Exame.com
Continua após a publicidade

Nosso & é republicano

Propostas do deputado Luiz Philippe de Orleans e Bragança mostram um anti-monarquista em exercício

S
Sérgio Praça

Publicado em 15 de novembro de 2019 às, 10h37.

É razoável que às vésperas dos 130 anos da República brasileira um autoproclamado príncipe eleito deputado federal, Luiz Philippe de Orleans e Bragança (PSL), ocupe o noticiário. Bragança teria sido escolhido vice de Jair Bolsonaro (PSL), dizem, não fosse a ameaça de um dossiê com conteúdo sexual a ser distribuído por Gustavo Bebianno (PSL), ex-ministro da Secretaria-Geral da Presidência da República. Bolsonaro não arriscou e escolheu o General Hamilton Mourão para o cargo. O plano B de Bragança foi candidatar-se à Câmara dos Deputados.

Segundo o historiador José Murilo de Carvalho, em seu excepcional “Os Bestializados: o Rio de Janeiro e a República que não foi” (Companhia das Letras, 1987), os primeiros meses após a proclamação da República foram caracterizados pela “confiança na sorte, no enriquecimento sem esforço em contraposição ao ganho da vida pelo trabalho honesto parece ter sido incentivada pelo surgimento do novo regime”. A República não nos livrou da corrupção – ao contrário. Assim a defesa da monarquia pode até parecer razoável. Déspotas esclarecidos poderiam ser bons governantes se incorporassem a vontade popular como sua própria. Podem até ler o manual de Maquiavel, publicado no início do Século 16, a sério, despindo-o do caráter irônico que seu autor tinha em mente.

Pois Luiz Philippe de Orleans e Bragança não tem feito jus às origens familiares. Duas de suas propostas na Câmara dos Deputados aumentam o controle dos governantes pelo povo. E uma outra mostra que Bragança sabe ao menos alguns dos limites que a Constituição Federal e o Regimento Interno da Câmara impõem ao seu mandato.

O projeto de lei 2262/2019, que “dá nova disciplina aos institutos do plebiscito, do referendo e da iniciativa popular de leis”, pretende que se faça bom uso desses mecanismos de participação direta. Para Bragança, o projeto se justifica por “assegurar a real perspectiva de exercício da soberania popular, reconhecendo que esta soberania é indelegável, intransferível e inalienável”. Indelegável? Intransferível? Inalienável? Power to the people!

Outra ideia do deputado, concretizada no projeto de lei 1745/2019, é alterar a Lei de Acesso à Informação para “ampliar as hipóteses de acesso a dados públicos”. Agências reguladoras não estariam cumprindo a contento o que a lei determina, escondendo informações dos cidadãos por sabe-se lá qual motivo. Bragança justifica o projeto afirmando que “o princípio republicano repele peremptoriamente a manutenção de expedientes ocultos no que concerne ao funcionamento da máquina estatal em suas mais diversas facetas. A regra geral num Estado Republicano é a da máxima transparência no acesso a documentos públicos, sendo o sigilo a exceção.

Por fim, assim como muitos empresários, Bragança está exasperado com a ineficiência do Instituto Nacional de Propriedade Industrial (INPI) para registrar pedidos de patentes. O deputado teve uma reunião com a Secretaria Especial de Desburocratização, Gestão e Governo Digital, em que se informou sobre o tema. Resolveu defender a privatização do serviço. Para isso, formulou a Indicação 1370/2019. Não se trata de um projeto legislativo, e sim de uma sugestão para que o ministro Paulo Guedes cuide do assunto. Parlamentares não podem mudar a administração estatal, ministros e presidente, sim.

Luiz Phillipe de Orleans e Bragança entendeu seu lugar no sistema. Quem diria? Nosso “príncipe” tem espírito republicano.