Economia

25% do dinheiro de contas inativas do FGTS foi usado para compras

Segundo economista, se o cenário econômico não estivesse tão complicado, apenas o varejo teria absorvido mais de 40% dos recursos do FGTS

Saques do FGTS: dos R$ 44 bilhões sacados das contas inativas, 25% chegaram aos caixas dos varejistas (Fabio Rodrigues Pozzebom/Agência Brasil)

Saques do FGTS: dos R$ 44 bilhões sacados das contas inativas, 25% chegaram aos caixas dos varejistas (Fabio Rodrigues Pozzebom/Agência Brasil)

EC

Estadão Conteúdo

Publicado em 23 de agosto de 2017 às 11h45.

Rio de Janeiro - Os saques nas contas inativas do Fundo de Garantia do Tempo de Serviço (FGTS) injetaram R$ 10,8 bilhões no comércio varejista, segundo cálculos da Confederação Nacional do Comércio de Bens, Serviços e Turismo (CNC) obtidos com exclusividade pelo Estadão/Broadcast.

Do total de R$ 44 bilhões sacados das contas inativas entre março e julho deste ano, 25% chegaram aos caixas dos varejistas. Quatro entre oito segmentos tiveram impacto relevante nas vendas, absorvendo 86% dos recursos destinados pelos trabalhadores às compras: vestuário e calçados (R$ 4,1 bilhões); hipermercados e supermercados (R$ 2,8 bilhões); artigos de uso pessoal e doméstico (R$ 1,3 bilhão); e móveis e eletrodomésticos (R$ 1,2 bilhão).

"Esse dinheiro do FGTS foi totalmente inesperado. Fiz uma viagem que não estava nos planos e comprei uns móveis para a casa nova, porque calhou de estarmos de mudança na época do saque", contou o empresário Daniel Tambarotti.

Ele comprou mesa e estante com parte do FGTS acumulado durante os oito anos no último emprego, deixado em novembro de 2016 para investir no próprio negócio. "Eu já estava financeiramente organizado há alguns anos. Não tinha dívidas. Gastei parte do dinheiro, mas vou guardar uns 40% que sobraram", relatou o empresário.

A destinação de recursos do FGTS para a aquisição de bens no comércio poderia ter sido mais expressiva, na avaliação do economista Fabio Bentes, da Divisão Econômica da CNC. O varejo ampliado - que inclui veículos e material de construção - faturou R$ 770 bilhões nos meses de saques do FGTS. No entanto, apenas 1,4% desse montante foi proveniente das contas inativas.

"Se você dá R$ 100 na mão do brasileiro, ele gasta R$ 90. Ele não gastou esses R$ 90,00 porque estava muito endividado. As pessoas aproveitaram esse recurso extraordinário para limpar o nome, reduzir o endividamento. A crise fez com que sobrasse pouco para o varejo", disse o economista da CNC.

Segundo Bentes, se o cenário econômico não estivesse tão complicado, apenas o varejo teria absorvido mais de 40% dos recursos do FGTS. "Somando com o que seria gasto em serviços, esse montante encostaria em 85% do total sacado."

Apesar do impacto relativamente modesto, os recursos do FGTS devem fazer o consumo das famílias voltar ao terreno positivo pela primeira vez após nove trimestres consecutivos de retração. O consumo das famílias cresceu 0,6% no segundo trimestre em relação ao mesmo período de 2016, segundo estimativa do Monitor do PIB, divulgado esta semana pela Fundação Getulio Vargas (FGV).

De acordo com a FGV, o consumo de bens não duráveis aumentou 0,5% no segundo trimestre, enquanto o consumo de bens semiduráveis avançou 7,3% e o consumo de bens duráveis subiu 3,8%. O coordenador do Monitor do PIB, Claudio Considera, acredita que os recursos inativos serviram para que as famílias colocassem as contas em dia e então pudessem adquirir novos financiamentos, especialmente no caso de bens de consumo duráveis.

A CNC ressalta, porém, que a recuperação parcial do varejo em 2017 é reflexo também da desaceleração no ritmo de aumento dos preços e melhoria das condições de crédito. "A prestação do crédito voltou ao patamar que o consumidor pagava em setembro de 2015. Ninguém imaginava que os aumentos nos preços livres ficariam tão baixos, então a inflação menor é uma boa notícia também. Mas o FGTS entra nessa panela sim, ajudou um pouquinho nesse momento de virada do varejo", completou Bentes.

O estudo da CNC usou como base o volume de vendas e preços medidos pela Pesquisa Mensal de Comércio, do IBGE; indicadores do Cadastro Geral de Empregados e Desempregados (Caged) do Ministério do Trabalho; e informações sobre concessões de crédito ao consumidor divulgadas pelo Banco Central.

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