temos um Orçamento, tem as despesas obrigatórias, estão subindo. Acho que daqui a dois ou três anos vai zerar as despesas discricionárias. É isso? Isso é uma questão de matemática, nem preciso responder para você, isso é matemática", disse Bolsonaro a jornalistas ao sair do Palácio da Alvorada, ao ser questionado se vai apoiar alguma flexibilização do teto.

"Eu vou ter que cortar a luz de todos os quartéis do Brasil, por exemplo, se nada for feito. Já te respondi", acrescentou.

O teto de gastos públicos foi aprovado pelo Congresso no final de 2016, na gestão de Michel Temer, como forma de limitar o crescimento das despesas à inflação.

Mas diante do aperto nas contas públicas, a Casa Civil e os militares pressionam para que o governo flexibilize a regra. A possibilidade divide as alas política e econômica da gestão Bolsonaro. 

O assunto chegou a ser discutido em reunião da Junta de Execução Orçamentária (JEO), quando o ministro da Economia, Paulo Guedes, afirmou ser contrário às mudanças. A JEO é formada por Guedes e o ministro da Casa Civil, Onyx Lorenzoni. 

A preocupação com o aperto fiscal no grupo político e militar ao redor do presidente cresceu porque, mesmo que o governo consiga ampliar a arrecadação e reduzir o rombo das contas públicas nos próximos anos, o teto de gastos apertado e o avanço das despesas obrigatórias (como o pagamento de salários e aposentadorias) reduzirão o espaço para investimentos em obras e programas do governo, dificultando a estratégia do presidente de deixar a sua marca.

No fim de semana, após a equipe econômica apresentar um Orçamento para 2020, que pode impor um apagão à máquina pública, Bolsonaro admitiu que o arrocho poderá atrapalhar uma tentativa de reeleição em 2022.

Diante desse cenário, o forte bloqueio das despesas e a perspectiva de um Orçamento ainda mais apertado para 2020 estão alimentando a pressão por mudanças no teto.

Essa movimentação tem levado integrantes da equipe econômica a saírem em defesa da manutenção da regra. Já está prevista uma possibilidade de revisão do teto em 2026.

Para a equipe econômica, a própria norma tem saídas em caso de descumprimento, os chamados “gatilhos”, que permitem ao governo, por exemplo, vetar reajustes a servidores e aumentos acima da inflação ao salário mínimo.

Nesta terça-feira, 3, o Estado antecipou que o governo também estuda incluir outras medidas, além das previstas no teto, para acelerar o ajuste. 

Segundo apurou o Estado, Onyx Lorenzoni, em uma das reuniões da JEO, chegou a afirmar que os congressistas apoiariam a mudança. Procurado, ele nega que seja defensor da flexibilização do teto.

A discussão na JEO não evoluiu porque o governo começou a discutir um conjunto de medidas para ampliar o espaço do teto com a revisão de despesas obrigatórias, o que exigirá apoio do Congresso.

A intenção da equipe econômica é abrir um espaço entre R$ 10 bilhões e R$ 20 bilhões. Com isso, o governo consegue ampliar os gastos de custeio e investimentos, chamados de “discricionários”.

A previsão de investimentos públicos é de apenas R$ 19,360 bilhões de reais em 2020, ante patamar já baixo de 27,380 bilhões de reais originalmente estabelecido para este ano.

Para um integrante da equipe econômica, que falou na condição de anonimato, o debate sobre o teto é “normal”, mas ele é maior fora do que dentro do governo. 

De acordo com essa fonte, a questão toda é que qualquer flexibilização do teto significará que o ajuste fiscal, que já é gradual, se tornará mais gradual ainda com riscos nessa estratégia. 

Parte dos economistas, inclusive alguns de orientação mais ortodoxa, passou a defender alterações na regra diante do aperto fiscal.

Mas no entendimento da equipe econômica, para flexibilizar o teto e manter a programação da queda nos rombos sucessivos das contas públicas seria necessário contar com aumento da arrecadação, via crescimento maior do Produto Interno Bruto (PIB), ou aumento de carga tributária com elevação de impostos. Oficialmente, o Ministério da Economia preferiu não se posicionar. 

O presidente da Câmara, Rodrigo Maia (DEM-RJ), diz que é contra. Para ele, abrir o teto significaria gerar uma nova crise fiscal no futuro e o problema não são as restrições e sim as despesas.

“Temos 14% do PIB em previdência, 13% do PIB em funcionalismo e 6% do PIB em juros. Ou seja, 33% do PIB está comprometido, nós temos que reduzir essas despesas. É por isso que tem que manter o teto, impossível mexer, vamos resolver esse problema, o governo encaminha reforma administrativa para ter um estado que custe menos para o cidadão”, afirmou.

O relator da proposta orçamentária para 2020, deputado Domingos Neto (PSD-CE), também disse que a solução para desafogar o Orçamento passa longe de mexer no teto de gastos.

“Não prosperará no Congresso uma flexibilização do teto, porque essa seria a solução mais fácil, mas estamos procurando outro tipo de solução para elevar as despesas discricionárias”, afirmou Neto.

Acompanhe tudo sobre:CongressoJair BolsonaroMilitaresMinistério da Casa CivilOnyx LorenzoniPaulo GuedesPEC do TetoRodrigo Maia

Mais de Economia

Haddad: pacote de corte de gastos será divulgado após reunião de segunda com Lula

“Estamos estudando outra forma de financiar o mercado imobiliário”, diz diretor do Banco Central

Reunião de Lula e Haddad será com atacado e varejo e não deve tratar de pacote de corte de gastos

Arrecadação federal soma R$ 248 bilhões em outubro e bate recorde para o mês