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A emenda corrupta, e fracassada, de Rodrigo Maia

“Saiu MP nova. Trata de programa de desenvolvimento da aviação regional. Prazo de emenda até 8/8”. Esta mensagem, enviada para o celular do empreiteiro Léo Pinheiro, da OAS, é atribuída pela Polícia Federal ao deputado federal Rodrigo Maia (DEM-RJ), atual presidente da Câmara dos Deputados. Foi enviada em julho de 2014. Pinheiro encaminhou a mensagem […]

RODRIGO MAIA: o presidente da Câmara disse não saber quando a reforma será votada / REUTERS/  (Adriano Machado/Reuters)
RODRIGO MAIA: o presidente da Câmara disse não saber quando a reforma será votada / REUTERS/ (Adriano Machado/Reuters)
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Sérgio Praça

Publicado em 9 de fevereiro de 2017 às, 18h20.

Última atualização em 22 de junho de 2017 às, 17h57.

“Saiu MP nova. Trata de programa de desenvolvimento da aviação regional. Prazo de emenda até 8/8”. Esta mensagem, enviada para o celular do empreiteiro Léo Pinheiro, da OAS, é atribuída pela Polícia Federal ao deputado federal Rodrigo Maia (DEM-RJ), atual presidente da Câmara dos Deputados. Foi enviada em julho de 2014. Pinheiro encaminhou a mensagem para um destinatário desconhecido, completando: “Vamos preparar emendas [à MP]”. Refere-se à Medida Provisória 652/2014. Maia apresentou uma emenda a esta MP pedindo legislação única para empresas privadas que gerenciam aeroportos e empresas públicas que fazem o mesmo. A emenda, se aprovada (não foi), beneficiaria a OAS, uma das organizações responsáveis pelo aeroporto de Guarulhos.

De acordo com a Polícia Federal, Maia enviou a Pinheiro uma mensagem, em setembro daquele ano, dizendo: “a doação de 250 vai entrar?”. Provavelmente refere-se a 250.000 reais. Na campanha de 2014, a OAS não deu dinheiro (ao menos legalmente) para Rodrigo Maia. O maior doador do deputado naquela eleição foi o banco BMG, com 500.000 reais. Sua campanha gastou pouco mais de 2 milhões de reais (declarados). Caso seja verdade que a OAS doou 250.000 reais à sua campanha ilegalmente, este valor teria sido o terceiro maior recebido pelo deputado.

Mas, segundo a Polícia Federal, a campanha de seu pai, César Maia, pode ter sido usada para ocultar os repasses da OAS. César Maia foi candidato (derrotado) ao Senado em 2014 e recebeu 750.000 reais da construtora. Enviou 284.000 reais para a campanha do filho (de modo legal). Rodrigo Maia negou, é claro, qualquer irregularidade. Mas fez isso de um jeito estranho. Foi o que os jornalistas Bob Woodward e Carl Bernstein, responsáveis pela investigação de Watergate, chamam de “non-denial denial”. Ocorre quando alguém é acusado de X e diz que não fez Y. Ontem, o presidente da Câmara disse ao Jornal Nacional que “nunca recebeu vantagem indevida para votar qualquer matéria na Câmara”. Ora, ninguém acusou-o de votar algo de interesse da OAS, mas sim de propor uma emenda legislativa que beneficiasse a empreiteira!

Ao contrário das “executive orders” assinadas esses dias por Donald Trump, medidas provisórias editadas pelo presidente brasileiro precisam de aprovação congressual. Entram em vigor imediatamente, mas passam por análise parlamentar (e votações em plenário) antes de se tornarem leis definitivas. Assim que uma MP é publicada, forma-se uma comissão de deputados e senadores para propor emendas e analisá-la. Um relator é indicado. No caso da MP 652/2014, o relator foi o senador Flexa Ribeiro (PSDB). Cabe ao relator aprovar as emendas oferecidas pelos congressistas. Ribeiro acatou, total ou parcialmente, apenas 15 das 85 emendas propostas.

Uma estratégia comum é propor a uma MP sobre o setor elétrico, por exemplo, uma emenda que trata de empresas estatais. O exemplo é fictício. Trata-se do que os americanos chamam de “smuggling” e traduzimos como “jabuti”: colocar na legislação X algo sobre o assunto Y, relevante para o parlamentar e/ou grupos de interesse. Em outubro de 2015, o Supremo Tribunal Federal proibiu a introdução de jabutis. Desde então, medidas provisórias não podem receber conteúdo estranho ao texto original. Ainda assim, os parlamentares continuam propondo.

Não foi o caso da emenda de Rodrigo Maia. Sua estratégia para agradar a OAS foi mais sutil. Para que fosse aprovada, Maia deveria ter negociado com o relator Flexa Ribeiro. Não há indício de que isso tenha ocorrido. Caso toda a investigação da Polícia Federal esteja mostrando a verdade, a OAS teria desperdiçado dinheiro ao subornar Rodrigo Maia? Acho que não.

Maia é presidente da Câmara dos Deputados e interlocutor constante do presidente Michel Temer (PMDB). Ainda pode influenciar, por exemplo, mudanças na lei anticorrupção, de 2013, que trata de acordos de leniência. E este tema hoje interessa bem mais a empreiteira do que o aeroporto de Guarulhos.

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