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O que o colapso do Silicon Valley Bank nos ensina sobre os ciclos econômicos

Jonas Carvalho da Hike Capital analisa de que maneira o SVB chegou a esse ponto

Na visão da diretora do Fed, esse ponto deveria ser uma das preocupações durante o atual processo de revisão de regulações após quebra do SVB (Sheldon Cooper/SOPA Images/LightRocket/Getty Images)
DR

Da Redação

Publicado em 28 de março de 2023 às 20h31.

Por Jonas Carvalho*

O Silicon Valley Bank (SVB) era um banco comercial dos Estados Unidos especializado em fornecer serviços bancários e financeiros para empresas de tecnologia, Venture Capital e Private Equity. Foi fundado em 1983 na Califórnia e rapidamente se tornou um banco líder no fornecimento de serviços bancários para empresas de tecnologia e startups em estágio inicial. O Silicon Valley Bank foi uma importante fonte de financiamento para muitas empresas de destaque, incluindo a Uber, a LinkedIn, a Mozilla e a Apple. Além dos Estados Unidos, o banco também tem presença internacional em várias regiões, incluindo Ásia, Europa e América Latina. Em 2022, o banco possuía US$211,8 bilhões de ativos e sua falência foi a maior de qualquer banco desde a crise financeira de 2008 e a segunda maior da história dos Estados Unidos.

SVB, até 31 dezembro de 2022 (SVB/Reprodução)

“Estouro da bolha” e o colapso do banco

O colapso do SVB é um clássico exemplo de um “estouro de bolha” de crédito no ciclo de curto prazo, no qual o aperto monetário, restringindo crédito e para conter o crescimento da inflação, levou a uma contração do crédito e da dívida. Semelhante a uma queda de dominó que continua até que os bancos centrais precisem criar mais dinheiro fácil que negue a contração do crédito e da dívida (o que foi exatamente o que o FED fez). Isso produz mais crédito e dívida novas, o que cria as sementes para o próximo grande problema de dívida até que esses ciclos de curto prazo acumulem ativos e passivos de dívida até o ponto em que se tornam insustentáveis. Tudo desmorona em uma reestruturação e monetização da dívida.

Bolhas existem há séculos, em setores e partes do ciclo diferentes. Em 1637, na Holanda, tivemos a Tulipomania: a primeira bolha financeira da história, que foi causada pelo aumento exagerado nos preços dos bulbos de tulipa. Na época, as flores eram tão valiosas que pessoas trocavam ativos produtivos (fazendas, casas, ações de empresas) por elas. Quando uma pessoa resolveu lucrar ao vender o bulbo e um comprador se negou, o mercado percebeu que havia criado uma bolha e o crash ocorreu. Interessante observar que, na época, o governo holandês se dispôs a honrar 10% do valor de cada contrato de flor, porém, com a queda ainda mais acentuada, foi impossível honrar essa promessa.

Em 2008, foi no setor imobiliário residencial americano. E agora está em empresas de capital de risco e private equity de fluxo de caixa negativo e empresas imobiliárias comerciais que não podem lidar com o aumento das taxas de juros e dinheiro mais caro. A dinâmica de contração auto-reforçante é a mesma. Por isso, estudar o passado torna-se uma forma de entender o presente e pensar o futuro.

A dinâmica econômica

Em economias, é importante entender como se dá a relação dos juros, inflação e a produtividade. Essa relação causa a circulação da moeda. No que tange aos juros, as dívidas de uma pessoa são os ativos de outra pessoa e a maioria dos indivíduos está alavancado em posições compradas - possuem ativos financiados por dívidas - seja de ações, imóveis, automóveis a bens pessoais. Quando as taxas de juros sobem e o dinheiro fica escasso, os ativos perdem valor, mesmo que em diferentes velocidades.

Por exemplo, ativos de renda fixa perdem valor se o indivíduo quiser sair à mercado naquele momento, também com o aumento da taxa de juros o produto marginal do capital cai. Investimento na economia diminui. O que reduz o aumento no nível do estoque de capital no futuro e, consequentemente, a produtividade.

Essa relação prejudica devedores, credores, detentores de ativos e intermediários financeiros, causando uma contração e contágio que se auto reforçam. Quando o dinheiro é necessário, os ativos são vendidos a valores menores prejudicando aquele que vende e também, quando os credores são prejudicados, eles reduzem os empréstimos.

Esse movimento clássico também prejudicou o SVB, pois lembrando da relação: as dívidas de uma pessoa são os ativos de outra pessoa, os ativos dos investidores no banco SVB eram passivo para o banco SVB, quando os clientes retiraram o dinheiro, o banco precisava honrar esses depósitos. No entanto, os títulos que eles haviam investido sofreram a Marcação a Mercado (MaM) com a subida de juros, o que fez com que eles não conseguissem honrar com os saques e consequentemente pedindo o Capítulo 11 (falência americana). É um efeito dominó clássico em crises de excesso de moeda.

As relações do ciclo de crédito e seus efeitos

Ainda estamos na fase inicial da fase de contração deste ciclo. A quantidade de alavancagem em posições compradas de ativos ainda é bem grande e existe a probabilidade do colapso bancário seja seguido por muitos mais problemas antes que a fase de contração do ciclo se complete. A história mostra que haverá: vendas forçadas de ativos a preços mais baixos que exigem grandes perdas e diluição de patrimônio líquido. Isto é, vendas a preços que estão em desconto significativo para estimativas conservadoras dos valores presentes dos fluxos de caixa futuros. E preços atrativos de aquisição para empresas sinérgicas fortes comprarem empresas em dificuldades.

Tudo isso aliado ao fato de que problemas de crédito sendo um aspecto negativo para os mercados e a economia e, eventualmente o FED facilitando e os reguladores bancários fornecendo dinheiro, crédito e garantias porque o problema se torna ameaçador para o sistema. Com isso em mente, se pensarmos no passado recente, parece apropriado manter a política monetária de contração. Em contrapartida, se elucubrarmos o futuro, é provável que não demore muito para que os problemas se agravem, o que eventualmente levará o FED e os reguladores bancários a agir de maneira protetora, baixando juros.

Enxergando além do problema presente

Os ciclos maiores da economia: quando as dívidas são em moeda nacional, as crises de dívida e as ramificações resultantes delas podem e serão eventualmente contidas pelos bancos centrais criando dinheiro (injetando liquidez) e crédito suficientes para preencher as lacunas. Lembre-se que o banco central pode emitir moeda. Por exemplo, no caso do SVB, o FED garantiu que honraria todos os clientes que tinham depósitos no banco. Também o FED sinalizou que faria em outros casos de falências bancárias; ele não apenas criou mais crédito, mas também sinalizou que provavelmente agiria de forma semelhante em outros casos. Porém, a pergunta a partir da afirmação acima é: a que custo o dinheiro e o crédito estão sendo criados?

Isso nos leva ao problema muito maior de longo prazo que é o governo dos Estados Unidos ter grande quantidade de dívida em circulação e continuar emitindo mais dívida do que há demanda.

O controle dos problemas econômicos “é financiado” pelo governo e banco central, imprimindo dinheiro e comprando a dívida. Com ativos e passivos de dívida tão grandes, é muito difícil manter as taxas de juros reais altas o suficiente para os credores sem torná-las muito altas para os devedores. O grande problema surgirá quando houver dinheiro demais sendo impresso para fornecer aos credores retornos reais adequados, o que os levará a vender seus ativos de dívida, piorando substancialmente o equilíbrio entre oferta e demanda. Com o tamanho enorme dos ativos e passivos de dívida dos EUA pendentes, e mais ainda por vir, há um alto risco de a oferta de dívida governamental ser muito maior do que a demanda, causando taxas de juros reais muito altas para os mercados e a economia. Isso leva a dor econômica e de dívida que eventualmente levará o Federal Reserve a mudar de aumentar as taxas de juros e vender dívida para reduzir as taxas de juros e comprar dívida. Isso levará as taxas reais a caírem, o que aumentará o risco de haver mais venda de ativos de dívida devido aos maus retornos reais que esses ativos estão fornecendo.

Devemos pensar sobre isso na hora de alocar nosso patrimônio pois a probabilidade de ocorrer essa movimentação de afrouxamento existe e essa mudança terá grandes efeitos, com a possibilidade de causar queda no valor do dinheiro. Aliado a isso, existem a dinâmica de conflitos externos, como o conflito EUA-China e o conflito EUA-OTAN-Rússia, e existem as dinâmicas de conflitos internos como as eleições nos EUA de 2024 que estão por vir.

A partir dessas considerações, cremos que esses próximos dois anos serão anos que devemos ter um cuidado redobrado no ponto de vista de alocação. Por isso, acreditamos que a chave para um bom investimento reside em alcançar um equilíbrio de bons fluxos de retorno e não correlacionados, de modo que a carteira não tenha pouco ou nenhum viés, preparada para qualquer cenário.

*Jonas Carvalho é sócio da Hike Capital - Multi Family Office independente especializado em construção e perpetuação de patrimônio. Gestor de carteiras, possui certificado CGA (Certificado de Gestores Anbima), formado pela Fundação Getulio Vargas em Administração de Empresas com passagem na Columbia University. Também trabalhou no Bank of America Merrill Lynch no time de Investment Banking.

Por Jonas Carvalho*

O Silicon Valley Bank (SVB) era um banco comercial dos Estados Unidos especializado em fornecer serviços bancários e financeiros para empresas de tecnologia, Venture Capital e Private Equity. Foi fundado em 1983 na Califórnia e rapidamente se tornou um banco líder no fornecimento de serviços bancários para empresas de tecnologia e startups em estágio inicial. O Silicon Valley Bank foi uma importante fonte de financiamento para muitas empresas de destaque, incluindo a Uber, a LinkedIn, a Mozilla e a Apple. Além dos Estados Unidos, o banco também tem presença internacional em várias regiões, incluindo Ásia, Europa e América Latina. Em 2022, o banco possuía US$211,8 bilhões de ativos e sua falência foi a maior de qualquer banco desde a crise financeira de 2008 e a segunda maior da história dos Estados Unidos.

SVB, até 31 dezembro de 2022 (SVB/Reprodução)

“Estouro da bolha” e o colapso do banco

O colapso do SVB é um clássico exemplo de um “estouro de bolha” de crédito no ciclo de curto prazo, no qual o aperto monetário, restringindo crédito e para conter o crescimento da inflação, levou a uma contração do crédito e da dívida. Semelhante a uma queda de dominó que continua até que os bancos centrais precisem criar mais dinheiro fácil que negue a contração do crédito e da dívida (o que foi exatamente o que o FED fez). Isso produz mais crédito e dívida novas, o que cria as sementes para o próximo grande problema de dívida até que esses ciclos de curto prazo acumulem ativos e passivos de dívida até o ponto em que se tornam insustentáveis. Tudo desmorona em uma reestruturação e monetização da dívida.

Bolhas existem há séculos, em setores e partes do ciclo diferentes. Em 1637, na Holanda, tivemos a Tulipomania: a primeira bolha financeira da história, que foi causada pelo aumento exagerado nos preços dos bulbos de tulipa. Na época, as flores eram tão valiosas que pessoas trocavam ativos produtivos (fazendas, casas, ações de empresas) por elas. Quando uma pessoa resolveu lucrar ao vender o bulbo e um comprador se negou, o mercado percebeu que havia criado uma bolha e o crash ocorreu. Interessante observar que, na época, o governo holandês se dispôs a honrar 10% do valor de cada contrato de flor, porém, com a queda ainda mais acentuada, foi impossível honrar essa promessa.

Em 2008, foi no setor imobiliário residencial americano. E agora está em empresas de capital de risco e private equity de fluxo de caixa negativo e empresas imobiliárias comerciais que não podem lidar com o aumento das taxas de juros e dinheiro mais caro. A dinâmica de contração auto-reforçante é a mesma. Por isso, estudar o passado torna-se uma forma de entender o presente e pensar o futuro.

A dinâmica econômica

Em economias, é importante entender como se dá a relação dos juros, inflação e a produtividade. Essa relação causa a circulação da moeda. No que tange aos juros, as dívidas de uma pessoa são os ativos de outra pessoa e a maioria dos indivíduos está alavancado em posições compradas - possuem ativos financiados por dívidas - seja de ações, imóveis, automóveis a bens pessoais. Quando as taxas de juros sobem e o dinheiro fica escasso, os ativos perdem valor, mesmo que em diferentes velocidades.

Por exemplo, ativos de renda fixa perdem valor se o indivíduo quiser sair à mercado naquele momento, também com o aumento da taxa de juros o produto marginal do capital cai. Investimento na economia diminui. O que reduz o aumento no nível do estoque de capital no futuro e, consequentemente, a produtividade.

Essa relação prejudica devedores, credores, detentores de ativos e intermediários financeiros, causando uma contração e contágio que se auto reforçam. Quando o dinheiro é necessário, os ativos são vendidos a valores menores prejudicando aquele que vende e também, quando os credores são prejudicados, eles reduzem os empréstimos.

Esse movimento clássico também prejudicou o SVB, pois lembrando da relação: as dívidas de uma pessoa são os ativos de outra pessoa, os ativos dos investidores no banco SVB eram passivo para o banco SVB, quando os clientes retiraram o dinheiro, o banco precisava honrar esses depósitos. No entanto, os títulos que eles haviam investido sofreram a Marcação a Mercado (MaM) com a subida de juros, o que fez com que eles não conseguissem honrar com os saques e consequentemente pedindo o Capítulo 11 (falência americana). É um efeito dominó clássico em crises de excesso de moeda.

As relações do ciclo de crédito e seus efeitos

Ainda estamos na fase inicial da fase de contração deste ciclo. A quantidade de alavancagem em posições compradas de ativos ainda é bem grande e existe a probabilidade do colapso bancário seja seguido por muitos mais problemas antes que a fase de contração do ciclo se complete. A história mostra que haverá: vendas forçadas de ativos a preços mais baixos que exigem grandes perdas e diluição de patrimônio líquido. Isto é, vendas a preços que estão em desconto significativo para estimativas conservadoras dos valores presentes dos fluxos de caixa futuros. E preços atrativos de aquisição para empresas sinérgicas fortes comprarem empresas em dificuldades.

Tudo isso aliado ao fato de que problemas de crédito sendo um aspecto negativo para os mercados e a economia e, eventualmente o FED facilitando e os reguladores bancários fornecendo dinheiro, crédito e garantias porque o problema se torna ameaçador para o sistema. Com isso em mente, se pensarmos no passado recente, parece apropriado manter a política monetária de contração. Em contrapartida, se elucubrarmos o futuro, é provável que não demore muito para que os problemas se agravem, o que eventualmente levará o FED e os reguladores bancários a agir de maneira protetora, baixando juros.

Enxergando além do problema presente

Os ciclos maiores da economia: quando as dívidas são em moeda nacional, as crises de dívida e as ramificações resultantes delas podem e serão eventualmente contidas pelos bancos centrais criando dinheiro (injetando liquidez) e crédito suficientes para preencher as lacunas. Lembre-se que o banco central pode emitir moeda. Por exemplo, no caso do SVB, o FED garantiu que honraria todos os clientes que tinham depósitos no banco. Também o FED sinalizou que faria em outros casos de falências bancárias; ele não apenas criou mais crédito, mas também sinalizou que provavelmente agiria de forma semelhante em outros casos. Porém, a pergunta a partir da afirmação acima é: a que custo o dinheiro e o crédito estão sendo criados?

Isso nos leva ao problema muito maior de longo prazo que é o governo dos Estados Unidos ter grande quantidade de dívida em circulação e continuar emitindo mais dívida do que há demanda.

O controle dos problemas econômicos “é financiado” pelo governo e banco central, imprimindo dinheiro e comprando a dívida. Com ativos e passivos de dívida tão grandes, é muito difícil manter as taxas de juros reais altas o suficiente para os credores sem torná-las muito altas para os devedores. O grande problema surgirá quando houver dinheiro demais sendo impresso para fornecer aos credores retornos reais adequados, o que os levará a vender seus ativos de dívida, piorando substancialmente o equilíbrio entre oferta e demanda. Com o tamanho enorme dos ativos e passivos de dívida dos EUA pendentes, e mais ainda por vir, há um alto risco de a oferta de dívida governamental ser muito maior do que a demanda, causando taxas de juros reais muito altas para os mercados e a economia. Isso leva a dor econômica e de dívida que eventualmente levará o Federal Reserve a mudar de aumentar as taxas de juros e vender dívida para reduzir as taxas de juros e comprar dívida. Isso levará as taxas reais a caírem, o que aumentará o risco de haver mais venda de ativos de dívida devido aos maus retornos reais que esses ativos estão fornecendo.

Devemos pensar sobre isso na hora de alocar nosso patrimônio pois a probabilidade de ocorrer essa movimentação de afrouxamento existe e essa mudança terá grandes efeitos, com a possibilidade de causar queda no valor do dinheiro. Aliado a isso, existem a dinâmica de conflitos externos, como o conflito EUA-China e o conflito EUA-OTAN-Rússia, e existem as dinâmicas de conflitos internos como as eleições nos EUA de 2024 que estão por vir.

A partir dessas considerações, cremos que esses próximos dois anos serão anos que devemos ter um cuidado redobrado no ponto de vista de alocação. Por isso, acreditamos que a chave para um bom investimento reside em alcançar um equilíbrio de bons fluxos de retorno e não correlacionados, de modo que a carteira não tenha pouco ou nenhum viés, preparada para qualquer cenário.

*Jonas Carvalho é sócio da Hike Capital - Multi Family Office independente especializado em construção e perpetuação de patrimônio. Gestor de carteiras, possui certificado CGA (Certificado de Gestores Anbima), formado pela Fundação Getulio Vargas em Administração de Empresas com passagem na Columbia University. Também trabalhou no Bank of America Merrill Lynch no time de Investment Banking.

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