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A América fracassa no teste do marshmallow

Em muitas partes dos Estados Unidos, como na Califórnia e na Flórida, o coronavírus ainda está se espalhando

EUA: o país tem mais de 2 milhão de infectados.  (Mike Segar/Reuters)
EUA: o país tem mais de 2 milhão de infectados. (Mike Segar/Reuters)
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Paul Krugman

Publicado em 15 de junho de 2020 às, 16h30.

Última atualização em 15 de junho de 2020 às, 18h25.

O teste do marshmallow é um famoso experimento psicológico que mede a capacidade de uma criança em adiar uma gratificação. Um marshmallow é oferecido às crianças, mas elas ouvem que podem ganhar outro se estiverem dispostas a esperar 15 minutos antes de comer o primeiro. Afirmações de que crianças com força de vontade para aguentar mais tempo se deram muito melhor na vida não têm resistido ao teste do tempo, mas o experimento ainda é uma metáfora útil para muitas escolhas na vida, seja por indivíduos ou por grandes grupos.

Um jeito de pensar sobre a pandemia de covid-19 é que ela representa um tipo de teste de marshmallow social.

A essa altura, temos visto histórias suficientes de como outros países lidaram com sucesso com o coronavírus que nos dão uma impressão clara do que é preciso para acabar com a pandemia. Primeiro, é necessário impor distanciamento social por tempo suficiente para diminuir o número de pessoas infectadas para uma pequena parcela da população. Depois, deve ser implementado um regime de testagem, rastreio e isolamento: identificar rapidamente qualquer novo surto, encontrar todo mundo que foi exposto e colocar essas pessoas em quarentena até que o perigo tenha passado.

Esta estratégia é realizável. A Coreia do Sul fez assim. A Nova Zelândia fez assim.

Mas é preciso ser rigoroso e paciente, sem sair do rumo até que a pandemia esteja controlada, sem ceder à tentação de voltar à vida normal enquanto o vírus continua à solta. Ou seja, como eu disse, é um tipo de teste do marshmallow.

E um teste em que a América está fracassando.

Novos casos de covid-19 e mortes vêm caindo desde o início de abril, mas isso é quase que totalmente devido ao fato de que a região metropolitana de Nova York, depois de um surto horrendo, está fazendo grandes avanços. Em muitas partes dos Estados Unidos - inclusive nossos Estados mais populosos, Califórnia, Texas e Flórida -, a doença ainda está se espalhando. Em geral, o número de novos casos vem se estabilizando e pode até estar começando a subir. Mesmo assim, os governos estaduais estão se movimentando para reabrir de qualquer jeito.

Esta é uma história muito diferente do que está acontecendo em outros países desenvolvidos, mesmo em países fortemente atingidos como a Itália e a Espanha, onde o número de casos novos vêm diminuindo de modo drástico. Hoje parece provável que, até o fim do verão, nós sejamos o único país rico grande em que um grande volume de pessoas ainda está morrendo de covid-19.

Por que nós estamos fracassando no teste? É fácil culpar o presidente Trump, uma criança grande que com toda certeza devoraria aquele primeiro marshmallow e ainda tentaria roubar os das outras crianças. Mas o problema é que a impaciência da América, sua falta de vontade de fazer o que é preciso para lidar com uma ameaça que não pode ser contida com ameaças de violência, tem raízes mais profundas que um homem só.

Não ajuda o fato de os republicanos serem ideologicamente contrários aos programas de assistência social do governo, que são o que têm tornado toleráveis as consequências econômicas do distanciamento social; como eu expliquei recentemente, eles parecem dispostos a deixar o auxílio emergencial, algo crucial, expirar o mais cedo possível. Também não ajuda o fato de que até mesmo medidas de baixo custo para limitar a transmissão da covid-19, acima de tudo o uso de máscaras faciais (que basicamente servem para proteger as outras pessoas), foram engolidas pelas nossas guerras culturais.

Ao que parece, a América em 2020 é desunida demais, com muita gente virando presa de sua própria ideologia e partidarismo, para lidar de maneira eficaz com uma pandemia. Nós temos o conhecimento e os recursos, mas não temos a força de vontade.