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A Itaipava e o custo da corrupção

No início do ano passado, uma hashtag curiosa virou trending topic no Twitter no Chile: #SupermercadosVacios. Tratava-se de um protesto contra três redes de supermercados (duas nacionais e o Walmart) que teriam agido em conluio para aumentar o preço do frango. As empresas teriam também pressionado mercados menores a honrar o acordo ilegal. Após alguns […]

Grupo Petrópolis faz ação de Dia da Cerveja com a marca Itaipava (Itaipava/Divulgação)
DR

Da Redação

Publicado em 8 de março de 2017 às 13h02.

Última atualização em 22 de junho de 2017 às 18h25.

No início do ano passado, uma hashtag curiosa virou trending topic no Twitter no Chile: #SupermercadosVacios. Tratava-se de um protesto contra três redes de supermercados (duas nacionais e o Walmart) que teriam agido em conluio para aumentar o preço do frango. As empresas teriam também pressionado mercados menores a honrar o acordo ilegal.

Após alguns anos investigando outros tipos de cartéis, as autoridades chilenas descobriram este e a população o considerou a gota d’água. O mais interessante é a possibilidade de os cidadãos fazerem as empresas sentirem no bolso as implicações de ferir as leis. Será que o mesmo ocorrerá no Brasil com a Operação Lava-Jato? A cervejaria Petrópolis poderia ser a primeira “vítima”. A empresa foi implicada pela Odebrecht como intermediadora de recursos para campanhas eleitorais em 2014.

Em primeiro lugar, é interessante notar que o custo da corrupção para as empreiteiras pode ser menor do que para outros tipos de empresas. Odebrecht, Andrade Gutierrez, OAS, UTC e muitas outras fortemente implicadas na Operação Lava-Jato vivem (viviam?) de suas relações com o setor público. Não à toa gastaram tanto dinheiro com propinas.

Dependiam dos laços informais com políticos para manter, por exemplo, o cartel com que dominavam certas licitações da Petrobras. Uma vez descobertas por conta das delações do doleiro Alberto Youssef e de Paulo Roberto Costa, um dos ex-diretores da Petrobras implicados no esquema, as empreiteiras não se preocuparam muito. Pensavam que podiam se safar. Apesar de o governo manter um cadastro de empresas inidôneas com as quais não poderia firmar contratos, dificilmente empresas do porte da Odebrecht figurariam nele. O poder político era, ou é, grande demais.

Assim as empreiteiras estão tocando até hoje, muito embora tenham sido “obrigadas” a confessar crimes escabrosos para poder firmar delações premiadas e acordos de leniência com as autoridades para poderem continuar existindo. Toda essa história tem uma conclusão simples: as empreiteiras têm como principal cliente o setor público. Suas reputações importam muito menos do que a proximidade com políticos.

Não é o caso da cervejaria Petrópolis. Suas “triangulações” com a Odebrecht para financiar campanhas eleitorais podem afetar a reputação da empresa – se não com clientes, então com outros empresários e financiadores. De acordo com reportagem de Ricardo Mendonça publicada no Valor Econômico, a cervejaria foi a sexta maior financiadora das eleições de 2014. Isso mesmo: a sexta maior financiadora! Foram 88 milhões de reais dados para 329 candidatos de 23 partidos. A revelação de que a cervejaria foi usada como “laranja” pela Odebrecht foi feita em 2 de Março e, dois dias depois, o camarote da Itaipava no Carnaval do Rio de Janeiro funcionava normalmente. (Ingenuidade minha achar que logo o Carnaval carioca mostraria pudor.)

Escrevi há poucos dias, neste espaço, sobre como empresas brasileiras ainda não têm a “cultura de compliance” que se tornou boa prática internacional. Acho que fui otimista demais. Empresas como a cervejaria Petrópolis estão – ou estavam – confiantes, como as empreiteiras, que seus crimes nunca seriam descobertos. A expectativa de punição, mesmo que revelados, era baixíssima. Não é este o caso agora: executivos da cervejaria correm sério risco de irem para a jaula.

Para alívio desses executivos, uma reportagem sobre o mercado da cerveja publicada na última edição de EXAME, escrita por Maria Luíza Filgueiras e Ana Paula Ragazzi, revela que a reputação das empresas provavelmente importa pouco para os clientes. Entre as cervejas do grupo Ambev (67,5% do mercado), Heineken (18,7%) e Petrópolis (11,8%), a opção é pela mais barata. O paladar do cidadão não é o de mestres cervejeiros. Mas empresas devem ficar espertas. Mesmo que a “cultura de compliance” não seja ainda bem implementada, convém não cometer crimes. Além de colocar seus executivos em risca, corre o risco de virar hashtag do pior jeito possível.

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No início do ano passado, uma hashtag curiosa virou trending topic no Twitter no Chile: #SupermercadosVacios. Tratava-se de um protesto contra três redes de supermercados (duas nacionais e o Walmart) que teriam agido em conluio para aumentar o preço do frango. As empresas teriam também pressionado mercados menores a honrar o acordo ilegal.

Após alguns anos investigando outros tipos de cartéis, as autoridades chilenas descobriram este e a população o considerou a gota d’água. O mais interessante é a possibilidade de os cidadãos fazerem as empresas sentirem no bolso as implicações de ferir as leis. Será que o mesmo ocorrerá no Brasil com a Operação Lava-Jato? A cervejaria Petrópolis poderia ser a primeira “vítima”. A empresa foi implicada pela Odebrecht como intermediadora de recursos para campanhas eleitorais em 2014.

Em primeiro lugar, é interessante notar que o custo da corrupção para as empreiteiras pode ser menor do que para outros tipos de empresas. Odebrecht, Andrade Gutierrez, OAS, UTC e muitas outras fortemente implicadas na Operação Lava-Jato vivem (viviam?) de suas relações com o setor público. Não à toa gastaram tanto dinheiro com propinas.

Dependiam dos laços informais com políticos para manter, por exemplo, o cartel com que dominavam certas licitações da Petrobras. Uma vez descobertas por conta das delações do doleiro Alberto Youssef e de Paulo Roberto Costa, um dos ex-diretores da Petrobras implicados no esquema, as empreiteiras não se preocuparam muito. Pensavam que podiam se safar. Apesar de o governo manter um cadastro de empresas inidôneas com as quais não poderia firmar contratos, dificilmente empresas do porte da Odebrecht figurariam nele. O poder político era, ou é, grande demais.

Assim as empreiteiras estão tocando até hoje, muito embora tenham sido “obrigadas” a confessar crimes escabrosos para poder firmar delações premiadas e acordos de leniência com as autoridades para poderem continuar existindo. Toda essa história tem uma conclusão simples: as empreiteiras têm como principal cliente o setor público. Suas reputações importam muito menos do que a proximidade com políticos.

Não é o caso da cervejaria Petrópolis. Suas “triangulações” com a Odebrecht para financiar campanhas eleitorais podem afetar a reputação da empresa – se não com clientes, então com outros empresários e financiadores. De acordo com reportagem de Ricardo Mendonça publicada no Valor Econômico, a cervejaria foi a sexta maior financiadora das eleições de 2014. Isso mesmo: a sexta maior financiadora! Foram 88 milhões de reais dados para 329 candidatos de 23 partidos. A revelação de que a cervejaria foi usada como “laranja” pela Odebrecht foi feita em 2 de Março e, dois dias depois, o camarote da Itaipava no Carnaval do Rio de Janeiro funcionava normalmente. (Ingenuidade minha achar que logo o Carnaval carioca mostraria pudor.)

Escrevi há poucos dias, neste espaço, sobre como empresas brasileiras ainda não têm a “cultura de compliance” que se tornou boa prática internacional. Acho que fui otimista demais. Empresas como a cervejaria Petrópolis estão – ou estavam – confiantes, como as empreiteiras, que seus crimes nunca seriam descobertos. A expectativa de punição, mesmo que revelados, era baixíssima. Não é este o caso agora: executivos da cervejaria correm sério risco de irem para a jaula.

Para alívio desses executivos, uma reportagem sobre o mercado da cerveja publicada na última edição de EXAME, escrita por Maria Luíza Filgueiras e Ana Paula Ragazzi, revela que a reputação das empresas provavelmente importa pouco para os clientes. Entre as cervejas do grupo Ambev (67,5% do mercado), Heineken (18,7%) e Petrópolis (11,8%), a opção é pela mais barata. O paladar do cidadão não é o de mestres cervejeiros. Mas empresas devem ficar espertas. Mesmo que a “cultura de compliance” não seja ainda bem implementada, convém não cometer crimes. Além de colocar seus executivos em risca, corre o risco de virar hashtag do pior jeito possível.

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