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Nem Maduro, nem Guaidó

Após os protestos do Dia do Trabalho, saem perdendo tanto a oposição, que falhou na comunicação com os militares, quanto o governo Maduro, que não tem força para prender os opositores

NICOLÁS MADURO: presidente apareceu ao lado dos militares nesta quinta-feira 2 para mostrar que tem apoio do Exército / Miraflores Palace/Handout via REUTERS
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Da Redação

Publicado em 2 de maio de 2019 às 11h17.

A tentativa de derrubada da ditadura venezuelana por Juan Guaidó foi um grande fracasso para a oposição. Mas não foi uma vitória para Nicolás Maduro. Difícil acreditar que o atual ditador permanecerá por muito mais tempo no cargo. O apoio internacional ao regime é fraquíssimo, com exceção da Rússia.

Guaidó tem tido o mérito de simbolizar a revolta da maioria dos venezuelanos contra a repressão e o caos econômico do país. Seu problema é a dificuldade de coordenar três tipos de ações: i) a dos militares de alta patente que querem abandonar Maduro, mas têm medo de retaliação sob um novo presidente; ii) a dos militares de alta patente que não querem abandonar Maduro, mas estão convencidos de que a derrubada é inevitável; iii) a dos soldados que não querem matar nem prender cidadãos, mas têm medo de abandonar o Exército e sofrerem retaliação através da punição de suas famílias. (Na Síria, isso foi evitado porque a oposição garantiu fugas para o exterior, conforme relatam Holger Albrecth e Dorothy Ohl em “Exit, Resistance, Loyalty: Military Behavior during Unrest in Authoritarian Regimes” [Perspectives on Politics, 2016].)

Golpes (contra ou a favor de ditadores) são problemas de coordenação entre atores políticos. Eu, você, uma multidão e militares podemos derrubar um ditador. Mas como posso saber que voce está comigo? E que a multidão comparecerá aos protestos? E que os militares (que podem, é claro, ter preferências e posições variadas) nos apoiarão? Para Naunihal Singh, autor de “Seizing Power: the strategic logic of military coups” (Johns Hopkins University Press, 2014), o elemento-chave é a comunicação entre os rebeldes.

Mensagens claras e críveis permitem que os atores políticos formem crenças sobre o comportamento dos outros – e assim definam suas escolhas. Por isso, afirmou Singh, a opção de Guaidó por convocar protestos pelo Twitter foi um erro – embora possa ter sido sua única alternativa. Um militar de alta patente que está hesitando em largar Maduro necessariamente segue Guaidó no Twitter? Sabe o que o líder da oposição está falando? Sabe quantos generais receberam a mensagem dele e nela acreditaram? Uma aparição televisiva com vários militares a seu lado teria sido bem melhor para Guaidó. Ele provavelmente sabe disso e não teve condições de fazê-lo.

Assim, a oposição perdeu a chance de comunicar aos militares, de modo crível, que dessa vez a coisa não tem volta. O fato é que talvez a oposição esteja realmente fraca e dependa de apoio militar estrangeiro para derrubar Maduro – o que pode levar o país a uma guerra civil, resultado indesejado por todos. Por enquanto, o ditador ganhou um pouco de tempo, mas também perdeu a rodada porque ficou evidente que ele não tem força nem legitimidade para prender seus opositores.

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A tentativa de derrubada da ditadura venezuelana por Juan Guaidó foi um grande fracasso para a oposição. Mas não foi uma vitória para Nicolás Maduro. Difícil acreditar que o atual ditador permanecerá por muito mais tempo no cargo. O apoio internacional ao regime é fraquíssimo, com exceção da Rússia.

Guaidó tem tido o mérito de simbolizar a revolta da maioria dos venezuelanos contra a repressão e o caos econômico do país. Seu problema é a dificuldade de coordenar três tipos de ações: i) a dos militares de alta patente que querem abandonar Maduro, mas têm medo de retaliação sob um novo presidente; ii) a dos militares de alta patente que não querem abandonar Maduro, mas estão convencidos de que a derrubada é inevitável; iii) a dos soldados que não querem matar nem prender cidadãos, mas têm medo de abandonar o Exército e sofrerem retaliação através da punição de suas famílias. (Na Síria, isso foi evitado porque a oposição garantiu fugas para o exterior, conforme relatam Holger Albrecth e Dorothy Ohl em “Exit, Resistance, Loyalty: Military Behavior during Unrest in Authoritarian Regimes” [Perspectives on Politics, 2016].)

Golpes (contra ou a favor de ditadores) são problemas de coordenação entre atores políticos. Eu, você, uma multidão e militares podemos derrubar um ditador. Mas como posso saber que voce está comigo? E que a multidão comparecerá aos protestos? E que os militares (que podem, é claro, ter preferências e posições variadas) nos apoiarão? Para Naunihal Singh, autor de “Seizing Power: the strategic logic of military coups” (Johns Hopkins University Press, 2014), o elemento-chave é a comunicação entre os rebeldes.

Mensagens claras e críveis permitem que os atores políticos formem crenças sobre o comportamento dos outros – e assim definam suas escolhas. Por isso, afirmou Singh, a opção de Guaidó por convocar protestos pelo Twitter foi um erro – embora possa ter sido sua única alternativa. Um militar de alta patente que está hesitando em largar Maduro necessariamente segue Guaidó no Twitter? Sabe o que o líder da oposição está falando? Sabe quantos generais receberam a mensagem dele e nela acreditaram? Uma aparição televisiva com vários militares a seu lado teria sido bem melhor para Guaidó. Ele provavelmente sabe disso e não teve condições de fazê-lo.

Assim, a oposição perdeu a chance de comunicar aos militares, de modo crível, que dessa vez a coisa não tem volta. O fato é que talvez a oposição esteja realmente fraca e dependa de apoio militar estrangeiro para derrubar Maduro – o que pode levar o país a uma guerra civil, resultado indesejado por todos. Por enquanto, o ditador ganhou um pouco de tempo, mas também perdeu a rodada porque ficou evidente que ele não tem força nem legitimidade para prender seus opositores.

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