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A produção não está grande de novo. Por quê?

O governo Trump prometeu repetidas vezes que o corte de impostos de 2017 produziria um enorme boom, com um crescimento de longo prazo acima de 3%

MAKE AMERICA GREAT AGAIN: a promessa de grandes investimentos em infraestrutura não foi cumprida / Ralph Freso | Getty Images (Ralph Freso/Getty Images)
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Da Redação

Publicado em 14 de novembro de 2019 às 12h41.

Quando Donald Trump prometeu Fazer a América Grande de Novo, o slogan significou coisas diferentes para pessoas diferentes.

Para muitos apoiadores, o significado da frase era o de restaurar o predomínio político e social das pessoas brancas, em especial homens brancos.

Para outros, porém, ela queria dizer uma volta ao tipo de economia que nós tínhamos há uma ou duas gerações, que oferecia vários trabalhos viris para machões: fazendeiros, mineradores de carvão e produtores. Ou seja, talvez politicamente importe muito o fato de Trump ter fracassado completamente em apresentar resultados neste front, e os trabalhadores estarem notando.

Claro, muitas das promessas econômicas de Trump eram óbvios absurdos. O esvaziamento do país do carvão é reflexo de novas tecnologias industriais, como a mineração de remoção dos topos de montanhas, que requer pouca mão de obra, além da competição de outras fontes de energia – em especial do gás natural, mas cada vez maior das energias eólicas e solar. Os empregos na mineração não vão voltar, não importa o quanto Trump suje o ar.

E os fazendeiros, que exportam uma grande parcela do que cultivam, deviam ter entendido que o protecionismo de Trump e a retaliação inevitável dos outros países fosse ter um efeito devastador na renda deles. De um modo um tanto irônico, a Trumponomia está na prática transformando os americanos rurais, que são muito mais conservadores do que o país como um todo, em áreas do estado: Neste ano, quase 40% dos rendimentos dos fazendeiros vão vir da assistência comercial, auxílio a desastres, legislação agrícola e indenizações de seguro.

A promessa de Trump de trazer de volta a produção americana não era, à primeira vista, de todo absurda. A América tem um enorme déficit comercial em bens de produção; as importações em alta de fato tiveram um papel significativo para afastar os empregos na indústria depois de 2000. Ou seja, não era loucura imaginar que o protecionismo traria alguns daqueles empregos de volta, mesmo que deixasse a América mais pobre no geral.

Além disso, ainda que a economia geral da América tenha se saído bem durante o segundo mandato do presidente Barack Obama, houve uma queda na produção de 2015 a 2016, o que Neil Irwin do New York Times vem chamando de minirrecessão. Essa queda não teve nada a ver com as políticas econômicas de Obama; era mais uma questão de uma diminuição nos investimentos em energia causada pela baixa mundial dos preços de petróleo. Ainda assim, foi algo que provavelmente colaborou para a vitória eleitoral de Trump. E, de novo, não parecia impossível que Trump pudesse dar um incentivo ao coração do setor produtivo.

Em vez disso, contudo, estamos passando por outra minirrecessão. Ao longo do último ano, o emprego no setor de produção vem caindo consideravelmente em Wisconsin, Michigan e Pennsylvania — precisamente estados em que Trump inesperadamente ganhou por pequenas margens em 2016, o que o deixou por cima.

Sendo assim, por que Trump fracassou em tornar a produção grande de novo? Eu diria que há múltiplas razões.

Primeiro, embora o acolhimento entusiasmado do protecionismo por Trump – “guerras comerciais são boas e fáceis de vencer” – seja uma ruptura com gerações de políticas econômicas americanas, a pauta econômica interna dele está sendo o mais puro vudu da ortodoxia republicana. Isto é, ela se baseou inteiramente na crença de que cortar impostos de pessoas ricas e empresas teria um efeito mágico na economia.

Só que a mágica falhou, como sempre acontece. O governo Trump prometeu repetidas vezes que o corte de impostos de 2017 produziria um enorme boom, com um crescimento de longo prazo acima de 3%; não está acontecendo nada parecido com isso.

E até onde nós podemos notar crescimento, ele foi causado pelo gasto do consumidor. O investimento das empresas, que se esperava que fosse promovido pelo corte de impostos – e que é uma fonte-chave de demanda para os produtores americanos – está na verdade caindo.

O que está segurando o investimento? Muitos analistas culpam a guerra comercial de Trump. As taxas dele tiveram o efeito direto de tumultuar cadeias globais de fornecimento das quais os produtores americanos passaram a depender. O que talvez seja ainda mais importante é a incerteza criada pelas ações erráticas de Trump, que dão às empresas dependentes de importações e às que competem com importações um grande incentivo para deixar na geladeira qualquer plano de expansão que elas tenham.

Eu acrescentaria que a guerra comercial de Trump não é a única fonte de incerteza destrutiva. Ele é um defensor do capitalismo de compadres em tudo, o tempo todo ameaçando punir empresas que ele vê como adversários políticos ao mesmo tempo em que recompensa corporações que fazem favores políticos ou pessoais a ele. Ou seja, até as empresas que não foram muito afetadas pelas medidas comerciais de Trump têm de se perguntar se vão ganhar presentes de Natal ou um pedaço de carvão, o que certamente as desencoraja de fazer investimentos que podem ser desvalorizados com um tuíte presidencial.

Por fim, em muitos casos as taxas impostas por Trump à China não estão favorecendo os produtores americanos; em vez disso, elas só mudaram a fonte de importações delas para outros países, como o Vietnã.

Será que Trump podia ter se saído melhor para impulsionar a produção? Bem, as coisas poderiam ser muito diferentes se ele tivesse de fato cumprido as promessas de campanha que fez de promover grandes investimentos em infraestrutura, o que teria criado muitas vendas para o setor de produção americano.

Do jeito que está, Trump está governando uma economia que, apesar do desemprego baixo, não parece estar em alta para a maioria dos americanos. E ele fracassou totalmente em sua promessa politicamente crucial de tornar a produção grande de novo nos estados-chave.

Uma versão deste artigo foi publicada no dia 1­° de novembro de 2019.

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Quando Donald Trump prometeu Fazer a América Grande de Novo, o slogan significou coisas diferentes para pessoas diferentes.

Para muitos apoiadores, o significado da frase era o de restaurar o predomínio político e social das pessoas brancas, em especial homens brancos.

Para outros, porém, ela queria dizer uma volta ao tipo de economia que nós tínhamos há uma ou duas gerações, que oferecia vários trabalhos viris para machões: fazendeiros, mineradores de carvão e produtores. Ou seja, talvez politicamente importe muito o fato de Trump ter fracassado completamente em apresentar resultados neste front, e os trabalhadores estarem notando.

Claro, muitas das promessas econômicas de Trump eram óbvios absurdos. O esvaziamento do país do carvão é reflexo de novas tecnologias industriais, como a mineração de remoção dos topos de montanhas, que requer pouca mão de obra, além da competição de outras fontes de energia – em especial do gás natural, mas cada vez maior das energias eólicas e solar. Os empregos na mineração não vão voltar, não importa o quanto Trump suje o ar.

E os fazendeiros, que exportam uma grande parcela do que cultivam, deviam ter entendido que o protecionismo de Trump e a retaliação inevitável dos outros países fosse ter um efeito devastador na renda deles. De um modo um tanto irônico, a Trumponomia está na prática transformando os americanos rurais, que são muito mais conservadores do que o país como um todo, em áreas do estado: Neste ano, quase 40% dos rendimentos dos fazendeiros vão vir da assistência comercial, auxílio a desastres, legislação agrícola e indenizações de seguro.

A promessa de Trump de trazer de volta a produção americana não era, à primeira vista, de todo absurda. A América tem um enorme déficit comercial em bens de produção; as importações em alta de fato tiveram um papel significativo para afastar os empregos na indústria depois de 2000. Ou seja, não era loucura imaginar que o protecionismo traria alguns daqueles empregos de volta, mesmo que deixasse a América mais pobre no geral.

Além disso, ainda que a economia geral da América tenha se saído bem durante o segundo mandato do presidente Barack Obama, houve uma queda na produção de 2015 a 2016, o que Neil Irwin do New York Times vem chamando de minirrecessão. Essa queda não teve nada a ver com as políticas econômicas de Obama; era mais uma questão de uma diminuição nos investimentos em energia causada pela baixa mundial dos preços de petróleo. Ainda assim, foi algo que provavelmente colaborou para a vitória eleitoral de Trump. E, de novo, não parecia impossível que Trump pudesse dar um incentivo ao coração do setor produtivo.

Em vez disso, contudo, estamos passando por outra minirrecessão. Ao longo do último ano, o emprego no setor de produção vem caindo consideravelmente em Wisconsin, Michigan e Pennsylvania — precisamente estados em que Trump inesperadamente ganhou por pequenas margens em 2016, o que o deixou por cima.

Sendo assim, por que Trump fracassou em tornar a produção grande de novo? Eu diria que há múltiplas razões.

Primeiro, embora o acolhimento entusiasmado do protecionismo por Trump – “guerras comerciais são boas e fáceis de vencer” – seja uma ruptura com gerações de políticas econômicas americanas, a pauta econômica interna dele está sendo o mais puro vudu da ortodoxia republicana. Isto é, ela se baseou inteiramente na crença de que cortar impostos de pessoas ricas e empresas teria um efeito mágico na economia.

Só que a mágica falhou, como sempre acontece. O governo Trump prometeu repetidas vezes que o corte de impostos de 2017 produziria um enorme boom, com um crescimento de longo prazo acima de 3%; não está acontecendo nada parecido com isso.

E até onde nós podemos notar crescimento, ele foi causado pelo gasto do consumidor. O investimento das empresas, que se esperava que fosse promovido pelo corte de impostos – e que é uma fonte-chave de demanda para os produtores americanos – está na verdade caindo.

O que está segurando o investimento? Muitos analistas culpam a guerra comercial de Trump. As taxas dele tiveram o efeito direto de tumultuar cadeias globais de fornecimento das quais os produtores americanos passaram a depender. O que talvez seja ainda mais importante é a incerteza criada pelas ações erráticas de Trump, que dão às empresas dependentes de importações e às que competem com importações um grande incentivo para deixar na geladeira qualquer plano de expansão que elas tenham.

Eu acrescentaria que a guerra comercial de Trump não é a única fonte de incerteza destrutiva. Ele é um defensor do capitalismo de compadres em tudo, o tempo todo ameaçando punir empresas que ele vê como adversários políticos ao mesmo tempo em que recompensa corporações que fazem favores políticos ou pessoais a ele. Ou seja, até as empresas que não foram muito afetadas pelas medidas comerciais de Trump têm de se perguntar se vão ganhar presentes de Natal ou um pedaço de carvão, o que certamente as desencoraja de fazer investimentos que podem ser desvalorizados com um tuíte presidencial.

Por fim, em muitos casos as taxas impostas por Trump à China não estão favorecendo os produtores americanos; em vez disso, elas só mudaram a fonte de importações delas para outros países, como o Vietnã.

Será que Trump podia ter se saído melhor para impulsionar a produção? Bem, as coisas poderiam ser muito diferentes se ele tivesse de fato cumprido as promessas de campanha que fez de promover grandes investimentos em infraestrutura, o que teria criado muitas vendas para o setor de produção americano.

Do jeito que está, Trump está governando uma economia que, apesar do desemprego baixo, não parece estar em alta para a maioria dos americanos. E ele fracassou totalmente em sua promessa politicamente crucial de tornar a produção grande de novo nos estados-chave.

Uma versão deste artigo foi publicada no dia 1­° de novembro de 2019.

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