Mais uma história de carro e uma conclusão: Mind the Gap!
Mais sobre experiência do cliente e um alerta: MIND THE GAP!
Marcio Oliveira
Publicado em 22 de junho de 2015 às 16h36.
Última atualização em 5 de abril de 2017 às 10h45.
Meus amigos costumam falar que sou um tipo de ímã de situações inusitadas como cliente. Se algo estranho tem que acontecer, vai acontecer comigo ou perto de mim. O lado bom disso é que possuo vários cases bons e ruins para abordar em minhas aulas e artigos.
Meu último artigo foi sobre uma experiência que tive em um test-drive de veículo e neste, vou contar outra no mesmo segmento.
Quem já teve que deixar um carro na concessionária para fazer uma revisão sabe que não é uma experiência necessariamente confortável. Eu, por exemplo, costumo ficar preocupado com o preço, se vai aparecer alguma surpresa no orçamento, com o incômodo de deixar o carro o dia inteiro na concessionária e há sempre a questão da desconfiança do que está sendo feito.
Talvez, por considerar que existam mais clientes como eu, e também para estimulá-los a manter as revisões em dia ou usar mais os serviços de oficina, algumas montadoras vêm criando formas diferentes para realização destes serviços.
Mas vamos à minha história.
Na última semana foi a minha vez de fazer a revisão do meu carro. Era a primeira na marca do meu veículo atual e descobri que ela oferecia, além do procedimento tradicional em concessionárias, um serviço de revisão rápida para a quilometragem que o meu carro possuía. Não era preciso marcar hora, bastando ir a um dos pontos de atendimento (que eram fora de uma concessionária) e o serviço seria realizado em uma hora. Essa era a promessa de marketing que estava no site da montadora e no discurso do atendimento telefônico quando liguei.
Perguntei o preço e levei um susto (claro!), mas me parecia a melhor opção. “Tento negociar na hora”, pensei. De qualquer maneira, fiquei satisfeito com a possibilidade de resolver tudo rapidamente.
No dia seguinte, cheguei ao posto de atendimento apenas 15 minutos após a hora de abertura que me foi informada, mas ele estava fechado. Era em uma avenida movimentada e sem lugar para estacionar, então resolvi ir até uma padaria próxima dar um tempo e tomar meu café da manhã. Resumindo esta parte, uma hora depois o lugar ainda permanecia fechado. Desisti e fiquei imaginando que algum imprevisto tinha acontecido com a pessoa que tinha a chave da porta.
Próximo ao horário do almoço, resolvi ligar no lugar para ver se estava aberto e fui atendido por uma pessoa simpática que me disse que o local estava tranquilo e que eu poderia ir naquele momento. Cheguei lá em menos de 20 minutos e comecei a me questionar sobre qual significado que a palavra tranquilo tinha para aquela pessoa. O lugar estava com todos os quatro elevadores de veículos ocupados e com mais três carros aguardando.
Não havia atendentes e nem foi me perguntado qual o serviço que eu precisava fazer. Na verdade, não foi me perguntado nada. O atendimento foi feito diretamente pelo mecânico que eu abordei na chegada e a instrução foi apenas para eu aguardar 40 minutos para a realização do serviço. Achei estanho, mas resolvi esperar, aproveitando para observar o lugar e toda a comunicação nas paredes que explicava o processo de atendimento e que tudo era discutido e negociado diretamente com o mecânico com mais agilidade e rapidez.
Estes eram os principais diferenciais prometidos. Me pareceu um processo interessante e diferente. Senti que poderia acompanhar de perto, minimizando a desconfiança do que estava sendo feito que, para mim, por não entender muito de mecânica, é um ponto importante.
Comecei a ficar incomodado quando quase uma hora depois eu ainda estava esperando e o cenário na oficina era igual, com os mesmos carros nos elevadores e os mesmos esperando.
Saí da sala de espera e reparei que um dos clientes estava conversando um tanto indignado com um mecânico. Ele era um dos que estavam esperando também Vou reproduzir aqui apenas parte do diálogo que ouvi:
Cliente: “Estou aqui há uma hora e meia e só agora você me diz isso? Que absurdo, quem é o gerente daqui?”
Mecânico: “Não tem gerente, somos nós mesmos que temos que fazer tudo.”
Cliente: “Mas eu disse que queria apenas trocar as pastilhas de freio quando cheguei, porque você não me falou que não tinha em estoque ou porque ninguém viu isso antes?”
Mecânico: “Te entendo, mas aqui a gente tem que fazer tudo. Não tem ninguém para abrir uma ficha de atendimento. Então, segundo o procedimento da montadora que temos que seguir, tenho que olhar o carro antes para apenas depois fazer o orçamento e ver se tem peças para fazer o serviço. Mas eu só posso fazer isso depois de liberar o carro que estou atendendo. Eu não podia ver se tinha pastilha antes.”
Mecânico: “Se tivéssemos pessoas para fazer atendimento, abrir a ficha e nós pudéssemos cuidar apenas dos carros, seria mais fácil, mas não temos. Todo dia é assim.”
O diálogo continuou e deu para entender bem o problema. A ideia e o conceito por trás eram ótimos e, provavelmente, resolveriam várias das dificuldades que relatei no início do texto na hora de se fazer uma revisão de veículo ou qualquer outro serviço mecânico em uma concessionária. E quero acreditar que a empresa estudou tudo muito bem antes de implementar. O problema é que a realidade operacional parece estar muito longe deste conceito.
Pode parecer legal e uma boa sacada de marketing dar para o cliente a possibilidade de discutir tudo com o mecânico, mas, para ele, fazer papéis múltiplos no atendimento talvez não funcione bem. Neste caso, o mecânico estava bem treinado e seguiu corretamente os processos definidos. O problema é que o processo excluiu o cliente ao mesmo tempo que o aproximava. Como assim? Simples, o cliente ali só vira cliente de fato a partir do momento em que o mecânico efetivamente vai mexer no carro. Antes disso, ele é apenas alguém esperando, que deseja fazer algo que ninguém sabe o que é ou pode perguntar ainda. Afinal, o foco de todos os mecânicos parecia estar em realizar um bom serviço para quem eles estão atendendo no momento. Funcionaria bem se o serviço prestado fosse realmente rápido, mas não era e raramente seria.
Apesar da promessa de realização dos serviços em uma hora, todos ali já haviam aguardado mais do que este tempo por diversos fatores que, segundo o mecânico, eram normais e corriqueiros. Ou seja, o que era para ser o normal era raro acontecer e o que deveria ser a exceção era o que acontecia sempre.
Nas entrelinhas, o mecânico parecia pedir ajuda. “ Não conseguimos fazer tudo”, “teria que ter gente apenas para controlar o atendimento e o que deveria ser feito”, “o espaço aqui é pequeno e sempre vai ter muito cliente esperando, não tem jeito”.
Minha conclusão é simples: uma boa ideia e uma boa roupagem de marketing deram resultado em termos de quantidade de clientes no local, mas as promessas dificilmente se cumpririam por conta da natureza do negócio. Resultado: insatisfação de ambos os lados e um enorme gap entre promessa e entrega. MIND THE GAP!
Ah, e eu também fui embora sem realizar o serviço, já que não poderia esperar por muito mais tempo.
Meus amigos costumam falar que sou um tipo de ímã de situações inusitadas como cliente. Se algo estranho tem que acontecer, vai acontecer comigo ou perto de mim. O lado bom disso é que possuo vários cases bons e ruins para abordar em minhas aulas e artigos.
Meu último artigo foi sobre uma experiência que tive em um test-drive de veículo e neste, vou contar outra no mesmo segmento.
Quem já teve que deixar um carro na concessionária para fazer uma revisão sabe que não é uma experiência necessariamente confortável. Eu, por exemplo, costumo ficar preocupado com o preço, se vai aparecer alguma surpresa no orçamento, com o incômodo de deixar o carro o dia inteiro na concessionária e há sempre a questão da desconfiança do que está sendo feito.
Talvez, por considerar que existam mais clientes como eu, e também para estimulá-los a manter as revisões em dia ou usar mais os serviços de oficina, algumas montadoras vêm criando formas diferentes para realização destes serviços.
Mas vamos à minha história.
Na última semana foi a minha vez de fazer a revisão do meu carro. Era a primeira na marca do meu veículo atual e descobri que ela oferecia, além do procedimento tradicional em concessionárias, um serviço de revisão rápida para a quilometragem que o meu carro possuía. Não era preciso marcar hora, bastando ir a um dos pontos de atendimento (que eram fora de uma concessionária) e o serviço seria realizado em uma hora. Essa era a promessa de marketing que estava no site da montadora e no discurso do atendimento telefônico quando liguei.
Perguntei o preço e levei um susto (claro!), mas me parecia a melhor opção. “Tento negociar na hora”, pensei. De qualquer maneira, fiquei satisfeito com a possibilidade de resolver tudo rapidamente.
No dia seguinte, cheguei ao posto de atendimento apenas 15 minutos após a hora de abertura que me foi informada, mas ele estava fechado. Era em uma avenida movimentada e sem lugar para estacionar, então resolvi ir até uma padaria próxima dar um tempo e tomar meu café da manhã. Resumindo esta parte, uma hora depois o lugar ainda permanecia fechado. Desisti e fiquei imaginando que algum imprevisto tinha acontecido com a pessoa que tinha a chave da porta.
Próximo ao horário do almoço, resolvi ligar no lugar para ver se estava aberto e fui atendido por uma pessoa simpática que me disse que o local estava tranquilo e que eu poderia ir naquele momento. Cheguei lá em menos de 20 minutos e comecei a me questionar sobre qual significado que a palavra tranquilo tinha para aquela pessoa. O lugar estava com todos os quatro elevadores de veículos ocupados e com mais três carros aguardando.
Não havia atendentes e nem foi me perguntado qual o serviço que eu precisava fazer. Na verdade, não foi me perguntado nada. O atendimento foi feito diretamente pelo mecânico que eu abordei na chegada e a instrução foi apenas para eu aguardar 40 minutos para a realização do serviço. Achei estanho, mas resolvi esperar, aproveitando para observar o lugar e toda a comunicação nas paredes que explicava o processo de atendimento e que tudo era discutido e negociado diretamente com o mecânico com mais agilidade e rapidez.
Estes eram os principais diferenciais prometidos. Me pareceu um processo interessante e diferente. Senti que poderia acompanhar de perto, minimizando a desconfiança do que estava sendo feito que, para mim, por não entender muito de mecânica, é um ponto importante.
Comecei a ficar incomodado quando quase uma hora depois eu ainda estava esperando e o cenário na oficina era igual, com os mesmos carros nos elevadores e os mesmos esperando.
Saí da sala de espera e reparei que um dos clientes estava conversando um tanto indignado com um mecânico. Ele era um dos que estavam esperando também Vou reproduzir aqui apenas parte do diálogo que ouvi:
Cliente: “Estou aqui há uma hora e meia e só agora você me diz isso? Que absurdo, quem é o gerente daqui?”
Mecânico: “Não tem gerente, somos nós mesmos que temos que fazer tudo.”
Cliente: “Mas eu disse que queria apenas trocar as pastilhas de freio quando cheguei, porque você não me falou que não tinha em estoque ou porque ninguém viu isso antes?”
Mecânico: “Te entendo, mas aqui a gente tem que fazer tudo. Não tem ninguém para abrir uma ficha de atendimento. Então, segundo o procedimento da montadora que temos que seguir, tenho que olhar o carro antes para apenas depois fazer o orçamento e ver se tem peças para fazer o serviço. Mas eu só posso fazer isso depois de liberar o carro que estou atendendo. Eu não podia ver se tinha pastilha antes.”
Mecânico: “Se tivéssemos pessoas para fazer atendimento, abrir a ficha e nós pudéssemos cuidar apenas dos carros, seria mais fácil, mas não temos. Todo dia é assim.”
O diálogo continuou e deu para entender bem o problema. A ideia e o conceito por trás eram ótimos e, provavelmente, resolveriam várias das dificuldades que relatei no início do texto na hora de se fazer uma revisão de veículo ou qualquer outro serviço mecânico em uma concessionária. E quero acreditar que a empresa estudou tudo muito bem antes de implementar. O problema é que a realidade operacional parece estar muito longe deste conceito.
Pode parecer legal e uma boa sacada de marketing dar para o cliente a possibilidade de discutir tudo com o mecânico, mas, para ele, fazer papéis múltiplos no atendimento talvez não funcione bem. Neste caso, o mecânico estava bem treinado e seguiu corretamente os processos definidos. O problema é que o processo excluiu o cliente ao mesmo tempo que o aproximava. Como assim? Simples, o cliente ali só vira cliente de fato a partir do momento em que o mecânico efetivamente vai mexer no carro. Antes disso, ele é apenas alguém esperando, que deseja fazer algo que ninguém sabe o que é ou pode perguntar ainda. Afinal, o foco de todos os mecânicos parecia estar em realizar um bom serviço para quem eles estão atendendo no momento. Funcionaria bem se o serviço prestado fosse realmente rápido, mas não era e raramente seria.
Apesar da promessa de realização dos serviços em uma hora, todos ali já haviam aguardado mais do que este tempo por diversos fatores que, segundo o mecânico, eram normais e corriqueiros. Ou seja, o que era para ser o normal era raro acontecer e o que deveria ser a exceção era o que acontecia sempre.
Nas entrelinhas, o mecânico parecia pedir ajuda. “ Não conseguimos fazer tudo”, “teria que ter gente apenas para controlar o atendimento e o que deveria ser feito”, “o espaço aqui é pequeno e sempre vai ter muito cliente esperando, não tem jeito”.
Minha conclusão é simples: uma boa ideia e uma boa roupagem de marketing deram resultado em termos de quantidade de clientes no local, mas as promessas dificilmente se cumpririam por conta da natureza do negócio. Resultado: insatisfação de ambos os lados e um enorme gap entre promessa e entrega. MIND THE GAP!
Ah, e eu também fui embora sem realizar o serviço, já que não poderia esperar por muito mais tempo.