Retrato de Deng Xiaoping em Shenzhen, na China: foi ele quem disparou o processo de reformas e abertura (Qilai Shen/Bloomberg)
João Pedro Caleiro
Publicado em 18 de dezembro de 2018 às 15h20.
As opiniões a respeito dos próximos 40 anos de “reforma e abertura” da China têm muito a ver com os benefícios obtidos nos primeiros 40.
Um grupo diverso de cidadãos -- jovens e idosos, ricos e pobres, trabalhadores e aposentados -- deu opiniões divergentes sobre política antes do discurso do presidente Xi Jinping pelo 40º aniversário do período, na terça-feira.
Os sentimentos deles em relação às reformas históricas realizadas por Deng Xiaoping e a confiança no futuro da China mostraram grande conexão com o aumento de suas fortunas econômicas como resultado dessa abertura.
Apesar de as políticas terem tirado mais de 700 milhões de pessoas da pobreza, a crescente desigualdade de riqueza está virando uma questão cada vez mais problemática para os líderes chineses.
E no momento em que o país lida com a desaceleração econômica e a guerra comercial com os EUA -- até mesmo os que foram bem-sucedidos graças às reformas de Deng mostraram cautela ao responder se o crescimento pode ser sustentado.
Faca de dois gumes
Com a reforma da China, Zhi Xinggen, antes produtor de arroz, virou empreendedor e tem uma fábrica de autopeças em sua cidade, na província de Jiangsu.
“Os agricultores das cidades vizinhas já não se preocupam em colocar comida no estômago, e alguns estão ricos graças à reforma”, disse Zhi, que está na casa dos 60 anos e é dono de uma pequena fábrica.
Mas o progresso foi uma faca de dois gumes, alcançado com o “custo da poluição ambiental” e muitas fazendas desapareceram. Ele foi prejudicado pela desaceleração econômica do país, já que a fraca demanda interna, o aumento do custo da mão de obra e a dificuldade de acesso a empréstimos bancários dificultam a expansão de seus negócios.
’Melhor ainda’
Mi Ruiliang, funcionário público aposentado que planeja assistir ao discurso em uma reunião local do partido, disse que as mudanças alcançadas com a reforma são “como um sonho”.
“Antes, o entretenimento era assistir sempre aos mesmos filmes, às mesmas óperas, sempre, sempre. Tudo era racionado, faltava de tudo”, disse. “Acho que as coisas serão ainda melhores nos próximos 40 anos sob a liderança de Xi. É por isso que os americanos estão tão preocupados.”
’Deixado para trás’
Um mecânico de bicicletas chamado Hou conta uma história diferente. Hou, que preferiu não informar o nome completo, tem uma oficina de conserto de bicicletas nos hutongs de Pequim -- bairros tradicionais feitos de becos estreitos e casas precárias -- que existe há cerca de 80 anos. O pai a abriu antes de a revolução comunista de 1949 praticamente eliminar as empresas privadas na China.
“Essa reforma e abertura foi como dar um passo para a frente e outro para trás”, disse Hou. “Os poderosos e os espertos puderam realmente enriquecer. Outros ficaram para trás.”
Rural x urbano
Qin Jiner, 50, disse que os benefícios da reforma foram muito mais sentidos nas cidades maiores do que em sua pequena cidade, na província de Hebei.
Ela ganha três vezes mais trabalhando meio período como faxineira em Pequim do que os integrantes de sua família que plantam milho e trigo na cidadezinha. A colheita deste ano rendeu apenas 7.000 yuans (US$ 1.014), já que os preços dos grãos caíram, disse ela.
“Ainda não há aquecimento na nossa cidade e os agricultores não ganham aposentadoria, como os moradores das cidades, quando envelhecem”, disse Qin. Após décadas de reforma, “a geração mais jovem quer morar nas cidades, não gosta do campo.”