US$50 para ler um folheto (e não aprender nada&)
Acho que nunca aprendi tanto na vida quanto nestes últimos anos em que me envolvi com finanças pessoais. Quando resolvi entrar nesse mercado, devo confessar que eu tinha uma postura bastante presunçosa. Eu dizia para mim mesmo “com a experiência que eu tenho em finanças corporativas e mercados de capitais, mexer com finanças pessoais vai ser moleza”. Hoje, com alguns anos de experiência nesse segmento, eu posso ver com clareza […] Leia mais
Publicado em 7 de novembro de 2011 às, 20h36.
Última atualização em 24 de fevereiro de 2017 às, 09h44.
Acho que nunca aprendi tanto na vida quanto nestes últimos anos em que me envolvi com finanças pessoais. Quando resolvi entrar nesse mercado, devo confessar que eu tinha uma postura bastante presunçosa. Eu dizia para mim mesmo “com a experiência que eu tenho em finanças corporativas e mercados de capitais, mexer com finanças pessoais vai ser moleza”.
Hoje, com alguns anos de experiência nesse segmento, eu posso ver com clareza o quanto eu estava errado. Minha curva de aprendizado foi íngreme e tortuosa, para dizer o mínimo. Isso que chamamos genericamente de “finanças pessoais” é um conjunto de fatores do qual o elemento “finanças”, justamente aquele que eu tanto me gabava de dominar, talvez seja o menos importante. Componentes psíquicos, emocionais e comportamentais têm um papel decisivo nessa equação. Não há receita de bolo, não há solução de tamanho único, cada pessoa percebe o dinheiro de forma diferente e age de forma diferente. Raramente, aquilo que é melhor de um ponto de vista racional e matemático é o melhor “para nós”.
Acreditem, entender sobre finanças é fácil. Qualquer pessoa com uma dose de boa vontade e conhecimentos rudimentares de matemática e economia consegue ir bem longe. Difícil mesmo (e esse é o maior desafio do educador financeiro ou do especialista em finanças pessoais) é conseguir persuadir as pessoas a se interessarem mais pela gestão de suas próprias finanças e a tomarem decisões mais racionais com seu próprio dinheiro. Muita gente tem verdadeira repulsa pelo assunto “finanças” e prefere ter uma dor de barriga a ter que fazer uma análise do próprio extrato bancário.
Em um de meus posts anteriores (“A vingança dos tiozinhos”, que você pode ler clicando aqui), apresentei uma pesquisa feita nos EUA em 2010, que procura relacionar os efeitos do envelhecimento com as decisões financeiras. No final do texto, quando os autores propõem algumas ideias para resolver o problema que a pesquisa identificou, uma informação chama muito a atenção. Os autores falam que aumentar a quantidade de informações disponíveis sobre produtos financeiros poderia ajudar as pessoas a tomarem melhores decisões, mas eles mesmos mostram seu ceticismo quanto a esse tipo de medida quando mencionam outra pesquisa (que não consegui achar, mas gostaria muito de ler na íntegra), que traz uma informação no mínimo perturbadora.
Nos EUA, é muito popular um tipo de previdência privada conhecido como 401k, onde o empregado faz depósitos regulares em uma conta (própria) e, conforme certas condições, o empregador também deposita na mesma conta um percentual daquilo que o empregado depositou (eles chamam isso de match). Conforme a empresa e o tempo de casa do funcionário, esse percentual pode variar. Apenas para dar um exemplo, a Starbucks deposita, para seus funcionários com mais de dez anos de casa, 150% daquilo que eles mesmos depositam (limitado até 4% do salário, senão seria muita moleza). Estamos falando de dinheiro DE GRAÇA para o funcionário. Quanto mais ele depositar (numa conta que já é dele mesmo), mais ele ganha do seu empregador.
Voltando à pesquisa, a um grupo de funcionários que fazia depósitos mínimos em suas contas foi feita a seguinte oferta: eles ganhariam, cada um, US$ 50 para ler um folheto simples com as regras do 401k e uma explicação (igualmente simples) do quanto eles ganhariam tirando proveito daquilo que o empregador estaria disposto a depositar para fazer o match.
O objetivo da pesquisa era ver até que ponto a informação financeira faria alguma diferença nas decisões daquelas pessoas (ainda que elas fossem pagas para ter a informação – quando supõe-se que as pessoas deveriam é PAGAR por ela…), na presunção de que elas não depositavam valores maiores por não conhecerem as regras e as vantagens que poderiam ter. Resultado do experimento? Bem… basicamente, a conclusão do estudo é que as pessoas não se sensibilizaram pela explicação e continuaram fazendo contribuições mínimas para suas contas, deixando o dinheiro dado “de mão beijada” por seus empregadores em cima da mesa…
Esse tipo de pesquisa mostra as limitações da educação financeira. De nada adiantam informações precisas, bons argumentos lógicos e uma técnica refinada, se as pessoas não forem adequadamente motivadas a fazerem algo pelas suas próprias vidas financeiras. O verdadeiro papel do educador financeiro não é simplesmente ensinar às pessoas a lidarem com suas finanças, mas fazer com que elas queiram lidar. E isso não é uma habilidade financeira, é uma habilidade humana.