O debate político que eu gostaria de ver
Quero saber menos sobre novas ideias e mais sobre quais políticas públicas os candidatos cancelariam
Karina Souza
Publicado em 10 de outubro de 2020 às 15h19.
Por ser cientista político, perguntam-me com frequência se assisti aos debates dos últimos dias para a prefeitura de São Paulo e presidência (também vice-presidência) norte-americana. Não vi. Preferi assistir o seriado Ozark, que traz lições sobre lobby em Missouri. Foi mais instrutivo do que assistir Guilherme Boulos (PSOL), Filipe Sabará (Novo), Celso Russomano (Republicanos), Kamala Harris (Partido Democrata) e Donald Trump (Partido Republicano). Depois li as notícias.
O problema não é apenas o formato do debate. Nos Estados Unidos, pateticamente, não se corta o microfone de quem fala por cima do concorrente. Mas isso é o de menos. Em qualquer debate, o político pode ignorar o a lhe foi perguntado. Muda de assunto. Fala dos temas que melhor lhe convém. No debate entre candidatos à vice-presidência, Kamala Harris não respondeu se, caso sua chapa vença, fará, com Joe Biden, um “aparelhamento” (court packing) da Suprema Corte. (Parte dos democratas cogita fazê-lo para compensar a incivilidade de que o Partido Republicano se vale para nomear a próxima juíza.)
Mesmo quando respeitam o assunto perguntado, os candidatos não falam sobre as inevitáveis escolhas que terão que fazer para implementar suas ideias (quando as têm). Dinheiro é escasso. Aumentar tributos é muito impopular. Para começar novas políticas públicas (ou aumentar as que já existem), é preciso especificar de onde sairá a grana.
No debate de candidatos à prefeitura, por exemplo, Márcio França (PSB) prometeu gerar 100 mil empregos e “fornecer uma fonte de renda para que as pessoas possam empreender, com R$ 3 mil para até 150 mil pessoas”. Só essa última ideia custaria R$ 450 milhões. Se no debate ele não teve tempo para especificar o que cortaria, em seu programa de governo cadastrado no TSE poderia constar essa informação. Mas não há.
Gostaria de assistir um debate político apenas com candidatos falando sobre cortes orçamentários. Aprenderíamos mais sobre suas prioridades.
(Este artigo expressa a opinião do autor, não representando necessariamente a opinião institucional da FGV).
Por ser cientista político, perguntam-me com frequência se assisti aos debates dos últimos dias para a prefeitura de São Paulo e presidência (também vice-presidência) norte-americana. Não vi. Preferi assistir o seriado Ozark, que traz lições sobre lobby em Missouri. Foi mais instrutivo do que assistir Guilherme Boulos (PSOL), Filipe Sabará (Novo), Celso Russomano (Republicanos), Kamala Harris (Partido Democrata) e Donald Trump (Partido Republicano). Depois li as notícias.
O problema não é apenas o formato do debate. Nos Estados Unidos, pateticamente, não se corta o microfone de quem fala por cima do concorrente. Mas isso é o de menos. Em qualquer debate, o político pode ignorar o a lhe foi perguntado. Muda de assunto. Fala dos temas que melhor lhe convém. No debate entre candidatos à vice-presidência, Kamala Harris não respondeu se, caso sua chapa vença, fará, com Joe Biden, um “aparelhamento” (court packing) da Suprema Corte. (Parte dos democratas cogita fazê-lo para compensar a incivilidade de que o Partido Republicano se vale para nomear a próxima juíza.)
Mesmo quando respeitam o assunto perguntado, os candidatos não falam sobre as inevitáveis escolhas que terão que fazer para implementar suas ideias (quando as têm). Dinheiro é escasso. Aumentar tributos é muito impopular. Para começar novas políticas públicas (ou aumentar as que já existem), é preciso especificar de onde sairá a grana.
No debate de candidatos à prefeitura, por exemplo, Márcio França (PSB) prometeu gerar 100 mil empregos e “fornecer uma fonte de renda para que as pessoas possam empreender, com R$ 3 mil para até 150 mil pessoas”. Só essa última ideia custaria R$ 450 milhões. Se no debate ele não teve tempo para especificar o que cortaria, em seu programa de governo cadastrado no TSE poderia constar essa informação. Mas não há.
Gostaria de assistir um debate político apenas com candidatos falando sobre cortes orçamentários. Aprenderíamos mais sobre suas prioridades.
(Este artigo expressa a opinião do autor, não representando necessariamente a opinião institucional da FGV).