Para além do Twitter: três medidas concretas do governo Bolsonaro
A retórica vazia domina o governo, mas há atos concretos para além da camada de ficção
Publicado em 23 de maio de 2019 às, 19h00.
Retórica vazia domina o governo Bolsonaro. Polêmicas com Olavo de Carvalho, demonização das pesquisas acadêmicas da área de humanas, acordo com Trump para o Brasil entrar na OCDE… Mais do que nos governos anteriores, as falas (e tuítes) presidenciais têm tido efeitos importantes – especialmente para pintar o presidente como um autoritário descontrolado. Isso ele não é. É um presidente confuso, que não tem boa relação com parlamentares e não entende alguns limites do seu cargo.
Mas o governo não é só ficção. Ao menos três coisas relevantes, com importantes consequências, Bolsonaro fez de fato. É claro que há outras ações importantes do presidente, como o envio da Reforma da Previdência ao Congresso Nacional. Mas isso ainda não provocou efeitos.
1) Diminuição da participação social em políticas públicas. A partir de 28 de junho, dezenas de conselhos federais com a participação da sociedade civil deixarão de existir. A medida foi tomada em decreto editado pelo presidente em 11 de Abril. Órgãos como a Comissão Nacional de Erradicação do Trabalho Escravo e a Comissão Nacional de Política Indigenista deixarão de existir. De acordo com estudos da cientista política Thamy Pogrebinschi, a participação social na definição de políticas públicas não só dá voz a quem está fora do jogo político, mas melhora a qualidade das leis. Essa medida concreta do presidente, portanto, diminuirá a qualidade das normas do país.
2) Reorganização ministerial e de cargos de confiança. A primeira das treze medidas provisórias editadas por Bolsonaro – MP 870/2019 – diminuiu os ministérios de 29 para 22. Criou o Ministério da Economia, fundindo quatro (Fazenda, Planejamento, Trabalho e Indústria, Comércio Exterior e Serviços), e tornou Paulo Guedes o ministro mais poderoso da área econômica desde Delfim Netto no início dos anos setenta. Também instituiu novas regras para a nomeação de cargos de confiança de alto nível (DAS-4, 5 e 6), exigindo: i) idoneidade moral e reputação ilibada; II) perfil profissional ou formação acadêmica compatível com o cargo; iii) não ter sido condenado por órgão judicial colegiado (segunda instância) nem ter sido demitido do serviço público após processo administrativo. Embora o não-cumprimento dessas regras não implique sanção para os administradores, a mudança teve o efeito prático de sinalizar para o Centrão que o relacionamento baseado em trocas que facilitam corrupção não é mais possível.
3) Benefícios para caminhoneiros. O pesquisador Bruno Paes Manso, um dos maiores especialistas em segurança pública do Brasil, teme que os caminhoneiros se tornem uma espécie de “milícia armada” do presidente Bolsonaro. Acho o medo exagerado. Mas é inegável que o presidente tem se preocupado em trazer benesses generosas para a categoria. Além do porte de armas, uma resolução editada hoje por Bolsonaro facilita a vida de caminhoneiros que desejam transportar carga sem fiscalização. Dificultar o trabalho dos fiscais da Agência Nacional de Transportes Terrestres (ANTT) agora resultará em multa de R$ 550 (antes era R$ 5 mil) e não implicará a suspensão do registro nacional de transportador de carga. (As informações são do excelente newsletter “Brasil Real Oficial”, editado por Breno Costa.)