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Há lógica nos vetos de Bolsonaro?

O presidente joga o jogo legislativo com atraso e sofre com mais incerteza na negociação

(Adriano Machado/Reuters)
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Publicado em 14 de setembro de 2020 às 20h01.

Última atualização em 14 de setembro de 2020 às 20h02.

Sob a restrita ótica da formação de coalizões, a pandemia iniciada em março serve para esclarecer a tática de Jair Bolsonaro (sem partido). O presidente quer apoio partidário na Câmara dos Deputados desde que isso não afete as políticas públicas que deseja implementar.

Ou seja: Bolsonaro quer ministros radicais, do ponto de vista ideológico, e também quer apoio legislativo. Abdicar do radicalismo facilitaria a aprovação de seus projetos, mas não são coisas antagônicas. É possível, sim, manter Damares e Ricardo Salles em seus ministérios. Mas o jogo com o Legislativo fica mais complexo.

Nos últimos dias, Bolsonaro mostrou um arremedo de tática para lidar com essa situação. Está tentando usar a ameaça de veto – e até, de modo inusitado, discordar publicamente de seu próprio veto – para ter o melhor dos dois mundos: aprovação legislativa e apoio popular.

O caso da desoneração da folha salarial para 17 setores econômicos é a primeira ilustração. Criada por Dilma Rousseff (PT), Bolsonaro vetou a prorrogação do benefício para empresários. Não quer arcar com o custo fiscal disso. É justo: cabe ao presidente organizar as finanças públicas do melhor modo possível. Mas parlamentares são gastadores. Se o país não conseguir cobrir as contas, quem sofre é o Executivo, não o Legislativo.

Mas, como Bolsonaro não tem apoio legislativo sólido (que viria às custas da demissão de Damares e Salles, entre outros), seu poder é frágil. Paulo Guedes tenta convencer os parlamentares do Centrão a não derrubar o veto presidencial. Trata-se de possibilidade antes rara, agora corriqueira.

Bolsonaro joga o jogo legislativo com atraso. Em vez de formar maiorias ao longo do processo de tramitação das leis, espera a possibilidade de veto para firmar suas preferências. Só que é forçado, por vezes, a discordar de seus próprios atos.

É o caso, por exemplo, de outro benefício fiscal – desta vez, para igrejas. Bolsonaro vetou o perdão de dívidas das igrejas. Seria criticado por irresponsabilidade caso não o fizesse. Em tempos de profunda crise econômica, perdoar dívidas não é bom. Agora ele pede, publicamente, que os parlamentares derrubem seu veto – e, assim, beneficiem as igrejas. É o que Bolsonaro adoraria poder fazer como presidente, mas a responsabilidade econômica do cargo não permite.

Ser deputado é bem mais fácil.

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Sob a restrita ótica da formação de coalizões, a pandemia iniciada em março serve para esclarecer a tática de Jair Bolsonaro (sem partido). O presidente quer apoio partidário na Câmara dos Deputados desde que isso não afete as políticas públicas que deseja implementar.

Ou seja: Bolsonaro quer ministros radicais, do ponto de vista ideológico, e também quer apoio legislativo. Abdicar do radicalismo facilitaria a aprovação de seus projetos, mas não são coisas antagônicas. É possível, sim, manter Damares e Ricardo Salles em seus ministérios. Mas o jogo com o Legislativo fica mais complexo.

Nos últimos dias, Bolsonaro mostrou um arremedo de tática para lidar com essa situação. Está tentando usar a ameaça de veto – e até, de modo inusitado, discordar publicamente de seu próprio veto – para ter o melhor dos dois mundos: aprovação legislativa e apoio popular.

O caso da desoneração da folha salarial para 17 setores econômicos é a primeira ilustração. Criada por Dilma Rousseff (PT), Bolsonaro vetou a prorrogação do benefício para empresários. Não quer arcar com o custo fiscal disso. É justo: cabe ao presidente organizar as finanças públicas do melhor modo possível. Mas parlamentares são gastadores. Se o país não conseguir cobrir as contas, quem sofre é o Executivo, não o Legislativo.

Mas, como Bolsonaro não tem apoio legislativo sólido (que viria às custas da demissão de Damares e Salles, entre outros), seu poder é frágil. Paulo Guedes tenta convencer os parlamentares do Centrão a não derrubar o veto presidencial. Trata-se de possibilidade antes rara, agora corriqueira.

Bolsonaro joga o jogo legislativo com atraso. Em vez de formar maiorias ao longo do processo de tramitação das leis, espera a possibilidade de veto para firmar suas preferências. Só que é forçado, por vezes, a discordar de seus próprios atos.

É o caso, por exemplo, de outro benefício fiscal – desta vez, para igrejas. Bolsonaro vetou o perdão de dívidas das igrejas. Seria criticado por irresponsabilidade caso não o fizesse. Em tempos de profunda crise econômica, perdoar dívidas não é bom. Agora ele pede, publicamente, que os parlamentares derrubem seu veto – e, assim, beneficiem as igrejas. É o que Bolsonaro adoraria poder fazer como presidente, mas a responsabilidade econômica do cargo não permite.

Ser deputado é bem mais fácil.

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