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Como João Doria e Marcelo Crivella irão governar?

João Doria (PSDB) e Marcelo Crivella (PRB) são os novos prefeitos de São Paulo e Rio de Janeiro. Cidades complicadas – a última é até “partida” entre a Zona Sul e o resto, como já escreveu Zuenir Ventura. Com a crise econômica nacional, a chance de esses novos governantes serem reconhecidos por investimentos em obras […]

CRIVELLA: ele cortou secretarias, nomeou políticos, e deu força para a Lei de Acesso à Informação – vai funcionar? / André Horta/Fotoarena/Folhapress
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Da Redação

Publicado em 9 de janeiro de 2017 às 18h05.

Última atualização em 22 de junho de 2017 às 18h31.

João Doria (PSDB) e Marcelo Crivella (PRB) são os novos prefeitos de São Paulo e Rio de Janeiro. Cidades complicadas – a última é até “partida” entre a Zona Sul e o resto, como já escreveu Zuenir Ventura. Com a crise econômica nacional, a chance de esses novos governantes serem reconhecidos por investimentos em obras é pequena. Devem preocupar-se, portanto, em fazer uma boa gestão com poucos recursos.

Tanto Doria quanto Crivella parecem ter ambição política para além da esfera municipal. Doria é um empresário que lutou contra boa parte do PSDB para ser o candidato do partido em São Paulo. Começou desacreditado e acabou vencendo no primeiro turno, para surpresa geral. Teve 53% dos votos contra 16% do prefeito Fernando Haddad (PT), que concorria à reeleição. Vitória maiúscula explicada, em parte, pela rejeição nacional ao PT, mas também pela dificuldade de Haddad em governar para além dos seus alunos da FFLCH-USP. O resultado credencia Doria a ambicionar o governo estadual (que parece cativo do PSDB desde 1994) e, quem sabe, a presidência do país um dia.

Marcelo Crivella (PRB) foi eleito senador em 2002, reeleito em 2010, e já foi ministro da Pesca – pasta já extinta – entre 2012 e 2014. Venceu Marcelo Freixo (PSOL) no segundo turno das eleições municipais por 59% dos votos, contra 41% do socialista. Mais do que Doria, Crivella é político profissional. Não fará outra coisa da vida. Mas o fato de ser pastor evangélico talvez o impeça de ser candidato relevante a presidente. (Mas diziam de John F. Kennedy que um irlandês católico nunca seria presidente norte-americano!)

Quanto aos antecessores, Doria e Crivella parecem em pé de igualdade. Em São Paulo, Haddad foi humilhado nas urnas. No ano da eleição, chegou muito perto de filiar-se ao partido Rede Sustentabilidade, comandado por Marina Silva. O PT estaria chamuscado demais para um prefeito que, no fim das contas, governou sem escândalos. Mas Haddad permaneceu no partido e, para boa parte dos paulistanos, parece ter governado pensando mais em ciclovias do que nos ônibus (o que é uma certa injustiça). Crivella vem logo depois de Eduardo Paes (PMDB), prefeito do partido que destruiu as finanças do estado do Rio de Janeiro. Paes não participou disso, mas não conseguiu eleger seu sucessor.

O fato é que Doria e Crivella terão que se destacar pela boa gestão e pelo combate à corrupção em seus governos. Não há outros caminhos: falta dinheiro para fazer qualquer outra coisa relevante. Os primeiros passos dos novos prefeitos podem ser avaliados, assim, de acordo com três temas: a nova organização das secretarias, a escolha dos secretários e a estratégia de combate à corrupção.

Organização das secretarias

A primeira escolha que qualquer governante faz ao assumir o cargo é: quais tarefas serão concentradas em seu gabinete? Nas palavras de Andrew Rudalevige, autor de Managing the president’s program: presidential leadership and legislative policy formulation (Princeton University Press, 2002), presidentes norte-americanos podem “fazer” políticas públicas ou “comprá-las” dos ministros e outros atores políticos. Ou seja: optam por concentrar tarefas ou distribuí-las para outras pessoas e aí ter o ônus de monitorar.

O trade-off é claro. Quanto mais tarefas o prefeito concentrar em seu gabinete, menores as chances de elas saírem de um jeito diferente do que ele deseja, mas maior a necessidade de se preocupar diretamente com a formulação das políticas públicas. Caso o prefeito fique com menos tarefas sob seu controle direto, poderá monitorar os secretários e demitir os que não têm bom desempenho.

Marcelo Crivella (PRB) optou por centralizar as coisas no Rio de Janeiro. No gabinete do prefeito agora estão as antigas secretarias de Administração, Concessões e Parcerias Público-Privadas, Pessoa com Deficiência, Promoção e Defesa dos Animais, e Turismo. A fusão de secretarias também é uma marca da nova gestão carioca. Contando a Controladoria-Geral do Município (CGM-RJ), há agora 13 secretarias em vez das 25 anteriores. E isto porque Eduardo Paes já havia cortado, ano passado, as secretarias de Abastecimento e Segurança Alimentar, Desenvolvimento Econômico, Saneamento e Recursos Hídricos, e Integração Metropolitana.

João Doria (PSDB) optou por caminho contrário. Ficam sob seu controle direto no gabinete apenas a parte de comunicação e a secretaria de Governo Municipal. Crivella centraliza, Doria delega. O prefeito paulistano também optou por extinguir duas secretarias simbólicas da gestão de Haddad: Igualdade Racial e Política para as Mulheres. Isto não significa que essas políticas deixam de existir, mas agora estarão dentro da pasta de Direitos Humanos e Cidadania. É uma guinada conservadora que não deverá ter efeitos práticos grandes para além da insatisfação de movimentos sociais.

Escolha dos secretários

Marcelo Crivella nomeou mais da metade de seus secretários – sete dos 13 – de acordo com critérios exclusivamente políticos. Sua coalizão é abrangente: apenas uma pasta foi destinada a alguém de seu partido, o PRB. Trata-se da Secretaria de Desenvolvimento, Emprego e Inovação para Clarissa Matheus Garotinho, filiada ao partido do prefeito há menos de dois meses. Há secretarias para PTN, PR, PMN, PSDB e Solidariedade, bem como para Cesar Benjamin, histórico militante de esquerda. Também conta como político o secretário da Casa Civil, Ailton Cardoso da Silva, que assessorou Crivella durante seu tempo como senador. O novo prefeito optou por secretários técnicos apenas na Fazenda, Cultura, Ordem Pública e na Controladoria-Geral do Município. (As duas secretarias remanescentes estão sob o comando de “técnicos-políticos” – ou seja, filiados a partidos com experiência administrativa.)

Não surpreende, portanto, que o novo prefeito carioca tenha concentrado tantas atribuições em seu gabinete: quanto maior a coalizão, mais tempo ele teria que gastar para monitorar o trabalho dos secretários.

João Doria também difere de Crivella quanto ao perfil do secretariado. Apenas um terço das secretarias – oito de 24 – foi para políticos. Cinco são tucanos, e PSB, PPS e o partido Novo têm uma secretaria cada. Ou seja: Doria não está muito preocupado com a coalizão legislativa. Ainda assim, noticia-se que 43 dos 55 vereadores o apoiam hoje. Vamos ver como isso se desenrola.

A ênfase do novo prefeito paulistano está em dois tipos de secretários: técnicos e com experiência no governo estadual. Nada menos que 13 secretários são técnicos e 11 (não necessariamente os mesmos) têm experiência no governo estadual.  No total, 11 secretários de Doria são filiados a partidos políticos, mas três podem ser considerados “técnicos-políticos”: Alexandre Schneider (Educação), Fernando Chucre (Habitação) e Daniel Annenberg (Inovação e Tecnologia). A ênfase, portanto, é na capacidade técnica presumida dos secretários. É difícil negar que ele montou uma boa equipe.

Estratégias de combate à corrupção

O escorregão de João Doria se dá na área de controle interno e combate à corrupção. Ao tirar o status de secretaria da Controladoria-Geral do Município, criada por Fernando Haddad, Doria mostra despreparo com o assunto. A CGM agora está subordinada ao Secretário de Justiça. É um baque para os auditores.

Crivella, por sua vez, parece estar prestigiando a Controladoria-Geral do Município do Rio de Janeiro. A CGM-RJ indicou três secretarias, no ano passado, como especialmente vulneráveis à corrupção: Educação, Saúde, e Obras e Serviços Públicos. Assim como no nível federal, é razoável imaginar que nomeados em cargos de confiança são responsáveis por esquemas corruptos – mas Crivella pode ter ido longe demais neste raciocínio. Um de seus primeiros decretos exonerou todos os cargos de comissão mais altos da prefeitura que não são servidores concursados do município. Talvez haja menos corrupção a partir disso, mas é certo também que a prefeitura perde expertise e experiência que seriam muito bem-vindas, sobretudo considerando o perfil político (e inexperiente) da maioria dos secretários.

Por fim, a boa notícia é que Marcelo Crivella parece estar preocupado com a transparência governamental, ao contrário de João Doria. Outro decreto do prefeito carioca dá seis meses para a CGM-RJ verificar se os órgãos da prefeitura estão cumprindo a Lei de Acesso à Informação. É este, sem dúvida, o melhor caminho para combater esquemas corruptos.

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João Doria (PSDB) e Marcelo Crivella (PRB) são os novos prefeitos de São Paulo e Rio de Janeiro. Cidades complicadas – a última é até “partida” entre a Zona Sul e o resto, como já escreveu Zuenir Ventura. Com a crise econômica nacional, a chance de esses novos governantes serem reconhecidos por investimentos em obras é pequena. Devem preocupar-se, portanto, em fazer uma boa gestão com poucos recursos.

Tanto Doria quanto Crivella parecem ter ambição política para além da esfera municipal. Doria é um empresário que lutou contra boa parte do PSDB para ser o candidato do partido em São Paulo. Começou desacreditado e acabou vencendo no primeiro turno, para surpresa geral. Teve 53% dos votos contra 16% do prefeito Fernando Haddad (PT), que concorria à reeleição. Vitória maiúscula explicada, em parte, pela rejeição nacional ao PT, mas também pela dificuldade de Haddad em governar para além dos seus alunos da FFLCH-USP. O resultado credencia Doria a ambicionar o governo estadual (que parece cativo do PSDB desde 1994) e, quem sabe, a presidência do país um dia.

Marcelo Crivella (PRB) foi eleito senador em 2002, reeleito em 2010, e já foi ministro da Pesca – pasta já extinta – entre 2012 e 2014. Venceu Marcelo Freixo (PSOL) no segundo turno das eleições municipais por 59% dos votos, contra 41% do socialista. Mais do que Doria, Crivella é político profissional. Não fará outra coisa da vida. Mas o fato de ser pastor evangélico talvez o impeça de ser candidato relevante a presidente. (Mas diziam de John F. Kennedy que um irlandês católico nunca seria presidente norte-americano!)

Quanto aos antecessores, Doria e Crivella parecem em pé de igualdade. Em São Paulo, Haddad foi humilhado nas urnas. No ano da eleição, chegou muito perto de filiar-se ao partido Rede Sustentabilidade, comandado por Marina Silva. O PT estaria chamuscado demais para um prefeito que, no fim das contas, governou sem escândalos. Mas Haddad permaneceu no partido e, para boa parte dos paulistanos, parece ter governado pensando mais em ciclovias do que nos ônibus (o que é uma certa injustiça). Crivella vem logo depois de Eduardo Paes (PMDB), prefeito do partido que destruiu as finanças do estado do Rio de Janeiro. Paes não participou disso, mas não conseguiu eleger seu sucessor.

O fato é que Doria e Crivella terão que se destacar pela boa gestão e pelo combate à corrupção em seus governos. Não há outros caminhos: falta dinheiro para fazer qualquer outra coisa relevante. Os primeiros passos dos novos prefeitos podem ser avaliados, assim, de acordo com três temas: a nova organização das secretarias, a escolha dos secretários e a estratégia de combate à corrupção.

Organização das secretarias

A primeira escolha que qualquer governante faz ao assumir o cargo é: quais tarefas serão concentradas em seu gabinete? Nas palavras de Andrew Rudalevige, autor de Managing the president’s program: presidential leadership and legislative policy formulation (Princeton University Press, 2002), presidentes norte-americanos podem “fazer” políticas públicas ou “comprá-las” dos ministros e outros atores políticos. Ou seja: optam por concentrar tarefas ou distribuí-las para outras pessoas e aí ter o ônus de monitorar.

O trade-off é claro. Quanto mais tarefas o prefeito concentrar em seu gabinete, menores as chances de elas saírem de um jeito diferente do que ele deseja, mas maior a necessidade de se preocupar diretamente com a formulação das políticas públicas. Caso o prefeito fique com menos tarefas sob seu controle direto, poderá monitorar os secretários e demitir os que não têm bom desempenho.

Marcelo Crivella (PRB) optou por centralizar as coisas no Rio de Janeiro. No gabinete do prefeito agora estão as antigas secretarias de Administração, Concessões e Parcerias Público-Privadas, Pessoa com Deficiência, Promoção e Defesa dos Animais, e Turismo. A fusão de secretarias também é uma marca da nova gestão carioca. Contando a Controladoria-Geral do Município (CGM-RJ), há agora 13 secretarias em vez das 25 anteriores. E isto porque Eduardo Paes já havia cortado, ano passado, as secretarias de Abastecimento e Segurança Alimentar, Desenvolvimento Econômico, Saneamento e Recursos Hídricos, e Integração Metropolitana.

João Doria (PSDB) optou por caminho contrário. Ficam sob seu controle direto no gabinete apenas a parte de comunicação e a secretaria de Governo Municipal. Crivella centraliza, Doria delega. O prefeito paulistano também optou por extinguir duas secretarias simbólicas da gestão de Haddad: Igualdade Racial e Política para as Mulheres. Isto não significa que essas políticas deixam de existir, mas agora estarão dentro da pasta de Direitos Humanos e Cidadania. É uma guinada conservadora que não deverá ter efeitos práticos grandes para além da insatisfação de movimentos sociais.

Escolha dos secretários

Marcelo Crivella nomeou mais da metade de seus secretários – sete dos 13 – de acordo com critérios exclusivamente políticos. Sua coalizão é abrangente: apenas uma pasta foi destinada a alguém de seu partido, o PRB. Trata-se da Secretaria de Desenvolvimento, Emprego e Inovação para Clarissa Matheus Garotinho, filiada ao partido do prefeito há menos de dois meses. Há secretarias para PTN, PR, PMN, PSDB e Solidariedade, bem como para Cesar Benjamin, histórico militante de esquerda. Também conta como político o secretário da Casa Civil, Ailton Cardoso da Silva, que assessorou Crivella durante seu tempo como senador. O novo prefeito optou por secretários técnicos apenas na Fazenda, Cultura, Ordem Pública e na Controladoria-Geral do Município. (As duas secretarias remanescentes estão sob o comando de “técnicos-políticos” – ou seja, filiados a partidos com experiência administrativa.)

Não surpreende, portanto, que o novo prefeito carioca tenha concentrado tantas atribuições em seu gabinete: quanto maior a coalizão, mais tempo ele teria que gastar para monitorar o trabalho dos secretários.

João Doria também difere de Crivella quanto ao perfil do secretariado. Apenas um terço das secretarias – oito de 24 – foi para políticos. Cinco são tucanos, e PSB, PPS e o partido Novo têm uma secretaria cada. Ou seja: Doria não está muito preocupado com a coalizão legislativa. Ainda assim, noticia-se que 43 dos 55 vereadores o apoiam hoje. Vamos ver como isso se desenrola.

A ênfase do novo prefeito paulistano está em dois tipos de secretários: técnicos e com experiência no governo estadual. Nada menos que 13 secretários são técnicos e 11 (não necessariamente os mesmos) têm experiência no governo estadual.  No total, 11 secretários de Doria são filiados a partidos políticos, mas três podem ser considerados “técnicos-políticos”: Alexandre Schneider (Educação), Fernando Chucre (Habitação) e Daniel Annenberg (Inovação e Tecnologia). A ênfase, portanto, é na capacidade técnica presumida dos secretários. É difícil negar que ele montou uma boa equipe.

Estratégias de combate à corrupção

O escorregão de João Doria se dá na área de controle interno e combate à corrupção. Ao tirar o status de secretaria da Controladoria-Geral do Município, criada por Fernando Haddad, Doria mostra despreparo com o assunto. A CGM agora está subordinada ao Secretário de Justiça. É um baque para os auditores.

Crivella, por sua vez, parece estar prestigiando a Controladoria-Geral do Município do Rio de Janeiro. A CGM-RJ indicou três secretarias, no ano passado, como especialmente vulneráveis à corrupção: Educação, Saúde, e Obras e Serviços Públicos. Assim como no nível federal, é razoável imaginar que nomeados em cargos de confiança são responsáveis por esquemas corruptos – mas Crivella pode ter ido longe demais neste raciocínio. Um de seus primeiros decretos exonerou todos os cargos de comissão mais altos da prefeitura que não são servidores concursados do município. Talvez haja menos corrupção a partir disso, mas é certo também que a prefeitura perde expertise e experiência que seriam muito bem-vindas, sobretudo considerando o perfil político (e inexperiente) da maioria dos secretários.

Por fim, a boa notícia é que Marcelo Crivella parece estar preocupado com a transparência governamental, ao contrário de João Doria. Outro decreto do prefeito carioca dá seis meses para a CGM-RJ verificar se os órgãos da prefeitura estão cumprindo a Lei de Acesso à Informação. É este, sem dúvida, o melhor caminho para combater esquemas corruptos.

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