SPIVA – O terror dos gestores de investimentos
SPIVA (Standard & Poors Indices Versus Active) é um estudo que mostra que os investidores ativos têm grandes dificuldades em superar seus benchmarks
Da Redação
Publicado em 12 de novembro de 2012 às 14h20.
Última atualização em 6 de maio de 2019 às 19h36.
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A palavra “alfa”, que representa a primeira letra do alfabeto grego, tem um significado mágico em finanças. Alfa é uma métrica para avaliação de investimentos, que pega a volatilidade ajustada pelo risco de um ativo financeiro ou portfólio e o compara com algum índice de referência ( benchmark ) relacionado.
Falando de uma forma superficial e bastante simplificada, vamos imaginar que faremos uma carteira de ações aqui no Brasil. Com qual índice compararemos o desempenho dessa carteira para saber se estamos indo bem ou não? A maioria das pessoas provavelmente responderia “o Ibovespa”, o que faz todo sentido, uma vez que é o índice mais representativo de nosso mercado. O Ibovespa será então o nosso benchmark ou “beta”. Nosso objetivo será superar o desempenho do índice Ibovespa. Essa diferença entre o desempenho da nossa carteira e o do índice de referência é, grosseiramente falando, o que se chama de “alfa”, que pode ser positivo (se superarmos o índice) ou negativo (se ficarmos abaixo dele).
Ao longo de algum período (digamos, cinco anos), vamos comparar o desempenho da nossa carteira com o índice. Ficamos cinco anos analisando ações, comprando, vendendo, fazendo operações complexas em busca do tal “alfa”. Se no final do período constatarmos que nosso desempenho ficou abaixo do Ibovespa, a conclusão a que chegamos é de que era melhor simplesmente ter feito uma carteira de ações que reproduzisse a composição do índice e ter ido fazer algo mais interessante do que ficar analisando ações e operando na bolsa… Ou seja, era melhor ter adotado uma postura PASSIVA.
A maioria dos gestores de investimento (e mesmo investidores individuais) está “procurando alfa”. Todos querem superar os índices para demonstrar que são bons investidores e que conseguem, com seu trabalho e sua perspicácia, obter retornos melhores do que simplesmente deixando as ações ou títulos ali quietinhos no canto deles. A indústria dos fundos de investimentos se baseia na premissa de que é possível superar os índices e de que vale a pena, para o investidor comum, pagar “algo a mais” (as famosas “taxas de administração” e “taxas de performance”) para ter um desempenho melhor do que se ele investisse sozinho e de forma passiva.
O problema é que, guardadas as devidas proporções, o alfa é o “ponto G do mercado financeiro”: muita gente acredita que ele existe, alguns juram que já viram e sabem onde encontrá-lo, mas poucos (ou ninguém) conseguem demonstrar isso. A briga entre as estratégias ativas de investimento e uma postura passiva é antiga, e quase todos os estudos acadêmicos dão vantagem para a postura passiva.
Existem inúmeros estudos comparando as duas estratégias. Esses estudos já foram feitos em vários países, em vários períodos diferentes e utilizando diversos índices de referência. Como regra geral, no longo prazo (usualmente acima de cinco anos) e conforme o estudo, o percentual de fundos de investimentos ativos que “perdem” de seus índices de referência costuma ficar entre 60 a 90%.
Muitos gestores de investimentos, como é de se esperar, ficam p**** da vida quando se menciona esse tipo de estudo. Respondem que “isso é papo de acadêmico”, que “esses estudos não dizem nada” e coisas do gênero. A revolta é perfeitamente compreensível, afinal, se a maioria das pessoas começar a dar mais atenção para esses estudos, boa parte das pessoas que trabalham no mercado financeiro acabará ficando sem seu “ganha pão”.
Mas a briga entre investimentos ativos versus passivos segue feroz. Nos EUA, onde o mercado de ações está há quase uma década “de lado” e o mercado de renda fixa traz retornos ridículos (quando não negativos se ajustados pela inflação), esse tipo de comparação tem ganhado cada vez mais interesse dos investidores, afinal os “betas” são péssimos (os mercados lá não vão a lugar algum) e não falta gente fazendo promessas de que consegue superá-los.
Para colocar ainda mais lenha na fogueira, a Standard & Poors (sim, aquela mesmo) criou há dez anos o SPIVA, que significa “ S&P Indices Versus Active ” (acho que isso dispensa tradução…), um estudo divulgado semestralmente que demonstra o desempenho dos fundos de investimentos, de várias categorias, comparados com seus respectivos índices de referência.
É um estudo muito compreensivo e bastante detalhado, que mostra vários tipos de fundo (tanto de ações quanto renda fixa), em diferentes períodos de tempo.
A última edição, que apresenta o comportamento dos fundos americanos até a metade de 2012, pode ser baixada clicando aqui. Alguns pontos de destaque são:
– Com uma única exceção (que será comentada a seguir), o percentual de fundos de investimentos que perdeu de seus índices de referência nos cinco anos anteriores ao estudo, conforme a categoria, ficou entre 64,58% e 89,94%.
– Apenas os fundos que têm como referência o índice S&P 500 Value (que é uma “versão alternativa” do S&P 500 tradicional) tiveram uma razoável performance em cinco anos, com 39,25% deles abaixo do benchmark. Porém, nos últimos três anos 76,57% desses mesmos fundos “apanharam” do índice – é um ponto a ser estudado…
– No caso dos fundos de renda fixa, o percentual de “perdedores” em cinco anos foi de 51,9 a 97,56%, conforme o índice de referência.
O estudo ainda mostra outras coisas muito interessantes, como a quantidade de fundos que muda o estilo de gestão, se funde com outros ou simplesmente é liquidada no período, mas vamos deixar isso de fora do artigo, senão é “muita informação”…
Vou terminar este artigo com três observações finais e uma pergunta.
1 – O presente artigo não deve ser interpretado como uma defesa pessoal do investimento passivo, apesar de que, eu confesso, cada vez mais tenho me rendido às evidências. Mas eu ainda mantenho minha simpatia por algumas metodologias ativas de investimento como o trend following e o value investing.
2 – Eu não sei ao certo qual a motivação da S&P em patrocinar esse tipo de estudo. Não sei o que eles ganham com isso, se é que ganham alguma coisa. Mas eu acho engraçado imaginar que os bancos, fundos de investimento e outros players do mercado não ficam nada felizes com isso e possivelmente estariam dispostos a pagar à S&P para NÃO divulgar esse tipo de informação…
3 – A S&P tem versões do SPIVA para os mercados da Índia e da Austrália, e já adianto: os resultados também não são muito animadores…
E agora é a hora da “perguntinha sacana”:
Sabendo que existe o SPIVA para outros países, você gostaria de ver um “SPIVA brasileiro”? Se você respondeu “sim”, então acesse o formulário de contato da Standard & Poors clicando aqui e diga para eles o quanto você gostaria de ter esse tipo de informação disponível também para o mercado brasileiro.
Atualização:
Já temos um SPIVA latinoamericano, que mostra o desempenho, inclusive, dos investidores brasileiros. Clique aqui para ver.
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Quando investidores preguiçosos chegam mais longe…
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Falando de uma forma superficial e bastante simplificada, vamos imaginar que faremos uma carteira de ações aqui no Brasil. Com qual índice compararemos o desempenho dessa carteira para saber se estamos indo bem ou não? A maioria das pessoas provavelmente responderia “o Ibovespa”, o que faz todo sentido, uma vez que é o índice mais representativo de nosso mercado. O Ibovespa será então o nosso benchmark ou “beta”. Nosso objetivo será superar o desempenho do índice Ibovespa. Essa diferença entre o desempenho da nossa carteira e o do índice de referência é, grosseiramente falando, o que se chama de “alfa”, que pode ser positivo (se superarmos o índice) ou negativo (se ficarmos abaixo dele).
Ao longo de algum período (digamos, cinco anos), vamos comparar o desempenho da nossa carteira com o índice. Ficamos cinco anos analisando ações, comprando, vendendo, fazendo operações complexas em busca do tal “alfa”. Se no final do período constatarmos que nosso desempenho ficou abaixo do Ibovespa, a conclusão a que chegamos é de que era melhor simplesmente ter feito uma carteira de ações que reproduzisse a composição do índice e ter ido fazer algo mais interessante do que ficar analisando ações e operando na bolsa… Ou seja, era melhor ter adotado uma postura PASSIVA.
A maioria dos gestores de investimento (e mesmo investidores individuais) está “procurando alfa”. Todos querem superar os índices para demonstrar que são bons investidores e que conseguem, com seu trabalho e sua perspicácia, obter retornos melhores do que simplesmente deixando as ações ou títulos ali quietinhos no canto deles. A indústria dos fundos de investimentos se baseia na premissa de que é possível superar os índices e de que vale a pena, para o investidor comum, pagar “algo a mais” (as famosas “taxas de administração” e “taxas de performance”) para ter um desempenho melhor do que se ele investisse sozinho e de forma passiva.
O problema é que, guardadas as devidas proporções, o alfa é o “ponto G do mercado financeiro”: muita gente acredita que ele existe, alguns juram que já viram e sabem onde encontrá-lo, mas poucos (ou ninguém) conseguem demonstrar isso. A briga entre as estratégias ativas de investimento e uma postura passiva é antiga, e quase todos os estudos acadêmicos dão vantagem para a postura passiva.
Existem inúmeros estudos comparando as duas estratégias. Esses estudos já foram feitos em vários países, em vários períodos diferentes e utilizando diversos índices de referência. Como regra geral, no longo prazo (usualmente acima de cinco anos) e conforme o estudo, o percentual de fundos de investimentos ativos que “perdem” de seus índices de referência costuma ficar entre 60 a 90%.
Muitos gestores de investimentos, como é de se esperar, ficam p**** da vida quando se menciona esse tipo de estudo. Respondem que “isso é papo de acadêmico”, que “esses estudos não dizem nada” e coisas do gênero. A revolta é perfeitamente compreensível, afinal, se a maioria das pessoas começar a dar mais atenção para esses estudos, boa parte das pessoas que trabalham no mercado financeiro acabará ficando sem seu “ganha pão”.
Mas a briga entre investimentos ativos versus passivos segue feroz. Nos EUA, onde o mercado de ações está há quase uma década “de lado” e o mercado de renda fixa traz retornos ridículos (quando não negativos se ajustados pela inflação), esse tipo de comparação tem ganhado cada vez mais interesse dos investidores, afinal os “betas” são péssimos (os mercados lá não vão a lugar algum) e não falta gente fazendo promessas de que consegue superá-los.
Para colocar ainda mais lenha na fogueira, a Standard & Poors (sim, aquela mesmo) criou há dez anos o SPIVA, que significa “ S&P Indices Versus Active ” (acho que isso dispensa tradução…), um estudo divulgado semestralmente que demonstra o desempenho dos fundos de investimentos, de várias categorias, comparados com seus respectivos índices de referência.
É um estudo muito compreensivo e bastante detalhado, que mostra vários tipos de fundo (tanto de ações quanto renda fixa), em diferentes períodos de tempo.
A última edição, que apresenta o comportamento dos fundos americanos até a metade de 2012, pode ser baixada clicando aqui. Alguns pontos de destaque são:
– Com uma única exceção (que será comentada a seguir), o percentual de fundos de investimentos que perdeu de seus índices de referência nos cinco anos anteriores ao estudo, conforme a categoria, ficou entre 64,58% e 89,94%.
– Apenas os fundos que têm como referência o índice S&P 500 Value (que é uma “versão alternativa” do S&P 500 tradicional) tiveram uma razoável performance em cinco anos, com 39,25% deles abaixo do benchmark. Porém, nos últimos três anos 76,57% desses mesmos fundos “apanharam” do índice – é um ponto a ser estudado…
– No caso dos fundos de renda fixa, o percentual de “perdedores” em cinco anos foi de 51,9 a 97,56%, conforme o índice de referência.
O estudo ainda mostra outras coisas muito interessantes, como a quantidade de fundos que muda o estilo de gestão, se funde com outros ou simplesmente é liquidada no período, mas vamos deixar isso de fora do artigo, senão é “muita informação”…
Vou terminar este artigo com três observações finais e uma pergunta.
1 – O presente artigo não deve ser interpretado como uma defesa pessoal do investimento passivo, apesar de que, eu confesso, cada vez mais tenho me rendido às evidências. Mas eu ainda mantenho minha simpatia por algumas metodologias ativas de investimento como o trend following e o value investing.
2 – Eu não sei ao certo qual a motivação da S&P em patrocinar esse tipo de estudo. Não sei o que eles ganham com isso, se é que ganham alguma coisa. Mas eu acho engraçado imaginar que os bancos, fundos de investimento e outros players do mercado não ficam nada felizes com isso e possivelmente estariam dispostos a pagar à S&P para NÃO divulgar esse tipo de informação…
3 – A S&P tem versões do SPIVA para os mercados da Índia e da Austrália, e já adianto: os resultados também não são muito animadores…
E agora é a hora da “perguntinha sacana”:
Sabendo que existe o SPIVA para outros países, você gostaria de ver um “SPIVA brasileiro”? Se você respondeu “sim”, então acesse o formulário de contato da Standard & Poors clicando aqui e diga para eles o quanto você gostaria de ter esse tipo de informação disponível também para o mercado brasileiro.
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