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'Fator Tarcísio' antecipa polarização na economia

Haddad e Campos Neto ensaiam duelo pelo apoio do PIB; disputa, até agora velada, pode resvalar na transição de comando do BC

(Mônica Andrade/Governo do Estado de SP/Flickr)
Fábio Zambeli

Vice-presidente da Ágora Assuntos Públicos

Publicado em 24 de maio de 2024 às 11h17.

Última atualização em 24 de maio de 2024 às 11h17.

Entusiasta da expansão da aliança de Lula com o centro, o ministro Fernando Haddad (Fazenda) demonstra desconforto com o flerte de agentes do sistema financeiro com a potencial pré-candidatura de Tarcísio de Freitas ao Planalto em 2026.

No centro das insatisfações do ministro está o presidente do Banco Central, Roberto Campos Neto, cujo mandato expira no final do ano.

Campos Neto, indicado ao cargo por Jair Bolsonaro, é visto como um nome natural para chefiar a plataforma econômica em um eventual campanha presidencial de Tarcísio.

Haddad, que vinha guardando distância estratégica dos recorrentes ataques de Lula ao mercado, passa agora a usar expressões cifradas e indiretas para questionar análises e previsões feitas pelos especialistas da Faria Lima.

Um sintoma desse descontentamento foi exibido durante a turbulenta audiência na Câmara em que o titular da Fazenda atribuiu a "fantasminhas" as projeções mais pessimistas sobre a economia brasileira.

Na mesma sessão, o ministro se inspirou no ex-colega Flávio Dino e decidiu ironizar as perguntas de oposicionistas, usando frases de efeito com alto potencial de engajamento nas redes sociais para rebater comentários depreciativos de parlamentares.

Em dado momento, Haddad chegou a provocar um deputado da oposição sobre o governador de São Paulo. "Pega o microfone e fala mal do Tarcísio", disse o petista, dirigindo-se a Kim Kataguiri.

A principal consequência do "duelo velado" em curso interage com a percepção de risco sobre os fundamentos da economia em curto e médio prazos.

Em meio às tratativas decisivas para a sucessão na autoridade monetária, Haddad e Campos Neto acabaram, na prática, deflagrando uma espécie de "polarização" em torno dos rumos da economia, antecipando um embate que já estava contratado para a eleição daqui a dois anos.

Em jogo está o alinhamento da equipe econômica do Executivo com o BC na trajetória de corte na taxa de juros, o controle da inflação e a agenda de estímulo ao crescimento.

Corrida de obstáculos

Haddad constrói ao longo de sua gestão uma blindagem à ala mais ideológica do governo, chefiada por líderes do PT, que é refratária ao ajuste mais duro nas contas públicas. Esse movimento é respaldado, em grande medida, por atores graúdos do mercado, com quem o ministro se empenha em manter estreita relação.

É uma tarefa que tem elevado ônus político, visto que a agenda do aperto fiscal é altamente impopular e encontra resistências agudas no Palácio do Planalto.

A compensação ao esforço pelo rigor na gestão do orçamento federal viria mais adiante, quando a posição de chefe da pasta da Fazenda o credenciaria a voos mais altos na linha de sucessão a Lula.

Ocorre que tal dinâmica, como tem defendido Haddad, depende da manutenção do alinhamento do presidente ao grupo suprapartidário que o suportou na corrida eleitoral de 2022 em antítese ao projeto de Bolsonaro. Bloco esse avalizado por economistas de grosso calibre e que hoje se dizem contrariados com o que chamam de intervencionismo ideológico que faria prevalecer o desenvolvimentismo na agenda lulista para a reta final do mandato.

São atores que hoje observam com mais carinho a construção de um projeto alternativo ao advogado por próceres petistas com poder de fogo no Planalto.
Não à toa, Haddad passou a alertar o entorno de Lula de que as chances de vitória do PT nas urnas estão atreladas à preservação dessa coalizão mais ampla, extrapolando o espectro da esquerda.

E qual a relação desse cenário político de 2026 com a nova polarização Haddad x Campos Neto?
Nos meses derradeiros de sua passagem pelo BC, Campos Neto tem procurado calibrar seu lastro junto ao sistema financeiro com uma fleumática condução da política monetária, já antevendo uma mudança de rumos a partir da provável chegada do favorito Gabriel Galípolo à cadeira.

Para interlocutores de Haddad, a estreita relação de Campos Neto com Tarcísio, que é notória e pública, tem servido ao propósito de afastar expoentes centristas do campo de Lula para o da direita, já vislumbrando uma futura disputa nacional.

Jogo de cena

Todo esse imbróglio ganha corpo nas articulações de bastidores, mas ainda tende a ser mantido em silêncio obsequioso na arena pública. O que vem sendo consumado a cada dia no eixo da governabilidade em Brasília é uma expansão gradual e consistente do grupo de ministros políticos em detrimento da ala técnica.

A recente substituição na Petrobras reflete esse quadro, que amplia a zona de dominância da dupla Alexandre Silveira (Minas e Energia) e Rui Costa (Casa Civil) em detrimento dos "bombeiros" moderados do time de Haddad.

Com o distanciamento de centristas como Simone Tebet (Planejamento) e Geraldo Alckmin (Desenvolvimento, Indústria e Comércio) do núcleo decisório do Planalto, o único vetor do centro que mantém seu cacife é o pragmático –ou fisiológico–, que depende das eleições na mesa da Câmara e do Senado para repactuar a aliança de sustentação a Lula, ainda que em bases bastante desconfortáveis para o governo.

Enquanto isso, Tarcísio anuncia em São Paulo um novo programa de corte de R$ 20 bilhões/ano em gastos públicos e dá os passos derradeiros da privatização da Sabesp, principal estatal do estado, um tabu político de décadas. Agendas, diga-se, aderentes às demandas da mesma plateia cortejada por Haddad no coração financeiro da capital paulista.

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No centro das insatisfações do ministro está o presidente do Banco Central, Roberto Campos Neto, cujo mandato expira no final do ano.

Campos Neto, indicado ao cargo por Jair Bolsonaro, é visto como um nome natural para chefiar a plataforma econômica em um eventual campanha presidencial de Tarcísio.

Haddad, que vinha guardando distância estratégica dos recorrentes ataques de Lula ao mercado, passa agora a usar expressões cifradas e indiretas para questionar análises e previsões feitas pelos especialistas da Faria Lima.

Um sintoma desse descontentamento foi exibido durante a turbulenta audiência na Câmara em que o titular da Fazenda atribuiu a "fantasminhas" as projeções mais pessimistas sobre a economia brasileira.

Na mesma sessão, o ministro se inspirou no ex-colega Flávio Dino e decidiu ironizar as perguntas de oposicionistas, usando frases de efeito com alto potencial de engajamento nas redes sociais para rebater comentários depreciativos de parlamentares.

Em dado momento, Haddad chegou a provocar um deputado da oposição sobre o governador de São Paulo. "Pega o microfone e fala mal do Tarcísio", disse o petista, dirigindo-se a Kim Kataguiri.

A principal consequência do "duelo velado" em curso interage com a percepção de risco sobre os fundamentos da economia em curto e médio prazos.

Em meio às tratativas decisivas para a sucessão na autoridade monetária, Haddad e Campos Neto acabaram, na prática, deflagrando uma espécie de "polarização" em torno dos rumos da economia, antecipando um embate que já estava contratado para a eleição daqui a dois anos.

Em jogo está o alinhamento da equipe econômica do Executivo com o BC na trajetória de corte na taxa de juros, o controle da inflação e a agenda de estímulo ao crescimento.

Corrida de obstáculos

Haddad constrói ao longo de sua gestão uma blindagem à ala mais ideológica do governo, chefiada por líderes do PT, que é refratária ao ajuste mais duro nas contas públicas. Esse movimento é respaldado, em grande medida, por atores graúdos do mercado, com quem o ministro se empenha em manter estreita relação.

É uma tarefa que tem elevado ônus político, visto que a agenda do aperto fiscal é altamente impopular e encontra resistências agudas no Palácio do Planalto.

A compensação ao esforço pelo rigor na gestão do orçamento federal viria mais adiante, quando a posição de chefe da pasta da Fazenda o credenciaria a voos mais altos na linha de sucessão a Lula.

Ocorre que tal dinâmica, como tem defendido Haddad, depende da manutenção do alinhamento do presidente ao grupo suprapartidário que o suportou na corrida eleitoral de 2022 em antítese ao projeto de Bolsonaro. Bloco esse avalizado por economistas de grosso calibre e que hoje se dizem contrariados com o que chamam de intervencionismo ideológico que faria prevalecer o desenvolvimentismo na agenda lulista para a reta final do mandato.

São atores que hoje observam com mais carinho a construção de um projeto alternativo ao advogado por próceres petistas com poder de fogo no Planalto.
Não à toa, Haddad passou a alertar o entorno de Lula de que as chances de vitória do PT nas urnas estão atreladas à preservação dessa coalizão mais ampla, extrapolando o espectro da esquerda.

E qual a relação desse cenário político de 2026 com a nova polarização Haddad x Campos Neto?
Nos meses derradeiros de sua passagem pelo BC, Campos Neto tem procurado calibrar seu lastro junto ao sistema financeiro com uma fleumática condução da política monetária, já antevendo uma mudança de rumos a partir da provável chegada do favorito Gabriel Galípolo à cadeira.

Para interlocutores de Haddad, a estreita relação de Campos Neto com Tarcísio, que é notória e pública, tem servido ao propósito de afastar expoentes centristas do campo de Lula para o da direita, já vislumbrando uma futura disputa nacional.

Jogo de cena

Todo esse imbróglio ganha corpo nas articulações de bastidores, mas ainda tende a ser mantido em silêncio obsequioso na arena pública. O que vem sendo consumado a cada dia no eixo da governabilidade em Brasília é uma expansão gradual e consistente do grupo de ministros políticos em detrimento da ala técnica.

A recente substituição na Petrobras reflete esse quadro, que amplia a zona de dominância da dupla Alexandre Silveira (Minas e Energia) e Rui Costa (Casa Civil) em detrimento dos "bombeiros" moderados do time de Haddad.

Com o distanciamento de centristas como Simone Tebet (Planejamento) e Geraldo Alckmin (Desenvolvimento, Indústria e Comércio) do núcleo decisório do Planalto, o único vetor do centro que mantém seu cacife é o pragmático –ou fisiológico–, que depende das eleições na mesa da Câmara e do Senado para repactuar a aliança de sustentação a Lula, ainda que em bases bastante desconfortáveis para o governo.

Enquanto isso, Tarcísio anuncia em São Paulo um novo programa de corte de R$ 20 bilhões/ano em gastos públicos e dá os passos derradeiros da privatização da Sabesp, principal estatal do estado, um tabu político de décadas. Agendas, diga-se, aderentes às demandas da mesma plateia cortejada por Haddad no coração financeiro da capital paulista.

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