“Temos de ser melhores naquilo a que nos propomos fazer. Sou otimista, acredito que é possível executar o que se planeja” (Germano Lüders/Exame)
Fundadora e CEO da RM Cia 360
Publicado em 17 de junho de 2025 às 09h35.
Última atualização em 17 de junho de 2025 às 14h39.
Inicio esta coluna com uma provocação de Murilo Martins, Diretor-Presidente da Loram, empresa multinacional de manutenção de trilhos ferroviários — pois acredito que as possibilidades estratégicas de inovação no Brasil são inúmeras, e elas também passam pela ferrovia.
“Num país onde quase 28% do PIB vem da produção agrícola e mineral, é difícil entender por que a ferrovia ainda é tratada como um modal periférico — quando deveria estar no centro da estratégia de desenvolvimento”, afirma Murilo, engenheiro civil formado pela Universidade Federal do Paraná, com especialização em Engenharia Ferroviária pela UniALL. Ele também é alumni da Harvard Business School, onde concluiu o General Management Program (GMP) em 2021, com foco em gestão global e liderança de alto impacto.
Essa reflexão também diz respeito à forma como o Brasil, historicamente, mesmo sendo um país tão rico em recursos naturais, agricultura, reservas minerais e potenciais energéticos, ainda carrega o peso de ser classificado como “país de terceiro mundo”. É preciso avançar — e isso só será possível analisando o macro.
Enquanto outras nações estruturam sua infraestrutura para potencializar seus ativos estratégicos, o Brasil insiste em uma matriz logística baseada predominantemente no transporte rodoviário — um modal mais poluente, se comparado à ferrovia.
“Menos de 28% desses volumes estratégicos são transportados por ferrovias. O restante, majoritariamente, ainda depende de caminhões que percorrem milhares de quilômetros, consumindo diesel, degradando estradas e elevando o custo logístico do país. Em um cenário onde metas climáticas e compromissos ESG se tornam imperativos para governos e empresas, apostar no modal ferroviário é, antes de tudo, uma resposta concreta à urgência ambiental”, enfatiza Murilo.
Um dos pontos mais críticos e urgentes no debate sobre infraestrutura no Brasil é o impacto ambiental do modal logístico. Quando o assunto é desmatamento na Amazônia ou no Cerrado, o transporte rodoviário tem peso significativo. De acordo com o Plano Nacional de Logística (PNL, 2025) 65% das cargas são transportadas por rodovias, esse panorama dos transportes de 2015 mostra que as rodovias ainda é o meio mais utilizado para cargas.
“A ferrovia emite menos, consome menos e gera mais estabilidade. Mas, para que o setor avance, é necessário aplicar tecnologia e inteligência em cada trilho. Só em nossas operações globais, são mais de 500 mil toneladas de trilhos economizadas por ano, o que equivale a cerca de 925 mil toneladas de CO₂ evitadas. Isso é ESG na prática — aplicado ao campo”, reafirma o executivo.
Implementar e expandir ferrovias de maneira estratégica pode se tornar uma ferramenta poderosa de ordenamento territorial, promovendo o desenvolvimento sustentável e a proteção dos ecossistemas. O cenário atual nos pede reflexão.
“Trabalho há mais de 15 anos no setor ferroviário e hoje lidero a operação sul-americana da Loram, referência global em manutenção de vias férreas. Em nossa área, a inovação começa no detalhe técnico: com o esmerilhamento de trilhos feito com precisão milimétrica, evitamos que toneladas de aço — ou trilhos — precisem ser fabricadas novamente, o que reduz drasticamente as emissões das usinas siderúrgicas”, afirma o executivo.
Costumo dizer que é necessário criar oportunidades nas periferias das grandes metrópoles — e que, sim, é possível viver com qualidade em qualquer lugar. Para isso, precisamos investir em soluções de mobilidade que alcancem as pessoas que levam horas se deslocando até o trabalho. O Instituto Capacita-me, localizado no extremo sul de São Paulo, foi criado também com esse objetivo: oferecer recursos educacionais e profissionais reais e possíveis para a sociedade, dentro da comunidade, contribuindo assim, com o controle de tráfego e meio ambiente.
“Trens metropolitanos, de média e alta velocidade, não servem apenas para deslocar pessoas. Eles redistribuem o crescimento. Ao conectarem cidades médias a grandes centros urbanos, descentralizam a urbanização, reduzem a pressão por moradia e infraestrutura em regiões saturadas e ampliam o acesso a emprego, educação e consumo. Em outras palavras, além da eficiência em ESG que citei anteriormente, atacam a desigualdade de acesso na sua origem”, ressalta Martins.
Ao investir em inovação no transporte de passageiros com uma visão sistêmica e de longo prazo, o Brasil pode transformar realidades locais, promovendo desenvolvimento técnico e social. Assim, torna-se possível reduzir desigualdades de acesso, modernizar sistemas ineficientes e criar alternativas sustentáveis, inclusivas e eficazes.
Acreditamos que inovação, sustentabilidade e desenvolvimento social podem — e devem — seguir no mesmo trilho. “Acho que o Brasil não precisa reinventar a roda em relação à tecnologia industrial para o setor, mas sim, acelerar com inteligência e visão de longo prazo”, conclui Murilo.