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Por que alguns ministros são radicais?

Ao que parece, todos os ministros agem como “ditadores” em suas áreas específicas e não sofrem sanção alguma por isso, o que torna o ministério mais conservador do que a média

ABRAHAM WEINTRAUB: ministro da educação anunciou que vai cortar recursos de universidades que não apresentarem desempenho acadêmico esperado / REUTERS/Adriano Machado
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Da Redação

Publicado em 3 de maio de 2019 às 19h31.

Uma rápida passeada pela lista de ministros nomeados por Jair Bolsonaro (PSL) revela pelo menos três com posições radicais em suas áreas: Abraham Weintraub (Educação), Ernesto Araújo (Relações Exteriores) e Ricardo Salles (Meio Ambiente). Araújo defende, por exemplo, que o nazismo foi “de esquerda”. Weintraub acredita que professores podem ser filmados por alunos e terem suas falas divulgadas pelas redes sociais. O ministro da Educação também pensa que universidades federais que organizam eventos políticos devem ter verbas cortadas. Salles é acusado de alterar mapas de proteção ambiental quando foi secretário municipal e, agora no ministério, defende a simplificação de processos de licenciamento ambiental – algo estranho para um ministro do Meio Ambiente.

Sem entrar no mérito dessas posições, elas não são compartilhadas por muita gente – inclusive vários outros ministros do governo. Por que, então, os ministros não moderam suas propostas? Por que Weintraub não define critérios menos agressivos para cortar o orçamento de universidades? Por que Araújo não remete a historiadores a tarefa de explicar o nazismo? Por que Salles defende de modo tão explícito a aceleração de obras que afetam o ambiente? Há duas respostas.

Todo ministério composto por pessoas de diferentes partidos políticos (ou mesmo sem filiação partidária) precisa contemplar preferências diversas sobre políticas públicas. Em outras palavras, é necessário garantir um acordo mínimo entre os ministros para que ninguém saia implementando políticas que são completamente irrazoáveis. Em alguns países parlamentares, como Bélgica e Holanda, acordos programáticos durante a campanha eleitoral entre os partidos políticos que podem formar uma coalizão são uma maneira de minimizar este problema. Os partidos podem concordar em uma política ambiental moderada (ou seja, que não se distancia muito do status quo ) e em uma política fiscal superavitária, que implica gastar muito menos do que o governo anterior. Assim, quando o governo começa, há um acordo mínimo sobre o espaço disponível para cada ministro implementar suas preferências. Nesse esquema, se a política de segurança pública decidida no acordo for do tipo “moderada”, um ministro como Sergio Moro provavelmente não seria nomeado.

Acordos programáticos são limitados por ao menos três circunstâncias em sistemas presidencialistas: i) como a eleição (e continuação do mandato) do presidente não depende de seu partido político, ele terá facilidade e incentivos para sair do acordo quando for conveniente; ii) partidos políticos podem não ser programáticos e não terem bases ideológicas mínimas para estabelecer acordos desse tipo; iii) o mundo é dinâmico e as tarefas ministeriais podem mudar repentinamente – portanto, em termos técnicos, o contrato com ministros sempre será “incompleto”.

Os cientistas políticos Tiberiu Dragu e Michael Laver propõem uma solução para este último problema: o “governo ministerial limitado” (constrained ministerial government). Nesse tipo de desenho institucional, os ministros compartilhariam suas propostas com os colegas antes de implementá-las. (O texto “Coalition Governance with Incomplete Information” foi publicado no mês passado no Journal of Politics.) E então os membros mais radicais (ou seja, que propõem coisas fora do razoável para ao menos um outro ministro) do gabinete teriam que moderar suas preferências para que o governo topasse levá-las adiante.

Mas, ao que parece, todos os ministros agem como “ditadores” em suas áreas específicas e não sofrem sanção alguma por isso – o que estimula a proliferação de propostas entre bizarras e mais conservadoras do que a maioria do ministério toparia se fosse previamente consultada.

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Uma rápida passeada pela lista de ministros nomeados por Jair Bolsonaro (PSL) revela pelo menos três com posições radicais em suas áreas: Abraham Weintraub (Educação), Ernesto Araújo (Relações Exteriores) e Ricardo Salles (Meio Ambiente). Araújo defende, por exemplo, que o nazismo foi “de esquerda”. Weintraub acredita que professores podem ser filmados por alunos e terem suas falas divulgadas pelas redes sociais. O ministro da Educação também pensa que universidades federais que organizam eventos políticos devem ter verbas cortadas. Salles é acusado de alterar mapas de proteção ambiental quando foi secretário municipal e, agora no ministério, defende a simplificação de processos de licenciamento ambiental – algo estranho para um ministro do Meio Ambiente.

Sem entrar no mérito dessas posições, elas não são compartilhadas por muita gente – inclusive vários outros ministros do governo. Por que, então, os ministros não moderam suas propostas? Por que Weintraub não define critérios menos agressivos para cortar o orçamento de universidades? Por que Araújo não remete a historiadores a tarefa de explicar o nazismo? Por que Salles defende de modo tão explícito a aceleração de obras que afetam o ambiente? Há duas respostas.

Todo ministério composto por pessoas de diferentes partidos políticos (ou mesmo sem filiação partidária) precisa contemplar preferências diversas sobre políticas públicas. Em outras palavras, é necessário garantir um acordo mínimo entre os ministros para que ninguém saia implementando políticas que são completamente irrazoáveis. Em alguns países parlamentares, como Bélgica e Holanda, acordos programáticos durante a campanha eleitoral entre os partidos políticos que podem formar uma coalizão são uma maneira de minimizar este problema. Os partidos podem concordar em uma política ambiental moderada (ou seja, que não se distancia muito do status quo ) e em uma política fiscal superavitária, que implica gastar muito menos do que o governo anterior. Assim, quando o governo começa, há um acordo mínimo sobre o espaço disponível para cada ministro implementar suas preferências. Nesse esquema, se a política de segurança pública decidida no acordo for do tipo “moderada”, um ministro como Sergio Moro provavelmente não seria nomeado.

Acordos programáticos são limitados por ao menos três circunstâncias em sistemas presidencialistas: i) como a eleição (e continuação do mandato) do presidente não depende de seu partido político, ele terá facilidade e incentivos para sair do acordo quando for conveniente; ii) partidos políticos podem não ser programáticos e não terem bases ideológicas mínimas para estabelecer acordos desse tipo; iii) o mundo é dinâmico e as tarefas ministeriais podem mudar repentinamente – portanto, em termos técnicos, o contrato com ministros sempre será “incompleto”.

Os cientistas políticos Tiberiu Dragu e Michael Laver propõem uma solução para este último problema: o “governo ministerial limitado” (constrained ministerial government). Nesse tipo de desenho institucional, os ministros compartilhariam suas propostas com os colegas antes de implementá-las. (O texto “Coalition Governance with Incomplete Information” foi publicado no mês passado no Journal of Politics.) E então os membros mais radicais (ou seja, que propõem coisas fora do razoável para ao menos um outro ministro) do gabinete teriam que moderar suas preferências para que o governo topasse levá-las adiante.

Mas, ao que parece, todos os ministros agem como “ditadores” em suas áreas específicas e não sofrem sanção alguma por isso – o que estimula a proliferação de propostas entre bizarras e mais conservadoras do que a maioria do ministério toparia se fosse previamente consultada.

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