Economia

A difícil missão dos economistas em tempos de crise

60º aniversário de regulamentação da profissão no Brasil é comemorado neste sábado (13)

"Os economistas não são pitonisas", diz presidente da Ordem dos Economistas do Brasil (Divulgação/Ordem dos Economistas do Brasil)

"Os economistas não são pitonisas", diz presidente da Ordem dos Economistas do Brasil (Divulgação/Ordem dos Economistas do Brasil)

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Da Redação

Publicado em 13 de agosto de 2011 às 08h12.

São Paulo – Há exatos 60 anos, a profissão de economista era regulamentada no Brasil. Desde então, sempre no dia 13 de agosto, é comemorado o Dia do Economista.

A celebração deste ano, assim como aconteceu em vários anos, se dará em meio a turbulências no exterior e dúvidas sobre os impactos no Brasil. É principalmente em tempos de crise que a opinião desse profissional é muito ouvida.

É comum ver economistas sendo criticados por erros em suas estimativas, como se a Economia tivesse a obrigação – em alguns casos, talvez transmita uma equivocada pretensão – de ser precisa como a Engenharia.

Embora tenha o auxílio de instrumentos matemáticos, estatísticos e econométricos na elaboração de cenários e projeções, a Economia é uma ciência da área de Humanas e lida com o comportamento imprevisível das pessoas.

Neste Dia do Economista, EXAME.com entrevista o presidente da Ordem dos Economistas do Brasil, Manuel Enriquez Garcia, 69 anos, que acaba de assumir o comando da entidade mais antiga da categoria, criada em janeiro de 1935 nas salas de aula da Faculdade de Ciências Econômicas de São Paulo.

Garcia, que é professor da Universidade de São Paulo, fala sobre a difícil missão dos economistas em tempos de crise e como eles deveriam agir quando as projeções precisam ser alteradas.

EXAME.com – Qual é o papel dos economistas em tempos de crise?

Manuel Enriquez Garcia – Imaginando que estamos todos dentro de um navio, um bom economista teria um lugar nobre, lá no mastro, de onde ele poderia enxergar mais longe e, com senso crítico e de justiça, apontar para a sociedade os melhores caminhos que deveriam ser seguidos. Esse é o nosso papel.


EXAME.com – Qual é a maior dificuldade na elaboração projeções?

Garcia – A maior dificuldade é a assimetria de informações, ou seja, cada pessoa tem apenas uma parte do conjunto dos dados e há grupos com informações diferentes ou até mesmo privilegiadas. Em tempos de crise, a dificuldade aumenta porque os dados são restritos e defasados. Olhamos sempre, infelizmente, pelo retrovisor. Quando queremos olhar um pouco melhor para frente, está tudo embaçado.

EXAME.com – A Economia é da área de Humanas, mas utiliza modelos matemáticos, estatísticos e econométricos. Qual peso deve ser dado a eles?

Garcia – Tem que haver uma mescla de tudo. Em primeiro lugar, precisamos conhecer o passado para saber como a população reagiu a determinadas medidas. Se olharmos outros povos ao longo do tempo, veremos que as pessoas sempre reagem da mesma maneira. Então, o conhecimento da história é sempre importante para um melhor entendimento do presente. A matemática, principalmente a estatística, que nós conhecemos como econometria, é que permite formular modelos, que são uma forma de formular pensamentos. O economista não pode ficar apenas no ‘achismo’.

EXAME.com – Os economistas não se arriscam demais quando fazem projeções muito específicas?

Garcia – O correto é o economista dizer: ‘De acordo com as previsões do meu modelo, eu intuo isso ou eu concluo isso com uma determinada probabilidade.’ Porém, o modelo pode ter falhas já que ele é abastecido apenas com informações do passado e nem sempre completas. Ninguém pode dizer que acerta sempre, nem os ganhadores do Prêmio Nobel.”

EXAME.com – Como o senhor reage quando ouve críticas aos economistas? Elas são justas?

Garcia – Muitas vezes as críticas são verdadeiras. O que não se pode é dar ao economista um papel que ele, na verdade, não tem. Ele não é uma pitonisa, ele não tem o poder de predizer o futuro. Ele, sim, elabora modelos e se o modelo é bem sucedido, ele vai ter sucesso nas suas explicações. A função do economista é mostrar as tendências, é dizer que o futuro não é cor de rosa, que nuvens negras estão no horizonte, e que isso pode implicar perdas enormes para alguns e oportunidades de ganhos para outros.”


EXAME.com – Há momentos na Economia em que é possível avaliar um mesmo dado sob dois pontos de vista: um positivo e um negativo. É a história do copo "meio cheio" ou "meio vazio". Neste momento, como o senhor avalia o cenário econômico para o Brasil?

Garcia – O meu copo está meio vazio, mas eu saliento que a minha análise não é pontual. Eu observo que nos próximos 4 ou 5 anos haverá um encolhimento generalizado das economias mais ricas do planeta e, consequentemente, vai haver uma queda generalizada da demanda. Neste cenário, o Produto Interno Bruto brasileiro tende ficar entre 2,5% e 2,8% nos próximos anos. Agora, se o cenário mudar, a gente é obrigado a mudar também (as projeções).

EXAME.com – Como o economista deve agir se perceber que errou?

Garcia – Se acontece um fato novo, o economista precisa dizer que tinha um modelo que apontava em uma determinada direção mas, com as mudanças, se vê na obrigação de rever as suas conclusões que não vão mais se concretizar.”

EXAME.com – O senhor acredita que as novas gerações de economistas que estão saindo das faculdades serão mais otimistas do que a sua geração por não ter vivenciado tantas “loucuras” na economia brasileira?

Garcia – Pode ser que sim. A vantagem da experiência é você poder comparar o quadro atual com as situações já vivenciadas, sabendo o que deu certo e o que deu errado. Com o passar dos anos, é natural que você fique mais conservador. Os jovens são voluntariosos, o que tem o seu lado bom. O ideal é ouvir os mais velhos e os mais novos para formar a opinião a partir de uma mescla dessas avaliações.

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