A opção de longo prazo do governo Temer
O governo está apenas há poucas semanas no poder, mas começam a surgir certas dúvidas sobre sua capacidade de entrega. Alguns questionamentos surgiram especificamente na seara fiscal, na qual um pacote de bondades foi sendo divulgado ao longo do período. Ao mesmo tempo, a política monetária resolveu tomar uma postura mais agressiva para trazer a inflação […]
Da Redação
Publicado em 5 de julho de 2016 às 12h42.
Última atualização em 22 de junho de 2017 às 18h09.
O governo está apenas há poucas semanas no poder, mas começam a surgir certas dúvidas sobre sua capacidade de entrega. Alguns questionamentos surgiram especificamente na seara fiscal, na qual um pacote de bondades foi sendo divulgado ao longo do período. Ao mesmo tempo, a política monetária resolveu tomar uma postura mais agressiva para trazer a inflação para a meta já em 2017. Ficou a impressão de que há, novamente, um descompasso entre Fazenda e Banco Central: enquanto a política fiscal não sinaliza aperto real com a regra do teto do gasto e a reforma da previdência, a política monetária teria que ficar mais apertada para compensar o atraso fiscal.
Há duas leituras possíveis a serem feitas para entender o que está acontecendo. Uma, mais otimista, mostra o atual momento como uma tentativa de o governo nos reacostumar com políticas de longo prazo. Ao longo dos últimos anos, pelo menos desde o segundo mandato do governo Lula, o voluntarismo de curtíssimo prazo tomou conta das ações do governo: o preço da gasolina não subia porque afetaria a inflação do mês seguinte; se algum setor estivesse em dificuldade era criada uma desoneração ou abatimento de IPI para estimular demanda; se precisava crescer de qualquer maneira, baixar a taxa de juros para 7,25% era a solução, porque, afinal, na cabeça do governo anterior bastava um mix de política monetária e fiscal para fazer o setor crescer…
Esse excesso de tentativas de curto prazo de estimular demanda não apenas não surtiu efeito, como também nos acostumou com tais ações. O governo atual parece optar por decisões de longo prazo, tanto na questão fiscal quanto na monetária. Na primeira, a regra do teto tem esse objetivo. Ao se sugerir controle do aumento de gasto por vinte anos, com revisão em dez, engessará de forma positiva o grande problema fiscal do país que é o aumento significativo do gasto público todos os anos. No curto prazo, houve a decisão de ajustar salários e programas que podem parecer contraproducentes, dada a necessidade de controle de gasto. Mas a decisão de aumentá-lo agora pode vir pela ideia de que serão vários anos de controle mais rígido de gasto, o que adicionalmente facilitaria sua aprovação pelo Congresso. É a ideia de quebrar alguns ovos no curto prazo para se ter o objetivo de longo prazo. Além disso, há a explicitação de gastos que haviam sido apenas postergados, a renegociação necessária com os Estados, e a possibilidade de novos buracos aparecerem em empresas estatais nos próximos anos. Tudo isso incha o gasto, podendo dar a impressão de um caminho contrário do adequado. A ideia de longo prazo fica clara quando se lembra que se o governo fizesse um ajuste de gasto público real forte no ano que vem poderia chegar com mais facilidade em um primário zerado já no próximo ano. Não custa lembrar que a interinidade do presidente também é um elemento complicador nisso tudo.
Na política monetária a atuação parece ser a mesma. A ideia é trazer a inflação para a meta — esse é objetivo de curto prazo —, mas também, com a visão de longo prazo, baixar de forma mais permanente a inflação. Não há razão para países que têm metas de inflação há tempo tempo ter ainda esse número em 4,5%. O objetivo de longo prazo de buscar a meta aumenta a credibilidade, faz com que os juros fiquem mais elevados durante mais tempo, e traz o problema de curto prazo de um câmbio que aprecia mais intensamente, além da pressão financeira nas empresas pela manutenção de um custo financeiro ainda elevado. De novo, uma visão de longo prazo na qual são criados alguns problemas no curto prazo.
Mas em economia não existem caminhos fáceis para o longo prazo, especialmente quando o governo ainda é politicamente frágil e possa precisar aparentemente ceder na questão fiscal no curto prazo. Mas é um ceder com um objetivo definido de longo prazo.
Essa é a visão otimista: há um planejamento sendo feito, com desvios de curto prazo, mas com um objetivo maior de longo prazo.
A outra possibilidade — e esta o mercado teme — é que o governo está perdendo a capacidade na política fiscal de forma premeditada e está cedendo muito mais do que deveria, impossibilitando um ajuste fiscal real, com mais bondades a caminho, sem intenção de realizar nenhum aumento de imposto. Seria o velho PMDB de sempre. Ao mesmo tempo, o BC teria que fazer o trabalho que o fiscal não está fazendo, especialmente pela expectativa que o banco tem da aprovação das regras fiscais para decidir sobre a flexibilidade da política monetária.
Essa é uma visão negativa que, se comprovada, acabará por levar boa parte da equipe econômica a começar a ser desmontada. Creio ser difícil acreditar que os bons nomes que foram chamados fiquem em um governo que escolhe descarrilhar por opção própria.
Está, assim, nas mãos do governo se no final do ano veremos o cenário otimista ou pessimista se desenhar. Qual deve seria o cenário realista? Minha aposta ainda é na primeira opção, que dará tempo para que as políticas de longo prazo comecem a ser implementadas, especialmente a fiscal. Optar pelo outro caminho não é uma opção, é um suicídio político que o PMDB novamente cometeria, e que lembraria os desacertos do Plano Cruzado em 1986.
O governo está apenas há poucas semanas no poder, mas começam a surgir certas dúvidas sobre sua capacidade de entrega. Alguns questionamentos surgiram especificamente na seara fiscal, na qual um pacote de bondades foi sendo divulgado ao longo do período. Ao mesmo tempo, a política monetária resolveu tomar uma postura mais agressiva para trazer a inflação para a meta já em 2017. Ficou a impressão de que há, novamente, um descompasso entre Fazenda e Banco Central: enquanto a política fiscal não sinaliza aperto real com a regra do teto do gasto e a reforma da previdência, a política monetária teria que ficar mais apertada para compensar o atraso fiscal.
Há duas leituras possíveis a serem feitas para entender o que está acontecendo. Uma, mais otimista, mostra o atual momento como uma tentativa de o governo nos reacostumar com políticas de longo prazo. Ao longo dos últimos anos, pelo menos desde o segundo mandato do governo Lula, o voluntarismo de curtíssimo prazo tomou conta das ações do governo: o preço da gasolina não subia porque afetaria a inflação do mês seguinte; se algum setor estivesse em dificuldade era criada uma desoneração ou abatimento de IPI para estimular demanda; se precisava crescer de qualquer maneira, baixar a taxa de juros para 7,25% era a solução, porque, afinal, na cabeça do governo anterior bastava um mix de política monetária e fiscal para fazer o setor crescer…
Esse excesso de tentativas de curto prazo de estimular demanda não apenas não surtiu efeito, como também nos acostumou com tais ações. O governo atual parece optar por decisões de longo prazo, tanto na questão fiscal quanto na monetária. Na primeira, a regra do teto tem esse objetivo. Ao se sugerir controle do aumento de gasto por vinte anos, com revisão em dez, engessará de forma positiva o grande problema fiscal do país que é o aumento significativo do gasto público todos os anos. No curto prazo, houve a decisão de ajustar salários e programas que podem parecer contraproducentes, dada a necessidade de controle de gasto. Mas a decisão de aumentá-lo agora pode vir pela ideia de que serão vários anos de controle mais rígido de gasto, o que adicionalmente facilitaria sua aprovação pelo Congresso. É a ideia de quebrar alguns ovos no curto prazo para se ter o objetivo de longo prazo. Além disso, há a explicitação de gastos que haviam sido apenas postergados, a renegociação necessária com os Estados, e a possibilidade de novos buracos aparecerem em empresas estatais nos próximos anos. Tudo isso incha o gasto, podendo dar a impressão de um caminho contrário do adequado. A ideia de longo prazo fica clara quando se lembra que se o governo fizesse um ajuste de gasto público real forte no ano que vem poderia chegar com mais facilidade em um primário zerado já no próximo ano. Não custa lembrar que a interinidade do presidente também é um elemento complicador nisso tudo.
Na política monetária a atuação parece ser a mesma. A ideia é trazer a inflação para a meta — esse é objetivo de curto prazo —, mas também, com a visão de longo prazo, baixar de forma mais permanente a inflação. Não há razão para países que têm metas de inflação há tempo tempo ter ainda esse número em 4,5%. O objetivo de longo prazo de buscar a meta aumenta a credibilidade, faz com que os juros fiquem mais elevados durante mais tempo, e traz o problema de curto prazo de um câmbio que aprecia mais intensamente, além da pressão financeira nas empresas pela manutenção de um custo financeiro ainda elevado. De novo, uma visão de longo prazo na qual são criados alguns problemas no curto prazo.
Mas em economia não existem caminhos fáceis para o longo prazo, especialmente quando o governo ainda é politicamente frágil e possa precisar aparentemente ceder na questão fiscal no curto prazo. Mas é um ceder com um objetivo definido de longo prazo.
Essa é a visão otimista: há um planejamento sendo feito, com desvios de curto prazo, mas com um objetivo maior de longo prazo.
A outra possibilidade — e esta o mercado teme — é que o governo está perdendo a capacidade na política fiscal de forma premeditada e está cedendo muito mais do que deveria, impossibilitando um ajuste fiscal real, com mais bondades a caminho, sem intenção de realizar nenhum aumento de imposto. Seria o velho PMDB de sempre. Ao mesmo tempo, o BC teria que fazer o trabalho que o fiscal não está fazendo, especialmente pela expectativa que o banco tem da aprovação das regras fiscais para decidir sobre a flexibilidade da política monetária.
Essa é uma visão negativa que, se comprovada, acabará por levar boa parte da equipe econômica a começar a ser desmontada. Creio ser difícil acreditar que os bons nomes que foram chamados fiquem em um governo que escolhe descarrilhar por opção própria.
Está, assim, nas mãos do governo se no final do ano veremos o cenário otimista ou pessimista se desenhar. Qual deve seria o cenário realista? Minha aposta ainda é na primeira opção, que dará tempo para que as políticas de longo prazo comecem a ser implementadas, especialmente a fiscal. Optar pelo outro caminho não é uma opção, é um suicídio político que o PMDB novamente cometeria, e que lembraria os desacertos do Plano Cruzado em 1986.