Economia

BC de Tombini, entre a audácia e a tecnocracia

Economista com doutorado pela Universidade de Illinois, o gaúcho Alexandre Tombini acabou sendo o primeiro funcionário do Banco Central a se tornar presidente desde 1997

O presidente do Banco Central, Alexandre Tombini, chega para o seminário sobre Novas Regras de Cartões de Crédito (Marcello Casal Jr./ABr)

O presidente do Banco Central, Alexandre Tombini, chega para o seminário sobre Novas Regras de Cartões de Crédito (Marcello Casal Jr./ABr)

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Da Redação

Publicado em 26 de maio de 2011 às 11h39.

Brasília - Com personalidade introspectiva, fala ponderada e sólida formação acadêmica, o discreto Alexandre Tombini não é exatamente a imagem da ousadia.

Mas ousadia é exatamente o que parece estar sendo exigido do Banco Central, que hoje busca um equilíbrio delicado entre inflação e crescimento, em meio ao cenário internacional incerto e a uma demanda interna ainda bastante aquecida.

De um lado, o BC precisa garantir que os preços não entrem em espiral de alta. O assunto gera arrepios em um país ainda marcado pela história recente de hiperinflação, e o fracasso em lidar com a questão porá em risco o sucesso de todo o mandato da presidente Dilma Rousseff.

De outro lado, Tombini também tem de lidar com pressões de parte da sociedade e do próprio governo que temem ver os juros, que já estão entre os mais elevados do mundo, aumentarem demais e colocarem em perigo o boom econômico.

A missão é difícil, mas, segundo colegas, Tombini, 47, pode ser a pessoa adequada para comandá-la, à frente de um Comitê de Política Monetária que, em sua atual configuração, é visto como menos resistente a riscos do que o liderado por Henrique Meirelles.

Egresso do sistema financeiro, Meirelles era considerado conservador, ainda que tenha recebido críticas pelo fato de o Copom ter talvez se precipitado em suspender o ciclo de aperto monetário promovido em 2010, ano eleitoral.

"Eu acho que é nesse julgamento de riscos que você tem uma alteração", avalia o ex-diretor do BC da era Meirelles Paulo Vieira da Cunha, ao comentar a nova face do Copom.

"Sem dúvida, acho que você tinha no Copom Meirelles, especialmente no próprio presidente Henrique Meirelles, uma pessoa que era muito mais avessa a riscos", acrescenta o economista, hoje sócio do fundo Tandem Global Partners.

Tombini era o nome indicado por Meirelles para sucedê-lo no BC caso o ex-presidente deixasse o governo Lula antes do fim do mandato para concorrer às eleições, como chegou a cogitar seriamente.

Ainda diretor de Normas do BC, Tombini conquistou a confiança do então presidente Luiz Inácio Lula da Silva e da então ministra-chefe da Casa Civil Dilma Rousseff durante a crise global, quando participou de algumas reuniões no Palácio do Planalto para tratar das medidas que estavam sendo adotadas pelo BC para prover liquidez ao sistema financeiro.


Economista com graduação na Universidade de Brasília e doutorado na Universidade de Illinois, o gaúcho Tombini acabou sendo o primeiro funcionário de carreira do Banco Central a se tornar presidente da instituição desde 1997.

No banco, Tombini participou diretamente da implementação do regime de metas de inflação, no final da década de 1990. Mais tarde, teve uma experiência no Fundo Monetário Internacional --entre 2001 e 2005 foi o braço direito do então representante brasileiro no Fundo, Murilo Portugal.

Vieira da Cunha vê o atual Copom, formado essencialmente por funcionários de carreira do governo, totalmente comprometido com o regime de metas. Mas questiona se não há agora uma confiança excessiva nas análises técnicas e nos modelos inflacionários.

"Acho que o Copom não é um lugar para discussão (somente) técnica... Ali é uma discussão mais sobre riscos, sobre os riscos que existem sobre o processo inflacionário", afirma Vieira da Cunha.

Expectativas

Tombini assumiu o BC com a inflação já acelerada, pressionada pela disparada das commodities e pela demanda aquecida com o crescimento da renda e do crédito.

Desde janeiro, o Copom elevou a taxa básica de juros em 1,25 ponto, a 12 por cento ao ano.

Apesar do aperto, a linguagem adotada pelo Copom em seus primeiros comunicados com a sociedade este ano, e a própria decisão de estender o prazo para atingir a meta, reforçaram a imagem de um BC disposto a combater a inflação em ritmo mais gradual que no passado.

"Ele teve que aprender, e acho que aprendeu muito. Cresceu esse lado que eu chamo de político, que é de lidar melhor com o bate bola da comunicação", afirma o economista-chefe do Banco Fator, José Francisco de Lima Gonçalves, acrescentando que houve dificuldades iniciais.

O discurso da presidente Dilma de que o país precisa controlar a inflação e continuar crescendo também levantou dúvidas sobre a independência do BC.

"Eu acho que este governo tem uma meta de crescimento na cabeça", diz Mônica de Bolle, professora de economia da PUC e diretora do instituto Casa das Garças.

Para ela, existe um temor no mercado de que o governo avalie que "se a gente tiver crescendo um pouquinho mais com um pouquinho mais de inflação tudo bem, se a inflação tiver dentro da banda da meta, tudo bem".


"É nesse sentido que eu acho que o Banco Central tem pouca autonomia, não vai ser permitido correr atrás de um objetivo inflacionário se de fato permitir essa meta aí para o crescimento que eu acho que existe." Pessoas próximas a Tombini dizem que ele encara com tranquilidade as preocupações do mercado, e tem segurança na estratégia em curso.

A confiança dos economistas na capacidade de o governo conter a escalada dos preços parou de se deteriorar recentemente, após oito semanas de piora, em meio à expectativa de queda da inflação corrente. Mas economistas afirmam que o cenário à frente ainda é preocupante para a inflação, que, em 12 meses, rompeu o teto de 6,5 por cento.

O prognóstico de economistas é que a inflação vai se retrair nos próximos dois meses, favorecida por fatores sazonais, mas depois volte a ficar vulnerável a um mercado de trabalho aquecido, um cenário externo ainda indefinido e à chamada inércia inflacionárias --mecanismos formais e informais de correção de preços com base na inflação passada.

Comunicação

Dúvidas sobre o papel que as chamadas medidas macroprudenciais teriam no controle da demanda também contribuíram para por em dúvida, no mercado, a disposição do BC de combater a inflação usando mais a taxa de juros.

Em dezembro, o BC elevou os depósitos compulsórios e aumentou o capital exigido dos bancos para concessão de empréstimos de longo prazo ao consumidor. A iniciativa tinha o objetivo declarado de proteger o sistema financeiro do risco de inadimplência, mas o Copom deu destaque, este ano, ao efeito que as medidas estariam tendo sobre a demanda.

"Minha avaliação é positiva quanto às medidas em si e a oportunidade de sua adoção, mas não tão positiva quanto à forma de comunicação", afirmou Murilo Portugal, hoje presidente da Febraban, durante participação recente em chat promovido pela Thomson Reuters.

"Houve alguma confusão quanto aos objetivos. Medidas macroprudenciais são de longo prazo e não de curto prazo e visam reduzir e prevenir riscos no sistema financeiro, não combater a inflação." Desde o mês passado, Tombini vem sendo mais claro em destacar que o BC priorizará seu instrumento tradicional, a taxa Selic, para conter a alta de preços.

Com um ministro da Fazenda que não inspira confiança nos mercados, o conservadorismo de Meirelles foi, no governo passado, um contraponto importante para ancorar as expectativas.

Se o governo atual se mantiver fiel a um maior controle fiscal, esse papel pode ser menos necessário agora. Mas, passados pouco mais de cinco meses, Tombini e o novo Copom ainda estão por consolidar o papel de guardião da estabilidade.

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