Quem manda na Câmara dos Deputados?
Enquanto os parlamentares estiverem focados na Previdência, indefinição de interlocutores do governo será menos grave do que parece
Da Redação
Publicado em 26 de abril de 2019 às 20h14.
Última atualização em 26 de abril de 2019 às 22h48.
Rodrigo Maia (DEM) acaba de dar uma entrevista para Severino Motta, do BuzzFeed, sobre como está sua vida nessas últimas semanas. O site achou por bem destacar, na manchete, o diagnóstico de Maia sobre os dois filhos mais honestos de Bolsonaro , Carlos e Eduardo: “um é para internar, o outro é deslumbrado”. Não é do feitio de Maia julgar os outros assim – e não é o que ele faz no resto da entrevista. O presidente da Câmara afirma, em diversos momentos, que as relações Executivo-Legislativo melhoraram bastante nos últimos dias. Na Casa Civil, Onyx Lorenzoni (DEM) tem se esforçado mais. O discurso do presidente Bolsonaro (PSL) defendendo a Reforma da Previdência caiu muito bem para Maia e muitos deputados. Ainda assim, o governo está longe de ter uma sólida base de apoio. Se não é o presidente que manda na Câmara dos Deputados através de suas relações com partidos políticos, quem é?
Depois dos períodos Dilma-Cunha, Temer-Maia e agora com o início de Bolsonaro-Maia, o conceito de “presidencialismo de coalizão” precisa ser mais bem explicado. Nos dezesseis anos de Fernando Henrique Cardoso (PSDB) e Lula (PT), salvo um ou outro período de estranhamento, os presidentes tiveram ótimas relações com líderes partidários e o comandante da Câmara dos Deputados. Essa é – ou era – a base institucional do sistema político brasileiro. Negociações baseadas em relacionamentos entre o presidente, partidos políticos e líderes legislativos sustentaram o país de 1995 a 2015.
Com a ascensão de Eduardo Cunha (PMDB) à presidência da Câmara no início de 2015, o jogo mudou. Pela primeira vez sob a Constituição de 1988, o país passou a ter como organizador da agenda legislativa – mais tecnicamente, como gatekeeper das propostas que vão para o plenário – um deputado brigado com a presidente. Mas Cunha, como bem observou Fernando Limongi em seu colérico artigo sobre o emedebista, tinha apenas o poder de bloquear propostas da presidente – e não de fazer avançar uma agenda própria. (O texto “O passaporte de Cunha e o impeachment: a crônica de uma tragédia anunciada” foi publicado na Novos Estudos Cebrap em 2015.)
No jargão da Ciência Política, Cunha tinha “poder negativo” em vez de “positivo”. E aí ninguém mandava na Câmara, pois nem a presidente da República nem o presidente da Câmara reuniam os dois poderes fundamentais: decidir o que – e quando – vai ser votado e formar maiorias consistentes ao longo do tempo para aprovar esse conjunto de propostas. Dilma Rousseff (PT) não definiu bem sua agenda e perdeu a capacidade de formar maiorias a partir da entrada de Cunha na presidência da Câmara. E o parlamentar não tinha como convencer os deputados a apoiarem suas propostas bastante conservadoras.
Hoje, Bolsonaro não merece totalmente seu apelido de “Dilmo”. Por enquanto, o governo tem uma agenda legislativa econômica clara, iniciada com a Reforma da Previdência . Mas o esforço para formar maiorias está todo com Rodrigo Maia – que, como já disse, agora elogia a nova atitude do chefe da Casa Civil.
Não há crise no Legislativo. Os partidos – especialmente o do presidente – estão se ajustando às suas funções. Os membros do Centrão fazem seu jogo: apoiar o governo em troca de influência nas nomeações de cargos de confiança. O problema é que, como na época Dilma-Cunha, ninguém manda na Câmara dos Deputados. Maia não é, porque o único interlocutor crível para definir cargos de confiança é Onyx Lorenzoni . E este, chefe da Casa Civil, está longe de formular a agenda legislativa do governo – trabalho de Paulo Guedes e, em menor grau, Sergio Moro.
Mas enquanto os parlamentares analisam a Reforma da Previdência – uma política pública clara, com negociação avançada, discutida diariamente há meses –, esta indefinição de interlocutores é menos grave do que parece. As coisas estão andando porque a crise fiscal é gravíssima e o governo vai parar em 2022 caso nada seja feito.
Rodrigo Maia (DEM) acaba de dar uma entrevista para Severino Motta, do BuzzFeed, sobre como está sua vida nessas últimas semanas. O site achou por bem destacar, na manchete, o diagnóstico de Maia sobre os dois filhos mais honestos de Bolsonaro , Carlos e Eduardo: “um é para internar, o outro é deslumbrado”. Não é do feitio de Maia julgar os outros assim – e não é o que ele faz no resto da entrevista. O presidente da Câmara afirma, em diversos momentos, que as relações Executivo-Legislativo melhoraram bastante nos últimos dias. Na Casa Civil, Onyx Lorenzoni (DEM) tem se esforçado mais. O discurso do presidente Bolsonaro (PSL) defendendo a Reforma da Previdência caiu muito bem para Maia e muitos deputados. Ainda assim, o governo está longe de ter uma sólida base de apoio. Se não é o presidente que manda na Câmara dos Deputados através de suas relações com partidos políticos, quem é?
Depois dos períodos Dilma-Cunha, Temer-Maia e agora com o início de Bolsonaro-Maia, o conceito de “presidencialismo de coalizão” precisa ser mais bem explicado. Nos dezesseis anos de Fernando Henrique Cardoso (PSDB) e Lula (PT), salvo um ou outro período de estranhamento, os presidentes tiveram ótimas relações com líderes partidários e o comandante da Câmara dos Deputados. Essa é – ou era – a base institucional do sistema político brasileiro. Negociações baseadas em relacionamentos entre o presidente, partidos políticos e líderes legislativos sustentaram o país de 1995 a 2015.
Com a ascensão de Eduardo Cunha (PMDB) à presidência da Câmara no início de 2015, o jogo mudou. Pela primeira vez sob a Constituição de 1988, o país passou a ter como organizador da agenda legislativa – mais tecnicamente, como gatekeeper das propostas que vão para o plenário – um deputado brigado com a presidente. Mas Cunha, como bem observou Fernando Limongi em seu colérico artigo sobre o emedebista, tinha apenas o poder de bloquear propostas da presidente – e não de fazer avançar uma agenda própria. (O texto “O passaporte de Cunha e o impeachment: a crônica de uma tragédia anunciada” foi publicado na Novos Estudos Cebrap em 2015.)
No jargão da Ciência Política, Cunha tinha “poder negativo” em vez de “positivo”. E aí ninguém mandava na Câmara, pois nem a presidente da República nem o presidente da Câmara reuniam os dois poderes fundamentais: decidir o que – e quando – vai ser votado e formar maiorias consistentes ao longo do tempo para aprovar esse conjunto de propostas. Dilma Rousseff (PT) não definiu bem sua agenda e perdeu a capacidade de formar maiorias a partir da entrada de Cunha na presidência da Câmara. E o parlamentar não tinha como convencer os deputados a apoiarem suas propostas bastante conservadoras.
Hoje, Bolsonaro não merece totalmente seu apelido de “Dilmo”. Por enquanto, o governo tem uma agenda legislativa econômica clara, iniciada com a Reforma da Previdência . Mas o esforço para formar maiorias está todo com Rodrigo Maia – que, como já disse, agora elogia a nova atitude do chefe da Casa Civil.
Não há crise no Legislativo. Os partidos – especialmente o do presidente – estão se ajustando às suas funções. Os membros do Centrão fazem seu jogo: apoiar o governo em troca de influência nas nomeações de cargos de confiança. O problema é que, como na época Dilma-Cunha, ninguém manda na Câmara dos Deputados. Maia não é, porque o único interlocutor crível para definir cargos de confiança é Onyx Lorenzoni . E este, chefe da Casa Civil, está longe de formular a agenda legislativa do governo – trabalho de Paulo Guedes e, em menor grau, Sergio Moro.
Mas enquanto os parlamentares analisam a Reforma da Previdência – uma política pública clara, com negociação avançada, discutida diariamente há meses –, esta indefinição de interlocutores é menos grave do que parece. As coisas estão andando porque a crise fiscal é gravíssima e o governo vai parar em 2022 caso nada seja feito.