Seu dinheiro ou sua vida
Os dados econômicos estão começando a exibir o que os mercados financeiros já tinham botado na conta: uma queda dramática ao longo dos próximos meses
Da Redação
Publicado em 24 de março de 2020 às 15h13.
Última atualização em 24 de março de 2020 às 18h59.
Em 2009, os economistas americanos Carmen Reinhart e Ken Rogoff publicaram um livro excelente com um título brilhante: “Desta Vez é Diferente: Oito Séculos de Delírios Financeiros”. Claro que eles estavam sendo sarcásticos: Durante qualquer bolha financeira, à medida que a dívida sobe até chegar a níveis que historicamente são prenúncio de problemas, os investidores euforicamente asseguram a si mesmos e aos outros de que as regras antigas não valem mais, apenas para se verem diante da ruína quando as coisas de sempre acontecem.
Desta vez, porém, é diferente de verdade. Os dados econômicos estão só agora começando a exibir o que os mercados financeiros já tinham botado na conta, isto é, uma queda dramática ao longo dos próximos meses. Mas ainda que a recessão – a coronacessão? – esteja definitivamente a caminho, ela vai ser diferente das recessões anteriores. Entre outras coisas, embora nós normalmente calculemos o sucesso da política econômica com base no que acontece com o produto interno bruto real – o valor total dos bens e serviços que a economia produz, com a correção da inflação -, desta vez o PIB vai ser uma medida fraca e uma meta ruim para o sucesso da política econômica.
Sem dúvida, vão haver muitos paralelos com a crise financeira de 2008 e a Grande Recessão que se seguiu a ela. Hoje, como naquele período, os mercados financeiros estão tumultuados, com preços insanos de ativos guiados pelo estresse financeiro. Hoje, como naquele período, é provável que vá haver um bocado de desemprego gratuito, à medida que os consumidores restringirem suas compras e os trabalhadores perderem seus empregos – desemprego gratuito no sentido de que ele poderia ser evitado se o Congresso americano e o governo Trump tivessem se movido depressa para oferecer o estímulo econômico adequado. (Spoiler: Eles não fizeram isso e nem vão fazer.)
O que é diferente desta, vez, porém, é que algumas das coisas que nós queremos fazer, e que efetivamente temos de fazer se não quisermos centenas de milhares de mortes desnecessárias, vão reduzir por algum tempo o PIB. E isso é ok.
A medida mais óbvia é que nós ainda queremos e precisamos que empregados doentes ou potencialmente doentes fiquem em casa, limitando a propagação do vírus. Alguns destes trabalhadores confinados em casa são capazes de desempenhar suas funções remotamente, mas mesmo em 2020 a maioria dos empregos exige uma presença física. Como resultado, nós vamos ficar sem o PIB que esses trabalhadores poderiam produzir. Pois que assim seja. Produção não é tudo.
Um problema um pouco mais complicado envolve os empregos perdidos por causa do distanciamento social de que nós estamos precisando para desacelerar a propagação do Covid-19. As pessoas não vão e não deveriam ir a restaurantes, fazer compras não-essenciais e por aí vai; isso deixa ociosas as pessoas que em condições normais estariam trabalhando nestes estabelecimentos.
O motivo disso ser um pouco mais complicado é que, com o tempo, os empregados do setor de serviço nos segmentos atingidos poderiam ser recontratados em outras atividades: menos garçons e mais pessoas fazendo entregas. De fato, a Amazon tem dito que precisa contratar mais 100 mil empregados para dar conta da demanda online em ascensão. Se o distanciamento social extremo se tornar o novo normal, não há nenhuma razão fundamental para nós não termos um cenário de emprego pleno; só o que seria necessário seria um cardápio diferente de postos de trabalho.
Mas isso não pode acontecer da noite para o dia, e se nós acharmos que o pior vai passar em alguns poucos meses, na prática faz sentido para a maioria dos empregados dos setores atingidos continuar onde está e não trabalhar durante algum tempo. Isso também quer dizer um PIB menor, mas, de novo, que assim seja.
Ou seja, qual o papel da política econômica nesta situação? O de fazer duas coisas. Primeiro, redução de danos. Remuneração universal para quem for afastado por motivo de saúde deveria ser só o começo; nós também devíamos estar fazendo como a Dinamarca, e subsidiando empresas que continuam a pagar salários. Nós também deveríamos aumentar consideravelmente o auxílio para os desempregados.
Segundo, nós já deveríamos estar canalizando dinheiro para a economia para manter os investimentos em coisas que não deveriam ser afetadas pelo vírus. Não há motivo para as perdas de postos de trabalho causadas pela demanda geral insuficiente.
Nada disso impediria no mínimo alguns meses de contração econômica, ou ao menos não deveria. Mas nós poderíamos fazer muita coisa para tornar esta epidemia menos dolorosa do ponto de vista econômico. Eu queria ter a confiança de que nós vamos fazer mais do que uma pequena fração do que deveríamos fazer.
Em 2009, os economistas americanos Carmen Reinhart e Ken Rogoff publicaram um livro excelente com um título brilhante: “Desta Vez é Diferente: Oito Séculos de Delírios Financeiros”. Claro que eles estavam sendo sarcásticos: Durante qualquer bolha financeira, à medida que a dívida sobe até chegar a níveis que historicamente são prenúncio de problemas, os investidores euforicamente asseguram a si mesmos e aos outros de que as regras antigas não valem mais, apenas para se verem diante da ruína quando as coisas de sempre acontecem.
Desta vez, porém, é diferente de verdade. Os dados econômicos estão só agora começando a exibir o que os mercados financeiros já tinham botado na conta, isto é, uma queda dramática ao longo dos próximos meses. Mas ainda que a recessão – a coronacessão? – esteja definitivamente a caminho, ela vai ser diferente das recessões anteriores. Entre outras coisas, embora nós normalmente calculemos o sucesso da política econômica com base no que acontece com o produto interno bruto real – o valor total dos bens e serviços que a economia produz, com a correção da inflação -, desta vez o PIB vai ser uma medida fraca e uma meta ruim para o sucesso da política econômica.
Sem dúvida, vão haver muitos paralelos com a crise financeira de 2008 e a Grande Recessão que se seguiu a ela. Hoje, como naquele período, os mercados financeiros estão tumultuados, com preços insanos de ativos guiados pelo estresse financeiro. Hoje, como naquele período, é provável que vá haver um bocado de desemprego gratuito, à medida que os consumidores restringirem suas compras e os trabalhadores perderem seus empregos – desemprego gratuito no sentido de que ele poderia ser evitado se o Congresso americano e o governo Trump tivessem se movido depressa para oferecer o estímulo econômico adequado. (Spoiler: Eles não fizeram isso e nem vão fazer.)
O que é diferente desta, vez, porém, é que algumas das coisas que nós queremos fazer, e que efetivamente temos de fazer se não quisermos centenas de milhares de mortes desnecessárias, vão reduzir por algum tempo o PIB. E isso é ok.
A medida mais óbvia é que nós ainda queremos e precisamos que empregados doentes ou potencialmente doentes fiquem em casa, limitando a propagação do vírus. Alguns destes trabalhadores confinados em casa são capazes de desempenhar suas funções remotamente, mas mesmo em 2020 a maioria dos empregos exige uma presença física. Como resultado, nós vamos ficar sem o PIB que esses trabalhadores poderiam produzir. Pois que assim seja. Produção não é tudo.
Um problema um pouco mais complicado envolve os empregos perdidos por causa do distanciamento social de que nós estamos precisando para desacelerar a propagação do Covid-19. As pessoas não vão e não deveriam ir a restaurantes, fazer compras não-essenciais e por aí vai; isso deixa ociosas as pessoas que em condições normais estariam trabalhando nestes estabelecimentos.
O motivo disso ser um pouco mais complicado é que, com o tempo, os empregados do setor de serviço nos segmentos atingidos poderiam ser recontratados em outras atividades: menos garçons e mais pessoas fazendo entregas. De fato, a Amazon tem dito que precisa contratar mais 100 mil empregados para dar conta da demanda online em ascensão. Se o distanciamento social extremo se tornar o novo normal, não há nenhuma razão fundamental para nós não termos um cenário de emprego pleno; só o que seria necessário seria um cardápio diferente de postos de trabalho.
Mas isso não pode acontecer da noite para o dia, e se nós acharmos que o pior vai passar em alguns poucos meses, na prática faz sentido para a maioria dos empregados dos setores atingidos continuar onde está e não trabalhar durante algum tempo. Isso também quer dizer um PIB menor, mas, de novo, que assim seja.
Ou seja, qual o papel da política econômica nesta situação? O de fazer duas coisas. Primeiro, redução de danos. Remuneração universal para quem for afastado por motivo de saúde deveria ser só o começo; nós também devíamos estar fazendo como a Dinamarca, e subsidiando empresas que continuam a pagar salários. Nós também deveríamos aumentar consideravelmente o auxílio para os desempregados.
Segundo, nós já deveríamos estar canalizando dinheiro para a economia para manter os investimentos em coisas que não deveriam ser afetadas pelo vírus. Não há motivo para as perdas de postos de trabalho causadas pela demanda geral insuficiente.
Nada disso impediria no mínimo alguns meses de contração econômica, ou ao menos não deveria. Mas nós poderíamos fazer muita coisa para tornar esta epidemia menos dolorosa do ponto de vista econômico. Eu queria ter a confiança de que nós vamos fazer mais do que uma pequena fração do que deveríamos fazer.