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Otimismo para o Ano Novo

Neste novo ano, poderemos lançar as bases para uma nova era de desenvolvimento sustentável, paz e cooperação. 

O desenvolvimento da vacina exemplificou a “abordagem da missão” de direcionar a pesquisa e o desenvolvimento em um esforço público-privado (Frank Augstein/Reuters)
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isabelarovaroto

Publicado em 5 de janeiro de 2021 às 09h17.

2020 foi um ano angustiante, com a pandemia do COVID-19, reversões econômicas mundiais, generalizados desastres climáticos, inquietação social generalizada e até mesmo as falsas alegações do presidente dos EUA, Donald Trump, sobre fraude eleitoral em massa e apelos de lei marcial entre seus defensores. No entanto, apesar das sombrias notícias, o ano também trouxe alguns fortes motivos para otimismo. Neste novo ano, poderemos lançar as bases para uma nova era de desenvolvimento sustentável, paz e cooperação.

O primeiro motivo para otimismo foi o sucesso de muitos países em suprimir o COVID-19. Países da região da Ásia-Pacífico, tão culturalmente e politicamente diversificados como Austrália, China, Coréia do Sul, Laos, Nova Zelândia e Vietnã, implementaram estratégias eficazes de saúde pública para conter a pandemia. O mesmo aconteceu com alguns países em outras regiões, inclusive na África Subsaariana. Embora as manchetes fossem dominadas pelas desastrosas falhas da resposta à pandemia nos Estados Unidos e na Europa, os sucessos na região da Ásia-Pacífico e em outros lugares nos mostram como a combinação de boa governança, cidadania responsável e políticas baseadas em evidências podem resolver grandes e urgentes desafios.

O segundo motivo de otimismo é a chegada de novas vacinas, que não são apenas uma fonte de grande esperança para salvar vidas e deter o vírus, como também um sinal do poder da ciência moderna em entregar avanços tecnológicos em tempo recorde. O desenvolvimento da vacina exemplificou a “abordagem da missão” de direcionar a pesquisa e o desenvolvimento em um esforço público-privado. A mesma abordagem de missão deve ser implantada para enfrentar outros desafios globais, como o desenvolvimento da energia renovável, agricultura sustentável e a conservação da biodiversidade.

O terceiro motivo para otimismo é que Trump foi derrotado de forma decisiva nas eleições de novembro. Da mesma forma que muitos demagogos do passado e do presente, Trump foi capaz de gerar um enorme público de seguidores com o apoio da propaganda de massa, especialmente a Fox News de Rupert Murdoch. Não obstante, muito desse público conseguiu enxergar as mentiras e difamações para permitir que os Estados Unidos recomeçassem após o desastroso reinado de inépcia, ódio e mentiras de Trump.

A ignorância e as mentiras de Trump contribuíram para mais de 330.000 mortes nos Estados Unidos pelo COVID-19 em 2020, cerca de 25% das mortes causadas pelo vírus no mundo, embora os EUA representem apenas 4% da população mundial. O desastroso protocolo de Trump com o COVID-19 acabou levando à sua derrota nas eleições, e assim mesmo Trump tentou manter o poder fazendo desesperadas e delirantes afirmações sobre fraude eleitoral generalizada. Felizmente, as instituições públicas americanas – prefeitos, governadores, legisladores estaduais, tribunais e militares – resistiram aos impulsos autoritários de Trump, de modo que o presidente eleito Joe Biden, um homem decente, honrado e racional, em breve será empossado.

A quarta razão para otimismo é o vibrante desempenho das Nações Unidas, apesar dos fortes ventos contrários em 2020. A ONU foi inaugurada há 75 anos pelo maior presidente dos EUA, Franklin Delano Roosevelt, como um baluarte contra guerras futuras, que defende os três pilares do multilateralismo: paz, direitos humanos e desenvolvimento sustentável. Em 2020, seu desempenho foi admirável nas três frentes, apesar das provocações da administração Trump.

As agências da ONU hoje são lideradas por homens e mulheres de grande habilidade e integridade, e o Secretário-Geral António Guterres guiou a organização com enorme habilidade e visão durante o ano mais difícil desde sua fundação. Em 2021, a ONU sediará vários encontros globais cruciais – sobre oceanos, biodiversidade, sistemas alimentares e clima – que unidos podem lançar as bases para décadas de cooperação global no desenvolvimento sustentável.

O quinto motivo para otimismo é a revolução digital, o principal protagonista implícito da resposta à pandemia global. As atividades online mantiveram o mundo funcionando. Em poucas semanas, empresas, escolas, finanças, governo, comércio, pagamentos, provedores de saúde e o sistema das Nações Unidas foram ao ar a uma velocidade, escopo e profundidade inimagináveis ​​até aquele momento. As tecnologias digitais desempenharam um papel direto no combate à epidemia, fornecendo informações, monitorando os padrões de transmissão de doenças e fornecendo vários serviços do sistema de saúde.

Obviamente, o novo mundo digital não tem sido um mar de rosas. Infelizmente, metade do mundo ainda não tem acesso à Internet. Consequentemente, a rápida mudança do trabalho, da educação, da vida social, do comércio e do entretenimento para plataformas online alimentou dramáticas desigualdades entre quem dispõe e quem não dispõe de Internet. Além disso, as tecnologias digitais deram origem a outros novos e sérios problemas sociais, incluindo hackers em grande escala, notícias falsas, guerra cibernética e vigilância injustificada por parte de governos e empresas privadas.

As duas faces da era digital, positiva e negativa, exemplificam a situação que enfrentamos em muitas frentes. Podemos ser otimistas sabendo que as tecnologias de ponta e o conhecimento científico do mundo nos capacitam para resolver os urgentes problemas globais. Mesmo assim, precisamos estar vigilantes para impedir que as forças da ganância, da ignorância e do ódio sequestrem as novas tecnologias para suas segundas intenções.

Os antigos filósofos gregos acreditavam que política e ética deveriam andar de mãos dadas. Aristóteles escreveu duas de suas obras-primas, a Ética a Nicômaco e A Política, como estudos complementares, a primeira como um guia para a felicidade humana e a última como um guia de como a política pode promover a felicidade nas cidade-estado gregas.

Em nosso tempo, o Papa Francisco apresentou duas grandes encíclicas, Laudato si ' em 2015 e Fratelli tutti em 2020, para mostrar como a ética pode ajudar a guiar o mundo para a sustentabilidade ambiental e a paz global. A nova encíclica oferece uma descrição profunda de como podemos ir além de nossas próprias famílias, comunidades e países para construir o diálogo e a confiança em todo o mundo.

Portanto, vamos entrar em 2021 com um otimismo real,  porém cauteloso. Vamos tomar decisões para ampliar os sucessos de saúde pública da região da Ásia-Pacífico e as novas vacinas desenvolvidas nos Estados Unidos, Europa, Rússia e China para beneficiar o mundo inteiro. Decidamos deixar de lado o ódio que minou a cooperação global e unir forças para superar a desigualdade, a pobreza, a exclusão e a destruição ambiental que ameaça o mundo. Vamos redobrar nosso apoio à ONU para construir um futuro baseado na paz, nos direitos humanos e no desenvolvimento sustentável. E para aqueles de nós, nos Estados Unidos, vamos começar a curar uma nação ferida e dividida.

 

 

Jeffrey D. Sachs, Professor de Desenvolvimento Sustentável e Professor de Política e Gestão de Saúde na Universidade de Columbia, é diretor do Centro de Desenvolvimento Sustentável da Universidade de Columbia e da Rede de Soluções de Desenvolvimento Sustentável da ONU.

Direitos Autorais: Project Syndicate, 2021.www.project-syndicate.org

 

 

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2020 foi um ano angustiante, com a pandemia do COVID-19, reversões econômicas mundiais, generalizados desastres climáticos, inquietação social generalizada e até mesmo as falsas alegações do presidente dos EUA, Donald Trump, sobre fraude eleitoral em massa e apelos de lei marcial entre seus defensores. No entanto, apesar das sombrias notícias, o ano também trouxe alguns fortes motivos para otimismo. Neste novo ano, poderemos lançar as bases para uma nova era de desenvolvimento sustentável, paz e cooperação.

O primeiro motivo para otimismo foi o sucesso de muitos países em suprimir o COVID-19. Países da região da Ásia-Pacífico, tão culturalmente e politicamente diversificados como Austrália, China, Coréia do Sul, Laos, Nova Zelândia e Vietnã, implementaram estratégias eficazes de saúde pública para conter a pandemia. O mesmo aconteceu com alguns países em outras regiões, inclusive na África Subsaariana. Embora as manchetes fossem dominadas pelas desastrosas falhas da resposta à pandemia nos Estados Unidos e na Europa, os sucessos na região da Ásia-Pacífico e em outros lugares nos mostram como a combinação de boa governança, cidadania responsável e políticas baseadas em evidências podem resolver grandes e urgentes desafios.

O segundo motivo de otimismo é a chegada de novas vacinas, que não são apenas uma fonte de grande esperança para salvar vidas e deter o vírus, como também um sinal do poder da ciência moderna em entregar avanços tecnológicos em tempo recorde. O desenvolvimento da vacina exemplificou a “abordagem da missão” de direcionar a pesquisa e o desenvolvimento em um esforço público-privado. A mesma abordagem de missão deve ser implantada para enfrentar outros desafios globais, como o desenvolvimento da energia renovável, agricultura sustentável e a conservação da biodiversidade.

O terceiro motivo para otimismo é que Trump foi derrotado de forma decisiva nas eleições de novembro. Da mesma forma que muitos demagogos do passado e do presente, Trump foi capaz de gerar um enorme público de seguidores com o apoio da propaganda de massa, especialmente a Fox News de Rupert Murdoch. Não obstante, muito desse público conseguiu enxergar as mentiras e difamações para permitir que os Estados Unidos recomeçassem após o desastroso reinado de inépcia, ódio e mentiras de Trump.

A ignorância e as mentiras de Trump contribuíram para mais de 330.000 mortes nos Estados Unidos pelo COVID-19 em 2020, cerca de 25% das mortes causadas pelo vírus no mundo, embora os EUA representem apenas 4% da população mundial. O desastroso protocolo de Trump com o COVID-19 acabou levando à sua derrota nas eleições, e assim mesmo Trump tentou manter o poder fazendo desesperadas e delirantes afirmações sobre fraude eleitoral generalizada. Felizmente, as instituições públicas americanas – prefeitos, governadores, legisladores estaduais, tribunais e militares – resistiram aos impulsos autoritários de Trump, de modo que o presidente eleito Joe Biden, um homem decente, honrado e racional, em breve será empossado.

A quarta razão para otimismo é o vibrante desempenho das Nações Unidas, apesar dos fortes ventos contrários em 2020. A ONU foi inaugurada há 75 anos pelo maior presidente dos EUA, Franklin Delano Roosevelt, como um baluarte contra guerras futuras, que defende os três pilares do multilateralismo: paz, direitos humanos e desenvolvimento sustentável. Em 2020, seu desempenho foi admirável nas três frentes, apesar das provocações da administração Trump.

As agências da ONU hoje são lideradas por homens e mulheres de grande habilidade e integridade, e o Secretário-Geral António Guterres guiou a organização com enorme habilidade e visão durante o ano mais difícil desde sua fundação. Em 2021, a ONU sediará vários encontros globais cruciais – sobre oceanos, biodiversidade, sistemas alimentares e clima – que unidos podem lançar as bases para décadas de cooperação global no desenvolvimento sustentável.

O quinto motivo para otimismo é a revolução digital, o principal protagonista implícito da resposta à pandemia global. As atividades online mantiveram o mundo funcionando. Em poucas semanas, empresas, escolas, finanças, governo, comércio, pagamentos, provedores de saúde e o sistema das Nações Unidas foram ao ar a uma velocidade, escopo e profundidade inimagináveis ​​até aquele momento. As tecnologias digitais desempenharam um papel direto no combate à epidemia, fornecendo informações, monitorando os padrões de transmissão de doenças e fornecendo vários serviços do sistema de saúde.

Obviamente, o novo mundo digital não tem sido um mar de rosas. Infelizmente, metade do mundo ainda não tem acesso à Internet. Consequentemente, a rápida mudança do trabalho, da educação, da vida social, do comércio e do entretenimento para plataformas online alimentou dramáticas desigualdades entre quem dispõe e quem não dispõe de Internet. Além disso, as tecnologias digitais deram origem a outros novos e sérios problemas sociais, incluindo hackers em grande escala, notícias falsas, guerra cibernética e vigilância injustificada por parte de governos e empresas privadas.

As duas faces da era digital, positiva e negativa, exemplificam a situação que enfrentamos em muitas frentes. Podemos ser otimistas sabendo que as tecnologias de ponta e o conhecimento científico do mundo nos capacitam para resolver os urgentes problemas globais. Mesmo assim, precisamos estar vigilantes para impedir que as forças da ganância, da ignorância e do ódio sequestrem as novas tecnologias para suas segundas intenções.

Os antigos filósofos gregos acreditavam que política e ética deveriam andar de mãos dadas. Aristóteles escreveu duas de suas obras-primas, a Ética a Nicômaco e A Política, como estudos complementares, a primeira como um guia para a felicidade humana e a última como um guia de como a política pode promover a felicidade nas cidade-estado gregas.

Em nosso tempo, o Papa Francisco apresentou duas grandes encíclicas, Laudato si ' em 2015 e Fratelli tutti em 2020, para mostrar como a ética pode ajudar a guiar o mundo para a sustentabilidade ambiental e a paz global. A nova encíclica oferece uma descrição profunda de como podemos ir além de nossas próprias famílias, comunidades e países para construir o diálogo e a confiança em todo o mundo.

Portanto, vamos entrar em 2021 com um otimismo real,  porém cauteloso. Vamos tomar decisões para ampliar os sucessos de saúde pública da região da Ásia-Pacífico e as novas vacinas desenvolvidas nos Estados Unidos, Europa, Rússia e China para beneficiar o mundo inteiro. Decidamos deixar de lado o ódio que minou a cooperação global e unir forças para superar a desigualdade, a pobreza, a exclusão e a destruição ambiental que ameaça o mundo. Vamos redobrar nosso apoio à ONU para construir um futuro baseado na paz, nos direitos humanos e no desenvolvimento sustentável. E para aqueles de nós, nos Estados Unidos, vamos começar a curar uma nação ferida e dividida.

 

 

Jeffrey D. Sachs, Professor de Desenvolvimento Sustentável e Professor de Política e Gestão de Saúde na Universidade de Columbia, é diretor do Centro de Desenvolvimento Sustentável da Universidade de Columbia e da Rede de Soluções de Desenvolvimento Sustentável da ONU.

Direitos Autorais: Project Syndicate, 2021.www.project-syndicate.org

 

 

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