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Campanhas sujas e o racismo de Ciro Gomes

Ciro quer o voto de Lula, que é avesso a declarações racistas, embora possa tolerar isso quando se trata de atacar um integrante do MBL

CIRO GOMES: pré-candidato à presidência já fez muitos comentários racistas e desrespeitosos / Divulgação (Divulgação/Divulgação)
CIRO GOMES: pré-candidato à presidência já fez muitos comentários racistas e desrespeitosos / Divulgação (Divulgação/Divulgação)
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Sérgio Praça

Publicado em 20 de junho de 2018 às, 13h12.

Última atualização em 20 de junho de 2018 às, 14h01.

O pré-candidato do PDT à presidência, Ciro Gomes, voltou ao estilo agressivo que o caracteriza. [“O de sempre”, diria Fernando Henrique Cardoso (PSDB)]. Em entrevista à Jovem Pan, chamou o vereador paulistano Fernando Holiday (DEM) de “capitãozinho do mato”. Capitães do mato eram escravos que agiam em conluio com o senhor da fazenda para capturar outros escravos que tentavam a fuga. Assim como um jovem universitário fez outro dia em São Paulo, Ciro associou um negro à escravidão. É ato racista e racismo é crime. O vereador já anunciou que processará o candidato pedetista.

Ciro insultou Holiday porque o vereador não é de esquerda. Líder do Movimento Brasil Livre, foi eleito aos 20 anos para uma das 55 vagas na Câmara Municipal de São Paulo. É estranho que Ciro não mexa com alguém de sua idade. Aos 60 anos, não faltam políticos de baixa estatura moral em sua geração.

Mas Ciro está com sorte. Uma das principais diferenças da campanha presidencial de 2018 com relação às anteriores é a rapidez com que as notícias circulam e são esquecidas. Com o advento da televisão, convencionou-se afirmar que o “news cycle” norte-americano dura 24 horas. Na era de Facebook, Twitter e Whatsapp, nem isso. O racismo de Ciro só voltará às manchetes em algum debate ou sabatina com jornalistas – talvez nem assim.

Ciro quer o voto dos órfãos de Lula, que são avessos a declarações abertamente racistas, embora possam tolerar isso quando se trata de atacar um integrante do MBL. Interessa a Ciro que todos esqueçam o que ele disse. Afinal, o custo reputacional para o pedetista poderá ser grande – embora a concorrência de outro pavio curto, Jair Bolsonaro (PSL), ajude a diminuir esse custo. Ser mais tosco do que ele e seus três filhos é improvável.

Se fosse mais esperto, Ciro Gomes terceirizaria seus insultos criminosos. Poderia se aliar a um grupo que funcionaria como seu porta-voz para o pior do que pensa. Não estou falando de fake news, mas da agressividade natural do candidato mesmo. Receber Sérgio Moro a bala? O papel de Patrícia Pillar é dormir comigo? Eu não quis dizer isso, o movimento XYZ não representa minhas ideias, poderia afirmar Ciro. Com isso, ganharia ao poder negar ter dito o que pensa de pior.  Essa estratégia funciona nos Estados Unidos, conforme mostram os cientistas políticos Conor Dowling e Amber Wichowsky no texto “Attacks without Consequence? Candidates, Parties, Groups, and the Changing Face of Negative Advertising”, publicado pelo American Journal of Political Science em 2015.

Ironicamente, o Movimento Brasil Livre é constantemente acusado de financiar sites de fake news para atacar os políticos dos quais discordam e com os quais competem por atenção. Fernando Holiday poderia aproveitar a oportunidade para explicar isso. Assim mostraria ainda mais maturidade do que o sexagenário.