O Nordeste é mesmo do PT?
Haddad precisa conquistar 30% dos votos da região para sedimentar ida segundo turno. São vinte pontos percentuais a menos que Dilma em 2014
Da Redação
Publicado em 14 de setembro de 2018 às 11h35.
Última atualização em 14 de setembro de 2018 às 12h01.
Ser paulistano e pensar sobre política nordestina é um horror. Os piores preconceitos vêm à tona. Nordestinos seriam mal-educados, preguiçosos, mais susceptíveis à compra de votos do que nós, iluminados do sudeste. Nada mais falso. A política no Nordeste não se dá em termos essencialmente diferentes do que em outros lugares do país com renda média mais alta. É um misto de nepotismo, corrupção, saúde organizacional de partidos políticos, carisma, emoções, mentiras e dependência mais ou menos envergonhada de benefícios estatais. Ou seja: nada fácil de entender. É nesse emaranhado republicano que começa a luta entre Ciro Gomes (PDT) e Fernando Haddad (PT) para captar os votos dos nordestinos. O resultado possivelmente definirá quem irá ao turno contra, ao que tudo indica, Jair Bolsonaro (PSL).
Desde 2006, o PT tem uma proporção significativa dos votos no Nordeste em eleições presidenciais. Lula chegou, naquele ano, a 60%. Em 2014, mesmo a nada carismática Dilma Rousseff (PT) obteve mais de 50% do apoio da região. Quatro anos antes, ficou conhecida por lá como “a mulher do Lula”. Bastou isso para que a maior parte dos votos do líder carismático fossem transferidos. Mas espera aí. Será que Lula “transferiu” votos para Dilma no Nordeste ou o PT se organizou por lá de modo a garantir apoio menos dependente de um único político? Em outras palavras, a quem se deve creditar o sucesso petista na região: Lula ou o partido? A resposta é crucial para entender as chances de Ciro e Haddad na região.
Se o PT é bem-sucedido porque preparou suas comissões municipais, Haddad tem garantia de apoio e voluntários de campanha (e seus prefeitos!) para além dos poucos segundos de Lula no horário eleitoral. Os cientistas políticos David Samuels e Cesar Zucco afirmam, em diversos artigos, que o sucesso petista na região se explica mais pela estratégia organizacional do que pelo “lulismo”. A “velha política” nordestina, associada a figuras coronelistas como Antônio Carlos Magalhães (PFL) e José Sarney, teria sido parcialmente substituída por petistas bem-organizados, mais programáticos e menos corruptos do que os antecessores. Os prefeitos da região, também recompensados pelo sucesso de políticas sociais como o Bolsa Família, não teriam tido problema algum em adaptar suas lealdades políticas e juntar-se, formal ou informalmente, à nova organização do pedaço.
Esse raciocínio não é consensual. O cientista político Jorge Antonio Alves é mais cético com relação ao poder do PT na região, o que traria um alento para Ciro Gomes. Segundo Alves, a estratégia petista no Nordeste foi muito mais pragmática do que enraizada em uma estratégia organizacional. Alianças pontuais com coronéis como Eduardo Campos (PSB) e Renan Calheiros (MDB) teriam sido mais determinantes para o sucesso do partido do que outros fatores. A foto recente de Haddad com Renan indica que essa visão tem algum mérito. (O texto “Transformation or substitution? The Workers’ Party and the Right in Northeast Brazil” foi publicado nesse ano pelo Journal of Politics in Latin America.)
De qualquer maneira, o Nordeste tem 28% da população brasileira. Digamos que Fernando Haddad consiga 30% desses votos, vinte pontos percentuais a menos do que Dilma em 2014. Seria 8,4%. Vamos dar um desconto porque há, é claro, mais pessoas do que eleitores. Digamos que seja 6%. Talvez seja o suficiente para disputar o segundo turno. E aí a eleição é outra.
Ser paulistano e pensar sobre política nordestina é um horror. Os piores preconceitos vêm à tona. Nordestinos seriam mal-educados, preguiçosos, mais susceptíveis à compra de votos do que nós, iluminados do sudeste. Nada mais falso. A política no Nordeste não se dá em termos essencialmente diferentes do que em outros lugares do país com renda média mais alta. É um misto de nepotismo, corrupção, saúde organizacional de partidos políticos, carisma, emoções, mentiras e dependência mais ou menos envergonhada de benefícios estatais. Ou seja: nada fácil de entender. É nesse emaranhado republicano que começa a luta entre Ciro Gomes (PDT) e Fernando Haddad (PT) para captar os votos dos nordestinos. O resultado possivelmente definirá quem irá ao turno contra, ao que tudo indica, Jair Bolsonaro (PSL).
Desde 2006, o PT tem uma proporção significativa dos votos no Nordeste em eleições presidenciais. Lula chegou, naquele ano, a 60%. Em 2014, mesmo a nada carismática Dilma Rousseff (PT) obteve mais de 50% do apoio da região. Quatro anos antes, ficou conhecida por lá como “a mulher do Lula”. Bastou isso para que a maior parte dos votos do líder carismático fossem transferidos. Mas espera aí. Será que Lula “transferiu” votos para Dilma no Nordeste ou o PT se organizou por lá de modo a garantir apoio menos dependente de um único político? Em outras palavras, a quem se deve creditar o sucesso petista na região: Lula ou o partido? A resposta é crucial para entender as chances de Ciro e Haddad na região.
Se o PT é bem-sucedido porque preparou suas comissões municipais, Haddad tem garantia de apoio e voluntários de campanha (e seus prefeitos!) para além dos poucos segundos de Lula no horário eleitoral. Os cientistas políticos David Samuels e Cesar Zucco afirmam, em diversos artigos, que o sucesso petista na região se explica mais pela estratégia organizacional do que pelo “lulismo”. A “velha política” nordestina, associada a figuras coronelistas como Antônio Carlos Magalhães (PFL) e José Sarney, teria sido parcialmente substituída por petistas bem-organizados, mais programáticos e menos corruptos do que os antecessores. Os prefeitos da região, também recompensados pelo sucesso de políticas sociais como o Bolsa Família, não teriam tido problema algum em adaptar suas lealdades políticas e juntar-se, formal ou informalmente, à nova organização do pedaço.
Esse raciocínio não é consensual. O cientista político Jorge Antonio Alves é mais cético com relação ao poder do PT na região, o que traria um alento para Ciro Gomes. Segundo Alves, a estratégia petista no Nordeste foi muito mais pragmática do que enraizada em uma estratégia organizacional. Alianças pontuais com coronéis como Eduardo Campos (PSB) e Renan Calheiros (MDB) teriam sido mais determinantes para o sucesso do partido do que outros fatores. A foto recente de Haddad com Renan indica que essa visão tem algum mérito. (O texto “Transformation or substitution? The Workers’ Party and the Right in Northeast Brazil” foi publicado nesse ano pelo Journal of Politics in Latin America.)
De qualquer maneira, o Nordeste tem 28% da população brasileira. Digamos que Fernando Haddad consiga 30% desses votos, vinte pontos percentuais a menos do que Dilma em 2014. Seria 8,4%. Vamos dar um desconto porque há, é claro, mais pessoas do que eleitores. Digamos que seja 6%. Talvez seja o suficiente para disputar o segundo turno. E aí a eleição é outra.