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Por que ignoramos a violência política?

Marielle Franco é a exceção que confirma a regra: assassinatos de candidatos e militantes não podem ser tratados como normais

Aqui perdoamos todos os assassinatos, violentos ou não, políticos ou não (Emmanuele Contini/NurPhoto//Getty Images)
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isabelarovaroto

Publicado em 14 de novembro de 2020 às 21h49.

Um dos documentários mais impactantes que já vi se chama “The Act of Killing”, sobre violência política na Indonésia. Foi realizado cinco décadas após o massacre de cerca de um milhão de esquerdistas por simpatizantes de Suharto, que assumiu o governo um ano após o fim dos assassinatos. No filme, militantes reencenam seus atos com orgulho e risadas. Justificam-se com o conhecido argumento do perigo do comunismo. O presidente Sukarno, que governava com os comunistas, tinha até se encontrado com Zhou Enlai – vice, na prática, do genocida chinês Mao Zedong. O massacre indonésio foi ideológico.

Esse é o “normal” da violência política. Alguém com poder – estando no governo ou não – opta por eliminar seus oponentes à força. Quando a rebelião assassina funciona, como no caso da Indonésia nos anos sessenta, os criminosos perdoam seus próprios crimes. Em outro caso emblemático – o México nos anos finais do século XX –, os governantes perdoam tacitamente os assassinos da oposição. (O argumento é feito por Sara Schatz no artigo “Disarming the legal system: impunity for the political murder of dissidents in Mexico”, publicano na International Criminal Justice Review em 2008.)

Nenhum desses é semelhante ao caso brasileiro. Aqui perdoamos todos os assassinatos, violentos ou não, políticos ou não. Segundo um levantamento do Centro de Estudos de Segurança e Cidadania, 82 militantes e candidatos foram assassinados em 2020. Não há levantamento sistemático do Ministério da Justiça sobre isso. Não há mobilização do Tribunal Superior Eleitoral. Partidos políticos ignoram o tema. Cidadãos vão votar sem a menor atenção a isto.

Melhor seria se nossos assassinos se escancarassem e fizessem comédia com os mortos daqui a alguns anos. Pelo menos saberíamos suas identidades.

(Este artigo expressa a opinião do autor, não representando necessariamente a opinião institucional da FGV.)

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Um dos documentários mais impactantes que já vi se chama “The Act of Killing”, sobre violência política na Indonésia. Foi realizado cinco décadas após o massacre de cerca de um milhão de esquerdistas por simpatizantes de Suharto, que assumiu o governo um ano após o fim dos assassinatos. No filme, militantes reencenam seus atos com orgulho e risadas. Justificam-se com o conhecido argumento do perigo do comunismo. O presidente Sukarno, que governava com os comunistas, tinha até se encontrado com Zhou Enlai – vice, na prática, do genocida chinês Mao Zedong. O massacre indonésio foi ideológico.

Esse é o “normal” da violência política. Alguém com poder – estando no governo ou não – opta por eliminar seus oponentes à força. Quando a rebelião assassina funciona, como no caso da Indonésia nos anos sessenta, os criminosos perdoam seus próprios crimes. Em outro caso emblemático – o México nos anos finais do século XX –, os governantes perdoam tacitamente os assassinos da oposição. (O argumento é feito por Sara Schatz no artigo “Disarming the legal system: impunity for the political murder of dissidents in Mexico”, publicano na International Criminal Justice Review em 2008.)

Nenhum desses é semelhante ao caso brasileiro. Aqui perdoamos todos os assassinatos, violentos ou não, políticos ou não. Segundo um levantamento do Centro de Estudos de Segurança e Cidadania, 82 militantes e candidatos foram assassinados em 2020. Não há levantamento sistemático do Ministério da Justiça sobre isso. Não há mobilização do Tribunal Superior Eleitoral. Partidos políticos ignoram o tema. Cidadãos vão votar sem a menor atenção a isto.

Melhor seria se nossos assassinos se escancarassem e fizessem comédia com os mortos daqui a alguns anos. Pelo menos saberíamos suas identidades.

(Este artigo expressa a opinião do autor, não representando necessariamente a opinião institucional da FGV.)

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