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STF pode ter um novo papel em 2020

Se Bolsonaro e Legislativo acirrarem o conflito, caberá aos onze juízes escolher um dos lados

Supremo Tribunal Federal: STF poderá ser chamado a opinar, novamente, sobre temas caros à agenda presidencial (Rosinei Coutinho/SCO/STF/Divulgação)
Supremo Tribunal Federal: STF poderá ser chamado a opinar, novamente, sobre temas caros à agenda presidencial (Rosinei Coutinho/SCO/STF/Divulgação)
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Sérgio Praça

Publicado em 27 de dezembro de 2019 às, 17h33.

Última atualização em 27 de dezembro de 2019 às, 17h35.

Os onze juízes do Supremo Tribunal Federal (STF) passaram boa parte dos últimos anos ocupados com as idas e vindas da Operação Lava Jato. Tomaram decisões cruciais para o sucesso da força-tarefa e alguns, como Gilmar Mendes, envolveram-se em discussões com procuradores como Deltan Dallagnol e Carlos Fernando Lima. A deslegitimação do Ministério Público Federal após as revelações do site The Intercept caiu bem para o STF. Dallagnol e colegas perderam apoio público – tanto que até têm corrido atrás de influenciadores de internet para retomarem a capacidade de ludibriar os brasileiros com a retórica populista anti-sistema.

Eleito em parte por falar como esses procuradores, Jair Bolsonaro pode acabar forçando um confronto inédito com o STF. Mais do que seus antecessores, Bolsonaro não tem tido sucesso em fazer aprovar as medidas provisórias que envia ao Congresso Nacional. 24 das 42 medidas provisórias do presidente já tiveram prazo expirado – ou seja, uma decisão definitiva sobre elas já foi tomada pelos parlamentares. Metade das MPs foi rejeitada pelo Congresso. Isso indica que Bolsonaro não está calculando bem o apoio legislativo para boa parte de suas ideias.

E há um indicativo – ainda pequeno, mas com potencial para aumentar – de que Bolsonaro não necessariamente aceita ser rejeitado pelo Legislativo. Em junho, reenviou em uma medida provisória a transferência da demarcação de terras indígenas (prerrogativa da Fundação Nacional do Índio, a Funai) para o Ministério da Agricultura. A mudança já havia sido rejeitada no Legislativo, mas Bolsonaro insistiu.

Então o presidente do Senado, Davi Alcolumbre (DEM), e Luís Roberto Barroso (Sem Partido) no STF rejeitaram a proposta. Alcolumbre “devolveu” este trecho da medida provisória para o presidente (ou seja, recusou-se a iniciar a tramitação legislativa do trecho) e Barroso suspendeu a tramitação de toda a MP. Bolsonaro não reagiu. Acatou a permanência da demarcação de terras indígenas na Funai. (Em agosto a comissão que analisou a MP começou seus trabalhos e, finalmente, a MP foi aprovada com vetos parciais do presidente duas semanas atrás.)

Mas é possível que, no próximo semestre, a competição eleitoral torne mais acirrada a disputa entre Legislativo e Executivo. Assim, o STF poderá ser chamado para opinar, novamente, sobre temas caros à agenda presidencial. Os onze juízes sentirão saudades de discutir pelo Twitter com Dallagnol, ou de com ele participar de eventos “contra a corrupção”.

Sérgio Praça, cientista político

(Foto/Exame)

*Este artigo expressa a opinião do autor, não representando necessariamente a opinião institucional de EXAME ou da Fundação Getúlio Vargas.