Economia

As agruras de Joaquim Levy, o estranho no ninho

As dificuldades enfrentadas por Levy refletem o abismo existente entre sua visão liberal da economia e a visão social do Partido dos Trabalhadores

O ministro da Fazenda, Joaquim Levy: Levy tenta emplacar medidas que são o oposto do que foi defendido pelo PT nas eleições (Simon Dawson/Bloomberg)

O ministro da Fazenda, Joaquim Levy: Levy tenta emplacar medidas que são o oposto do que foi defendido pelo PT nas eleições (Simon Dawson/Bloomberg)

DR

Da Redação

Publicado em 25 de maio de 2015 às 16h31.

Pesaram no mercado nesta manhã as notícias relacionando a ausência do ministro da Fazenda, Joaquim Levy, no anúncio do orçamento na sexta-feira, a um suposto descontentamento do ministro com o corte de gastos, que veio ligeiramente abaixo do piso que ele vinha defendendo.

As dificuldades enfrentadas por Levy refletem o abismo existente entre sua visão liberal da economia e a visão social do partido da presidente Dilma.

É claro o desconforto de Levy, que tenta emplacar medidas de corte de gastos que são exatamente o oposto do que foi defendido por Dilma na campanha por sua reeleição.

O dólar, que vinha oscilado ao redor de R$ 3,00 nas últimas semanas, voltou a superar R$ 3,10, atingindo o maior nível em mais de um mês.

A pressão do câmbio, contudo, refletiu mais as preocupações com a capacidade de o ministro tocar o ajuste fiscal do que uma aposta em sua saída do governo, uma hipótese extrema que poderia gerar oscilações muito maiores no dólar, assim como na bolsa e nas taxas de juros.

Para o economista José Márcio Camargo, professor da PUC-RJ e economista-chefe da Opus Gestão de Recursos, os receios do mercado com a falta de apoio ao ajuste fiscal que Levy tenta implementar se justificam.

“Há muito pouco comprometimento do governo e do PT com o ajuste. Se com apoio já é difícil aprovar o ajuste, sem o comprometimento do governo é praticamente impossível”.

Camargo considerou uma ’’picuinha’’ o fato de o corte do orçamento ter ficado em R$ 69,9 bilhões, quando Levy defendia de US$ 70 bi a US$ 80 bi.

Também considerou preocupante o fato de o vice-presidente Michel Temer não ter sido chamado para uma reunião supostamente destinada a discutir a coordenação política.

Camargo prevê queda de 1,5% para o PIB este ano. Para ele, as chances de o Brasil voltar a crescer ainda em 2015, como previu o ministro do Planejamento, Nelson Barbosa, são praticamente nulas.

“Estamos entrando em uma recessão muito forte. Os juros continuam subindo contra uma inflação que segue acima do teto da meta. E não há razão para o setor privado investir com esta enorme capacidade ociosa”.

Os obstáculos a Levy mostram que o ajuste deste ano ocorre em cenário muito mais difícil do que em 2003, quando Lula conquistou a confiança surpreendendo o mercado com uma política ortodoxa comandada por Antonio Palocci na Fazenda e Henrique Meirelles no BC.

Também ajudou em 2003, diz Camargo, o fato de Lula, ainda durante a eleição, ter assinado a Carta ao Povo Brasileiro, reafirmando o compromisso com a estabilidade econômica.

Isso teria ajudado a superar o principal desafio da época, que era a falta de confiança dos investidores no PT.

“Em 2003 a crise era de expectativas. Hoje o problema maior são os fundamentos”.

O principal fator que ajudou o ajuste 12 anos atrás e que falta hoje, segundo Camargo, foi a presença de Palocci na Fazenda no governo Lula.

Mesmo comandando uma equipe que incluia nomes ortodoxos, como o próprio Levy no Tesouro, Palocci era petista, o que tornou mais fácil ao partido aceitar o ajuste. “Hoje o ajuste é tocado pelo Levy, formado em Chicago e que é estranho ao PT”.

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