Continua após a publicidade

Vendendo o &

O artigo de hoje é sobre uma interessante passagem da história do mundinho encantado do mercado financeiro. Mas antes vamos falar um pouco sobre leis. Não faltam no mundo leis bizarras e sem sentido. Na França, por exemplo, é ilegal batizar um porco de “Napoleão” (!!!). Na Alemanha, um travesseiro pode ser considerado uma “arma branca” (!!!!) e no estado americano de Connecticut, é ilegal atravessar a rua plantando bananeira. […] Leia mais

Porcao
Porcao
V
Você e o Dinheiro

Publicado em 18 de abril de 2013 às, 11h59.

Última atualização em 24 de fevereiro de 2017 às, 09h04.

O artigo de hoje é sobre uma interessante passagem da história do mundinho encantado do mercado financeiro. Mas antes vamos falar um pouco sobre leis.

Não faltam no mundo leis bizarras e sem sentido. Na França, por exemplo, é ilegal batizar um porco de “Napoleão” (!!!). Na Alemanha, um travesseiro pode ser considerado uma “arma branca” (!!!!) e no estado americano de Connecticut, é ilegal atravessar a rua plantando bananeira.

Por mais bizarras que sejam as leis, elas sempre existem por alguma razão. No caso do “porco Napoleão”, é possível imaginar que o baixinho invocado que governava a França deveria ficar p*** da vida com a “homenagem”, por isso algum legislador resolveu criar essa lei para dissuadir pessoas de “zoarem” o imperador e acabarem perdendo a cabeça (na guilhotina). Já em Connecticut, se a “lei da bananeira” existe, é por que algum idiota já deve ter tido essa ideia “brilhante” e, provavelmente, causou um acidente. Muitas vezes uma lei é criada, mas acaba ficando fora de contexto por conta das evoluções tecnológicas e sociais, e os legisladores acabam “esquecendo” de atualizar a legislação que ficou meio sem sentido. Um caso típico é nossa legislação trabalhista, sempre tão criticada por não refletir as características do mercado de trabalho moderno.

Mas, enfim… Muitos investidores, quando começam a se aventurar no mercado financeiro, ficam surpresos com a quantidade de leis, regras e regulamentos que existem para, supostamente, colocar ordem no mercado e proteger o investidor. As empresas de capital aberto (aquelas que têm suas ações negociadas na bolsa de valores) têm uma lista enorme de requerimentos que precisam cumprir para desfrutar desse status. Aqui no Brasil, a CVM (Comissão de Valores Mobiliários) é responsável por disciplinar as empresas de capital aberto. Quem acompanha de perto sabe que a CVM é bastante rígida, apesar de não ser infalível. E fora do Brasil não é diferente: as autoridades que disciplinam os mercados de capitais mundo afora costumam ser bastante rigorosas e vigilantes; afinal, as empresas de capital aberto têm acesso à chamada “poupança popular” e presume-se que o povão nem sempre (ou raramente) está preparado para entender a fundo as peculiaridades do mercado e das empresas. Por isso, é preciso que alguém “proteja” essas pessoas (muitas vezes elas precisam ser protegidas delas mesmas…).

Para quem acha que o mercado financeiro é “regulado demais”, é bom que saiba que um dia já não foi assim. Quem já leu algum livro ou assistiu a algum documentário sobre o crash da bolsa de Nova Iorque em 1929 deve ter percebido que, naquela época, o mercado financeiro era uma “terra de ninguém”, um verdadeiro faroeste, onde empresas que só existiam no papel e na cabeça de seus criadores abriam o capital livremente, vendendo sonhos e ilusões (investidores da bolsa brasileira, eu SEI o que vocês estão pensando agora e podem parar já com isso, ok? Deixem o homem em paz…), investidores comuns se endividavam para comprar ações apostando no enriquecimento rápido e fácil (alguém se lembra daquela famosa história do pai do Kennedy?). Enfim, era o terreno ideal para todo tipo de fraude e pilantragem e não é à toa que deu no que deu.

Um pouco depois do crash, começou a ficar popular nos EUA um tipo de lei que se chamava de Blue Sky Laws (As “leis do céu azul”, em tradução livre). Essas leis, que são estaduais, são anteriores ao crash (o uso do termo “céu azul” foi registrado pela primeira vez no Kansas, em 1910), mas, por motivos óbvios, foi depois do crash que elas passaram a ser utilizadas com força máxima.

Essas leis têm como objetivo regular o mercado, criar regras para as empresas que captam dinheiro do povo e proteger o investidor. O nome “céu azul” vem exatamente daquilo que as leis querem evitar: Que “empresários” inescrupulosos vendam o “céu azul” para investidores incautos (“Vender o céu azul” é o equivalente americano àquilo que no Brasil chamamos de “vender terrenos na Lua”, “vender papel pintado”, entre outras coisas).

As “leis do céu azul” são estaduais nos EUA, e existem até hoje. Há inclusive um “modelo” federal criado em 1956 chamado “Uniform Securities Act”, desenvolvido para tentar padronizar as diversas leis estaduais. Mas toda essa confusão do crash de 1929 acabou levando as autoridades de lá a criarem uma lei federal, o Securities Act de 1933, que efetivamente passou a ditar as regras do jogo.

Essas leis tiveram grande influência na criação de legislação semelhante em vários países, inclusive o Brasil. É sempre interessante lembrar que todo aparato regulatório de nosso mercado de capitais, que pode parecer confuso e enrolado, tem uma boa razão de ser. As leis e as regras servem para evitar que empresários picaretas transitem livremente no mercado e que investidores inocentes se “machuquem”. Tudo bem que muitas vezes as coisas acabam não funcionando como deveriam (e como!), mas se a lei existe, é porque na ausência dela alguém já se deu mal e pagou caro por isso.