A cadeira do chefe: como gerenciar os desafios de uma empresa familiar
Governança, liderança e gestão são três atividades fundamentais para aumentar as chances de uma empresa familiar sobreviver por várias gerações
Publicado em 16 de janeiro de 2023 às, 17h29.
Última atualização em 17 de janeiro de 2023 às, 13h19.
Em minhas trocas com tantos e tantos empreendedores de todo o país, tem chamado minha atenção o quanto as empresas familiares conseguem ser tão únicas e diversas entre si, ao mesmo tempo que compartilham características que impõem muitos desafios comuns para sua evolução e desenvolvimento.
Por definição, empresas familiares são aquelas em que um grupo familiar possui uma participação significativa de determinada organização, com poder para tomar decisões importantes ou influenciá-las, bem como experienciar a transição entre as suas gerações.
Essa estrutura pode ser encontrada em todos os setores do mercado, desde empresas de pequeno e médio porte até algumas das maiores corporações do mundo, como Walmart (maior rede de varejo do mundo, com receita global de US$ 573 bilhões, conforme Statista), Samsung (líder global em eletrônicos de consumo, semicondutores, telecomunicações e tecnologias de mídia digital, de acordo com a Statista, 2022) e Porsche (53% de participação majoritária no Grupo Volkswagen, segundo divulgado pela Forbes em 2021).
Além disso, levantamento feito pela EY e pela Universidade de St. Gallen da Suíça, em 2021, apurou que as empresas familiares são vitais para a saúde da economia global, gerando coletivamente US$ 7,28 trilhões em receita e empregando 24,1 milhões de pessoas.
Em nosso país, aparecem 10 companhias nesse ranking, com destaque para a JBS, seguida de Marfrig, Gerdau, Votorantim, CSN, Magazine Luiza, Cosan, Energisa, WEG e Porto Seguro.
Assim, os impactos na economia e no ecossistema em que atuam são expressivos. Segundo o Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística em parceria com o SEBRAE (2017), 9 em cada 10 empresas no Brasil têm perfil familiar e, juntas, elas representam 65% do PIB e empregam 75% dos trabalhadores no país.
No entanto, de acordo com a PwC, em apenas 24% dessas companhias no Brasil a sucessão acontece de maneira bem-sucedida, razão pela qual os riscos e as decisões que tomam nos negócios repercutem não apenas no seu business e no seu patrimônio, mas na fonte de receita tributária e no sustento de muitas outras famílias. A nível global, este percentual sobe para 30% – o que ainda é pouco.
Por isso, a gestão e operação desses núcleos determinam o seu desempenho e sobrevivência, já que, além dos mesmos problemas e desafios que outros negócios enfrentam, eles também precisam lidar com os contratempos provocados pelos laços familiares e os vínculos emocionais.
Sem guidelines que governem bem as suas escolhas, questões de sucessão e outros tópicos pertinentes podem não produzir os resultados esperados no curto, médio e longo prazos. Assim como implementado por Luíza Trajano, founder do Magazine Luíza e atualmente presidente do seu Conselho de Administração:
Portanto, é crucial entender como fortalecer seus valores fundamentais e orientar as gerações futuras à medida que assumem os seus respectivos papéis de liderança para que a perenidade dessas companhias não dependa, única e exclusivamente, da figura do proprietário ou C-Level mais longevo.
6 lições para prevenir conflitos entre as gerações
Em nossas turmas de Imersão e Mentoria do G4 Educação, um número significativo de alunos procura por conselhos, frameworks e ferramentas para superar os desafios desse tipo de negócio.
Para manter sua competitividade, empresas familiares devem estabelecer um modelo operacional que oriente os processos necessários para gerenciar a complexidade das suas relações e o conhecimento adquirido ao longo de gerações.
É importante trazer à tona os questionamentos mais comuns na organização para que o status quo seja desafiado de maneira construtiva e para que questões sensíveis não sejam tratadas como desconfortáveis, confusas e emocionalmente desgastantes.
1 - Defina um processo claro de sucessão
Conforme mencionado pelo estudo do BCG (Boston Consulting Group, 2016), empresas familiares em mercados emergentes também são mais propensas a ter membros da família em funções gerenciais. Por isso, incentive discussões abertas e honestas sobre o assunto.
Muitas vezes, o parente na “cadeira” do chefe é profundamente resistente à noção de ser substituído e abdica do seu papel de estabelecer procedimentos sucessórios claros dentro dos Conselhos de Administração.
2 - Desenvolva talentos para a próxima geração
Promova, desde cedo, o interesse da próxima geração no negócio e em sua preparação para assumir funções de liderança e/ou gestão. Nesse sentido, é interessante fornecer espaço para os mais novos aprenderem e se envolverem enquanto fazem suas próprias escolhas.
Em muitos casos e por falta de orientação, os envolvidos podem ver o negócio muito mais como uma fonte de riqueza do que um legado a ser desenvolvido.
3 - Estabeleça regras antes que elas sejam necessárias
Coloque por escrito qual é a natureza do seu negócio, quem recebe o quê, quem é responsável pelo quê, implicações financeiras, critérios para membros externos entrarem no negócio, quando alguém deve se aposentar, etc.
Simplifique, mas documente. Um nível mais alto de atenção à estruturação das regras na empresa familiar leva a uma compreensão mais profunda do papel de cada um, do que esperar, de como o desempenho será avaliado e para onde exatamente a empresa está indo.
4 - Defina um plano de remuneração
Como em qualquer negócio, a remuneração faz parte do jogo. É uma área que pode facilitar e incentivar a transição geracional ou servir como barreira para o crescimento contínuo dos negócios.
Assim, é importante pagar um valor justo de mercado para cada função — independente do parentesco — e garantir que os membros da família sejam remunerados pelas mesmas regras que todos os outros, quebrando o paradigma de que quem possui “laços de sangue” deva ter compensações maiores que os demais ou iguais entre si para conflitos internos serem evitados.
5 - Profissionalize a diretoria
Se uma empresa familiar está pensando em se profissionalizar, é vital que os seus líderes concordem sobre o que esse processo envolve.
Afinal, os profissionais devem agir no melhor interesse de uma companhia e de outras partes interessadas, como clientes e proprietários, e não devem ser indevidamente influenciados por suas próprias necessidades ou objetivos pessoais.
Definam, juntos, um projeto para atender às necessidades da organização, garantindo a adesão dos critérios estabelecidos para nomeações e maximizando os resultados em termos de aprendizados e recomendações práticas, certificando-se de que uma estrutura de governança apropriada esteja em vigor.
6 - Estruture a governança em seus 3 eixos
Mantenha-se na linha de frente com aqueles que transformam o mercado
Geralmente, empresas familiares possuem um know-how tecnológico, comercial, de processos ou de outras áreas que foi desenvolvido ao longo dos anos e transmitido de geração em geração para manter a perenidade da sua tradição. Para manter essa vantagem competitiva e tomar boas decisões, mesmo em cenários de alto grau de incerteza, antecipar questões de propriedade e gestão relacionadas ao planejamento sucessório é crucial para entender se a próxima geração está pronta, disposta e capaz.
A governança das empresas familiares deve levar em consideração a eficiência operacional para a perpetuidade do negócio. Para tal, laços familiares devem dar lugar à abertura necessária para a tomada das melhores decisões para aquele negócio.
Nesse sentido, questionar-se diariamente, desafiar as velhas estruturas e implementar um mindset de growth hacking são ótimas maneiras de ajudar a contornar as diferenças, manter as origens e ajudar a família a falar a uma só voz.