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Dois ou seis anos desafiadores pela frente?

O governo tenta reverter a sangria de popularidade fazendo o inverso do que se precisa

Brasília (DF), 14/01/2025 - Presidente da República, Luiz Inácio Lula da Silva, durante cerimônia de lançamento do programa Mais Professores, no Palácio do Planalto. Foto: Ricardo Stuckert/PR (Ricardo Stuckert/Agência Brasil)

Brasília (DF), 14/01/2025 - Presidente da República, Luiz Inácio Lula da Silva, durante cerimônia de lançamento do programa Mais Professores, no Palácio do Planalto. Foto: Ricardo Stuckert/PR (Ricardo Stuckert/Agência Brasil)

Sergio Vale
Sergio Vale

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Publicado em 27 de fevereiro de 2025 às 19h55.

O governo Lula não poderia começar seu terceiro ano de mandato de forma pior. Primeiro, o choque da posse de Trump. Havia a expectativa de que seríamos deixados de lado por enquanto e o foco seria a China e a Rússia. Em uma reviravolta típica do presidente americano, China e Rússia viraram amigos e os inimigos estão na América. Além do aumento de tarifa contra o Brasil, seja no aço seja a recíproca, há também a pressão inédita da política americana contra um membro da Suprema Corte brasileira, Alexandre de Moraes. Trump imita os piores presidentes latinos cada vez mais.

Não bastassem os choques externos, seguem as dificuldades internas. O governo não entendeu a necessidade de um choque fiscal mais robusto nos gastos e, para piorar, adiciona estímulos na economia e busca a isenção do imposto de renda para quem ganha até R$ 5 mil. O timing não poderia ser pior em um momento de inflação estacionada em 5% e caminhando para ficar acima disso até o final do ano. Com a Selic tendo que ir para algo em torno de 15%, o estrago da atividade está dado para este ano e especialmente 2026.

Os resultados na popularidade do presidente vieram com rapidez. É verdade que parte importante disso tem a ver com o caso PIX em janeiro, mas o fato é que os números do presidente viam caindo desde o final do ano passado. O choque negativo do pacote fiscal, com repercussões gerais negativas na economia em dezembro, deu o início da queda de apelo pelo presidente. A crença do governo é que a população aceitaria aumentos de impostos e não embaraçaria em corte de gastos, que isso seria impopular, sem falar na própria crença econômica do governo. Mas o fato é que o governo teve que começar a apelar a aumento de impostos que afetaram todas as faixas de renda, como a agora famosa “taxa das blusinhas”. O fato é que já faz tempo que a sociedade é refratária a aumento de impostos em uma sociedade que já paga muito imposto. É meritório o governo querer melhorar a qualidade desse imposto, ou seja, taxar a camada mais rica da população. Mas sem conseguir o aumento necessário de arrecadação, o governo teve que partir para outras frentes de taxação.

O governo tenta reverter a sangria de popularidade fazendo o inverso do que se precisa. A economia ainda está aquecida, como mostrou o dado do Caged de janeiro, mesmo que a desaceleração já dê as caras e indique que o crescimento econômico este ano não conseguirá ser maior do que 2%. Esse futuro nada promissor pressiona a ala política do governo por mais medidas de estímulo. Haddad, que já estava fraco, diminui ainda mais pela pressão que vem do Palácio. A crença de que segurar o crescimento a qualquer custo vai ajudar a manter a arrecadação e o resultado fiscal melhores esbarra no fato de que a necessidade agora é de menos crescimento para controlar a inflação, e não contrário.

Há dois anos temos vivido esse cenário, na verdade. O mercado teve boa vontade com o governo em um momento que estava claro que não se conseguiria entregar um resultado fiscal razoável dado o caminho escolhido pelo governo. A conta de mudar isso fica proibitiva num terceiro ano de mandato ao mesmo tempo que não mudar é ainda pior, com consequências econômicas e políticas para o próprio governo.

Obviamente, Lula não é carta fora do baralho. Não estamos falando de um político qualquer. Não se pode minimizar a capacidade política do presidente de tirar leite de pedra. Entretanto, Lula navegou em eleições no passado em que a oposição a ele estava extremamente enfraquecida ou ele mesmo muito forte. Hoje, ele se encontra fragilizado e a oposição mais fortalecida, em que pese esfacelada. AS chances de uma derrota de Lula aumentaram e não se pode esquecer que mesmo com tudo que Bolsonaro fez de errado na pandemia, Lula ganhou de apenas 1,8 milhões de votos.

Isso significa que a direita tem mais chances, mas fica a dúvida de que direita. Vai ser uma direita minimamente menos polarizadora, que seria o caso do governador de São Paulo, Tarcísio de Freitas, ou Bolsonaro vai repetir o script de Lula de 2018 e impor alguém que lhe faça a mínima sobra possível? Bolsonaro luta pela sobrevivência política e jurídica. A saída de escolher alguém muito próximo, da família especialmente, segue sendo uma possibilidade bastante real.

Sendo isso verdade e não aparecendo uma solução mais consensos e de centro, a opção será por mais polarização e dificuldade de gerir a economia a partir de 2027. Será necessário um grande esforça de agenda para mudar a política fiscal e uma grande capacidade de negociação com o Congresso para que essa agenda aconteça. Seria necessário um FHC ou um Tancredo, mas como sabemos, não temos políticos dessa lavra há muitos anos. Com isso, o risco é que os desacertos da economia não durem apenas os próximos dois anos, mas sim um período mais longo, que englobaria o próximo mandato. O custo de não se fazer nada será alto, mas a vontade política para que mudanças reais aconteça também terá que estar presente.

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