Economia

Análise: Projeção de juros vai a 15%, mas expectativas para inflação seguem desancoradas até 2027

Primeiro boletim Focus divulgado após Gabriel Galípolo assumir definitivamente a presidência do BC mostra que o mercado não espera uma trégua no ritmo de alta dos preços

Banco Central: autoridade monetária sinalizou choque de juros e taxa deve chegar a 14,25% em março. Entretanto, ação enérgica de diretores do BC não tem sido suficiente para ancorar expectativas (Leandro Fonseca/Exame)

Banco Central: autoridade monetária sinalizou choque de juros e taxa deve chegar a 14,25% em março. Entretanto, ação enérgica de diretores do BC não tem sido suficiente para ancorar expectativas (Leandro Fonseca/Exame)

Antonio Temóteo
Antonio Temóteo

Repórter especial de Macroeconomia

Publicado em 6 de janeiro de 2025 às 11h23.

Última atualização em 6 de janeiro de 2025 às 11h29.

A mediana das expectativas dos analistas consultados pelo Banco Central (BC) para a Selic aponta que a taxa terminará 2025 em 15%. A alta nas projeções de mercado ocorreu após o choque de juros prometido pelo Comitê de Política Monetária (Copom), com uma alta da taxa para 14,25% em março já contratada. Apesar da ação mais enérgica da diretoria colegiada do BC, as expectativas de inflação seguem desancoradas.

O primeiro boletim Focus divulgado nesta segunda-feira, 6, após Gabriel Galípolo assumir definitivamente a presidência do BC, mostra que o mercado não espera uma trégua no ritmo de alta dos preços.

Para 2025, a expectativa é que o Índice de Preços ao Consumidor Amplo (IPCA) termine o ano em 4,99% a 12ª alta consecutiva na estimativa. Para 2026, a projeção é de 4,03% –a segunda alta consecutiva –  e, para 2027, 3,90% a quinta alta consecutiva.

Expectativas desancarodas são a sinalização clara do mercado de que o BC não cumprirá sua missão institucional de garantir o poder de compra de moeda. E o remédio amargo para ancorar as estimativas é aumentar os juros.

Raiz do problema

O processo de desancoragem das expectativas no Brasil começou em abril de 2024, quando o governo flexibilizou o arcabouço fiscal, com a mudança das metas fiscais dos próximos anos. A previsão inicial era de zerar o déficit público no ano passado e essa meta foi adiada para 2025.

Além disso, a gestão petista se comprometeu em alcançar superávits consecutivos de 0,25%, 0,5% e 1% do Produto Interno Bruto (PIB), respectivamente, nos anos de 2026, 2027 e 2028. Essa decisão foi mal recebida pelo mercado e se refletiu nas expectativas de inflação e no preço do dólar.

No mercado, a percepção de analistas, investidores, economistas e banqueiros é a de que o governo não está comprometido em controlar o ritmo de crescimento dos gastos públicos. Como consequência, a trajetória de elevação da dívida pública segue preocupante.

A última projeção do Tesouro Nacional, divulgada em 16 de dezembro de 2024, aponta que a dívida bruta alcançará 81,8% em 2027, uma alta de 2,1 ponto percentual em relação à estimativa de abril. Depois, o endividamento entraria em trajetória de queda, chegando a 75,6% do PIB em 2034, segundo as contas oficiais.

Com base nas estimativas do governo, o aumento da dívida pública entre 2023 que correspondeu a 73,8% do PIB e 2027 será de 8 pontos percentuais.

No mercado, entretanto, os economistas esperam um crescimento explosivo da dívida pública. A mediana das expectativas no Boletim Focus projeta que o endividamento correspondeu a 78,3% do PIB em 2025, subirá para 82% em 2025, para 85,3% em 2026, para 87,4% em 2027 e chegará ao pico de 95,1% em 2033.

Com base nas projeções do mercado, entre 2023 e 2027, a dívida pública crescerá 13,6 pontos percentuais.

Gasto público pressiona a inflação

No Brasil, o crescimento do gasto público é uma pressão direta para elevar a inflação. Os reajustes reais do salário mínimo, que também revisam os valores de benefícios previdenciários, trabalhistas e assistenciais, são parte importante desse processo.

Com renda média baixa, os brasileiros tendem a não poupar ou economizar pouco. Com isso, os rendimentos são direcionados quase que exlcusivamente para o consumo. Nesse processo, os preços de produtos e serviços também são revisados para cima pelos empresários, sem considerar os movimentos de choques de oferta que ocorrem, sobretudo, no preço de alimentos. Quebras de safra decorrentes de chuvas ao secas, por exemplo, encarecem o preço da comida.

Para piorar, a desconfiança do mercado com o governo tem se traduzido no encarecimento do dólar. Os temores com a futura gestão de Donald Trump pressionam o preço da moeda estrangeira. Mas o risco fiscal doméstico levou a real a ser a moeda que mais se desvalorizou no mundo no passado recente.

Com dólar mais caro, os empresários tendem a repassar esse custo para o valor de produtos e serviços. O encarecimento do dólar afeta o preço da comida, de máquinas e equipamentos importados pela indústria e de outros produtos que podem ser fabricados no país, mas também possuem componentes comprados de outros países.

Com esse ciclo perverso, resta ao BC subir os juros e torcer para que o governo se convença da necessidade de perseguir, com medidas claras, o equilíbrio das contas públicas.

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