Na proposta do governo, a exoneração por condenação se restringe ao caso de "ato de improbidade administrativa ou de crime cuja pena acarrete, ainda que temporariamente, a proibição ao acesso a cargos públicos" (Gil Ferreira/ Agência CNJ/Divulgação)
Reuters
Publicado em 12 de abril de 2019 às 17h47.
Última atualização em 12 de abril de 2019 às 17h51.
Brasília — O projeto de autonomia do Banco Central elaborado pelo governo Jair Bolsonaro afrouxou as possibilidades de exoneração do presidente e dos diretores da autarquia na comparação com o substitutivo que estava sendo negociado com o Congresso anteriormente, deixando de mencionar como motivos suficientes a condenação por ocultação de bens e sonegação fiscal, dentre outros crimes.
Agora, a exoneração por condenação — mediante decisão transitada em julgado ou proferida por órgão colegiado — se restringe ao caso de "ato de improbidade administrativa ou de crime cuja pena acarrete, ainda que temporariamente, a proibição ao acesso a cargos públicos".
No substitutivo do deputado Celso Maldaner (MDB-SC) que vinha sendo negociado pelo governo até então, a exoneração também era prevista em caso de "crime falimentar, de lavagem ou ocultação de bens, direitos e valores, de sonegação fiscal, de prevaricação, de corrupção ativa ou passiva, de concussão, contra as finanças públicas, a economia popular, a ordem econômica, a fé pública, a propriedade ou o Sistema Financeiro Nacional".
Na véspera, o governo divulgou o envio de um novo projeto para corrigir o chamado "vício de iniciativa" de texto relatado por Maldaner, que havia sido originalmente apresentado pelo hoje presidente da Câmara, Rodrigo Maia (DEM-RJ), em 2003.
A investida teve como objetivo evitar eventuais contestações jurídicas, já que a Constituição determina que projetos que alteram a estrutura do Executivo precisam ser enviados pelo próprio Executivo.
Em comum, os dois projetos também preveem exoneração dos dirigentes a pedido, em situação de enfermidade incapacitante e quando for apresentado "comprovado e recorrente desempenho insuficiente para o alcance dos objetivos do Banco Central do Brasil".
Mas a nova proposta do governo traz outras novidades.
Uma delas é a que a diretoria colegiada fixará os critérios para o provimento de funções gratificadas de exercício privativo dos membros das carreiras do BC.
Outro trecho novo é o que formaliza que é de competência privativa do BC "efetuar, como instrumento de política cambial, operações de compra e venda de moeda estrangeira e operações com instrumentos derivativos no mercado interno, consoante remuneração, limites, prazos, formas de negociação e outras condições estabelecidos em regulamentação por ele editada".
Atualmente, o BC já atua no mercado de câmbio por meio dos chamados contratos de swaps, instrumentos derivativos que permitem a troca de rentabilidade dos ativos. O BC já realizou no passado operações no mercados à vista e a termo.
Questionado sobre os acréscimos no texto, o BC informou que o substitutivo do Maldaner não foi apresentado formalmente e que o projeto de lei da Casa Civil ainda não é público, razão pela qual não poderia comentar.
A Reuters comparou os textos após a Casa Civil tornar o projeto de autonomia do BC público às 20h49 de quinta-feira. Depois disso, a Casa Civil chegou a dizer que uma "pequena modificação" seria feita no texto, mas voltou atrás e confirmou que ele correspondia ao projeto final do governo.
Assim como no texto de Maldaner, o projeto do governo segue prevendo o uso pela autarquia de depósitos voluntários à vista ou a prazo das instituições financeiras, que deverão funcionar como um instrumentos alternativos às compromissadas para gestão de liquidez nos mercados, abrindo caminho para redução da dívida bruta.
Em 2017, o governo do ex-presidente Michel Temer chegou a enviar um projeto de lei que versava exclusivamente sobre os depósitos, mas o texto não avançou no Congresso.
Da mesma forma, a nova proposta do governo continua fixando um mandato de quatro anos para o presidente do BC, com início no dia 1º de março do segundo ano de mandato do presidente da República. Para os oito diretores, o texto manteve mandatos de quatro anos com inícios diferentes, numa escala de dois diretores a cada ano de mandato presidencial.
A ideia, com o desenho, é resguardar a independência dos dirigentes da autarquia, descasando sua permanência no cargo com a do ocupante do Palácio do Planalto.
Em Washington (EUA), o presidente do BC, Roberto Campos Neto, disse nesta sexta-feira que o projeto é "superimportante" e alinha o país às melhores práticas internacionais.
"Existe hoje um prêmio de risco na parte longa da curva de juros, existe um prêmio de risco na incerteza da política monetária ter uma influência do ciclo político, e quando você faz isso (autonomia formal), você desfaz o vínculo do ciclo político com o ciclo de política monetária", disse.
"Isso reduz esse prêmio. Reduzindo esse prêmio te permite ter uma taxa de juros estrutural mais baixa, que beneficia todo mundo."
(Com reportagem adicional de Lisandra Paraguassu)