Economia

Bangladesh a Berlim: o preço da globalização em uma camiseta

Apenas 0,6% do preço final de uma camiseta vendida na Alemanha foi para o bolso do trabalhador que a fabricou em Bangladesh

Trabalhadoras da indústria têxtil de Dhaka, em Bangladesh (Jeff Holt/Bloomberg)

Trabalhadoras da indústria têxtil de Dhaka, em Bangladesh (Jeff Holt/Bloomberg)

João Pedro Caleiro

João Pedro Caleiro

Publicado em 18 de agosto de 2015 às 12h10.

São Paulo - Uma camiseta vendida por 29 euros em uma loja na Alemanha rendeu apenas 18 centavos para o trabalhador que a produziu em uma fábrica em Bangladesh.

Mais da metade do valor do produto é agregado na etapa final, com imposto (4,63 euros) e margem do varejo (12,37 euros), de acordo com um estudo recente do Fórum Econômico Mundial com a consultoria Accenture.

Bangladesh tem a segunda maior indústria têxtil exportadora do mundo, atrás apenas da China, e anunciou recentemente que quer dobrar seus números para US$ 50 bilhões até 2021.

No entanto, sua força de trabalho do setor (formada por 85% de mulheres) ganha apenas 14% do que seria considerado um salário de subsistência - capaz de sustentar o indivíduo e mais um adulto ou duas crianças.

Este número não se mexeu entre 2001 e 2011, o que representou uma queda de 5% em termos reais. A título de comparação, o salário de um trabalhador chinês do mesmo setor passou no mesmo período de 16% para 36% do salário de subsistência.

Isso significa que em 12 anos, um chinês do setor têxtil pode esperar receber um salário considerado suficiente. Na Índia, o ritmo atual prevê uma espera de 122 anos. Em Bangladesh, esta perspectiva nem existe.

E o pagamento no país ainda é uma fração do próprio salário mínimo legal, o menor do mundo, mesmo depois de um aumento de 77% no final do ano passado aprovado após protestos. 

Isso sem falar nas condições insalubres de trabalho. Em abril de 2013, o desabamento do edifício Rana Plaza, com 8 andares repletos de oficinas têxteis, matou mais de 1.100 pessoas.

Desde então, as grandes marcas ocidentais do setor criaram um fundo para ressarcir as vítimas e criaram grupos para inspecionar as plantas de produção.

As "vilas" têxteis incluídas no novo plano de exportação, como da cidade portuária de Chitaggong, devem ser (pelo menos em teoria) mais seguras, mais organizadas e mais fáceis de serem monitoradas.

Por um lado, o desenvolvimento da indústria têxtil gerou empregos e reduziu a pobreza em Bangladesh. O uso de mão-de-obra barata e abundante em plataformas de exportação foi um dos responsáveis pela redução brutal da pobreza na China (e no mundo).

Por outro lado, está claro que o modelo atual dos "sweatshops" cobra um custo humano alto demais para garantir o preço baixo que os consumidores ocidentais estão dispostos a pagar.

Espera-se que as grandes empresas assumam responsabilidade pela segurança e subsistência de seus trabalhadores, mesmo inseridas em um ambiente altamente competitivo com busca incessante de custos baixos.

A globalização não tem resposta pronta para estes dilemas.

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