Na volta ao presencial, todos precisarão reaprender esta habilidade
No ambiente digital, sem querer, acabamos perdendo aquela habilidade de “ler” o outro
Publicado em 18 de novembro de 2021 às, 10h56.
Última atualização em 19 de novembro de 2021 às, 10h22.
Depois de quase dois anos sem falar em um público, rodeada de pessoas, daquele jeito frente a frente, olho no olho, cara a cara, tive o prazer de realizar um encontro presencial com 30 vice-presidentes e diretores de recursos humanos das principais organizações do país em um evento promovido pela Nespresso para o lançamento da pesquisa “Futuro do Ambiente de Trabalho no Cenário Pós-pandemia”.
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Que saudade que eu estava de encontrar com tantos profissionais que admiro e compartilhar ideias, conhecimento, opiniões, histórias e sabe o que mais? Emoções.
Durante a pandemia, continuamos a compartilhar tudo isso que listei acima, mas a transmissão da emoção por meio de expressões faciais, gestos, posturas, enfim, de tudo aquilo que não é dito com palavras é mais desafiadora no online.
Nesse ambiente digital, sem querer, podemos acabar perdendo aquela habilidade de “ler” o outro, de prestar atenção na linguagem corporal — e lá, naquele encontro, me peguei pensando nisso.
Nesse período de isolamento, desenvolvemos diversas habilidades de gestão à distância, aprendemos a flexibilizar e a adaptar rotinas, a usar diversos recursos tecnológicos, incorporar inovações digitais e assim por diante. Ao mesmo tempo que adquirimos novos itens para a nossa caixa de ferramentas, deixamos outros de lado sem perceber.
Chegou a hora de tirar o pó de alguns desses instrumentos pouco utilizados nos últimos tempos, mas extremamente importantes. E, se eu fosse escolher um, começaria pela comunicação não-verbal. Algo que você, um dia, já foi realmente muito bom! E, quando me refiro ao passado, não estou falando da época pré-pandêmica, e sim daquele período na vida em que as únicas formas de comunicação “disponíveis” eram, de alguma forma, a sua linguagem corporal.
Quando você ainda não sabia falar e dependia de um sorriso, uma careta, um dedo indicador apontando algo, um choro, uma risada e “recursos” similares utilizados em abundância na infância. Formas de comunicação que, aos poucos, vão criando vínculos fortes e verdadeiros entre as pessoas — neste caso, entre a criança e seus pais.
Olhar para trás pode dar essa pista de que a comunicação não-verbal é intrínseca e natural aos indivíduos, mas vai perdendo espaço para a comunicação verbal conforme ficamos mais velhos. Não que você deixe de se expressar usando seu corpo, é só que, talvez, pare de prestar atenção nisso. Deixamos de reparar tanto nos nossos próprios gestos, quanto nos dos outros e isso pode trazer um impacto nessa conexão que comentei.
Uma conexão que aprendemos a fazer na infância, porém parecemos “esquecer” como criá-la com outras pessoas ao longo da vida.
Lá no evento, diante de todos, prestando atenção em como os convidados sorriam, acenavam a cabeça, cruzavam e descruzavam os braços, se mexiam na carreira, pensei na diferença que é transmitir um conteúdo dessa forma. Não que eu não goste dessa nossa relação aqui, verbal, por meio dos artigos semanais e a troca de comentários. Mas é que, nessa plataforma, eu só tenho uma parte de vocês e vocês também só têm contato com uma parte de mim.
Uma vez, ouvi que as comunicações, verbal e a não-verbal, são como peças de Lego: cada palavra dita, cada frase escrita, cada sorriso dado, cada gesto feito, representam peças diferentes que, juntas, vão formando uma parte da nossa imagem.
Pense em como uma mesma frase falada (comunicação verbal) soa diferente dependendo da entonação (comunicação não-verbal). Uma só palavra ganha um sentido totalmente diferente dependendo só do tom da sua voz: um “Parabéns!” pode ser uma grande demonstração de alegria, mas pode soar também como uma provocação se dito com uma pitada de sarcasmo.
Um olhar pode transmitir um pedido de ajuda ou uma confidência, dois dedos flexionando e fazendo o sinal de aspas muda totalmente o sentido do que acabou de ser dito, um movimento para se afastar fisicamente de outra pessoa pode indicar um incômodo, pausas longas entre uma frase e outra também dizem muito, uma pessoa que balança o pé freneticamente durante uma reunião pode passar uma impressão de ansiedade.
A comunicação não-verbal vai desde expressões faciais, entonação, ritmo da fala até movimentos do corpo, postura e forma de se vestir. E nem sempre é fácil notar essas nuances.
A dificuldade, contudo, não é só por causa das telas — não podemos ser injustos e achar que a vida digital é a origem dos nossos problemas de comunicação —, mas por conta do tempo. Na verdade, da falta de dedicação de tempo para prestarmos mais atenção nos outros.
Quantas vezes não tiramos conclusões precipitadas do que alguém falou ou escreveu? Quantas vezes não interpretamos errado? Quantas vezes não deixamos os nossos vieses interferirem no nosso julgamento? E, veja, isso pode acontecer também fazendo leituras apressadas desses sinais não-verbais.
Afinal, nem sempre um braço cruzado significa desconforto ou uma postura fechada para uma ideia. E se o ar-condicionado estiver forte e a pessoa apenas está demonstrando frio? E se for simplesmente um hábito? Da mesma forma, um olhar distante não necessariamente é sinônimo de desinteresse, pode ser apenas um sinal de contemplação ou reflexão. A comunicação não-verbal também depende de contexto.
Criar conexões com as pessoas demanda tempo, paciência e observação. E, agora, talvez seja necessário readequarmos os nossos hábitos para, então, voltarmos a nos relacionar por inteiro com as pessoas. Reaprender a assistir a uma apresentação apenas olhando para quem fala, em vez de só escutar o evento ou a reunião enquanto checa os e-mails do trabalho ou adianta algum relatório.
Reaprender a prestar atenção em cada colaborador da sua equipe, tanto no que ele diz, quanto no que ele demonstra. E deixando também que ele perceba isso em você, o quanto você diz por meio das palavras, mas o quanto o “não-dito” também comunica.
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