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O "grande incêndio de Londres" e o mercado de crédito

Os recentes acontecimentos envolvendo empresas como Americanas e Light têm voltado os olhares para o cenário de crédito no país

Dinheiro: investidores devem estar atentos às oportunidades geradas em momentos como o atual. (Getty Images/Getty Images)
Dinheiro: investidores devem estar atentos às oportunidades geradas em momentos como o atual. (Getty Images/Getty Images)

Por Rafael Gama*

Os recentes acontecimentos envolvendo empresas como Americanas e Light, têm voltado os olhares para o cenário de crédito no Brasil e a necessidade dos investidores estarem atentos às oportunidades geradas em momentos como o atual.

Nesse cenário, podemos relembrar um grande incêndio que durou quatro dias e devastou a cidade de Londres, em 1666, destruindo aproximadamente 80% da cidade medieval. O Grande Incêndio marcou o fim da Era Tudor e o início da Era Stuart, uma época de transformação e inovação na Inglaterra.

Após o incidente, Londres passou por uma grande reconstrução, liderada pelo arquiteto Christopher Wren, que ergueu diversas construções históricas, onde, entre elas está “O Monumento”, obelisco que marca,  até hoje, o local do início da tragédia. O que antes era cenário de destruição, deu lugar à criação de novos edifícios, praças e ruas mais largas, tornando a cidade mais moderna e eficiente.

Assim como a arquitetura tinha o objetivo de fazer uma contribuição serena e sobretudo funcional para aqueles que utilizavam seus prédios, no mercado financeiro, também é importante ter em mente que a busca por resultados deve estar equilibrada com o objetivo de fornecer soluções adequadas e satisfatórias para os clientes.

Trazendo para um contexto atual, passamos por um “grande incêndio” durante a pandemia do Covid-19 que, devido às medidas de distanciamento social adotadas em todo o mundo, levaram os bancos centrais a adotar políticas econômicas expansionistas para tentar conter as consequências econômicas decorrentes do fechamento das empresas e negócios considerados não essenciais.

Como resultado, o mundo tem enfrentado pressões inflacionárias, incluindo o Brasil, que iniciou um período de aperto monetário em março de 2021, aumentando a meta SELIC de 2%, até agosto de 2022, para os atuais 13,75%.

Os Bancos Centrais enfrentam o desafio de tentar determinar a quantidade ideal de aperto monetário para controlar a inflação para não desencadear uma recessão econômica.

Um dos impactos mais visíveis é o aumento do custo de capital das empresas, o que pode levar à inviabilização de projetos que tinham o VPL positivo, desajustar o fluxo de caixa, dificultar o refinanciamento de dívidas e, em casos extremos, levar empresas à falência.

Com o aumento do custo de capital, diversos setores da economia foram impactados, especialmente aqueles que possuem margens reduzidas, como é o caso do varejo.

Já era de conhecimento público que a Americanas enfrentava dificuldades para lidar com esse período de altos custos de capital, tendo queimado caixa trimestre após trimestre e emitido novas dívidas, incluindo as debêntures LAMEA7 e LAMEA8, ambas emitidas no segundo semestre de 2022.

O caso da Americanas gerou preocupações sobre a possibilidade de um credit crunch, ou seja, uma escassez de crédito no mercado, fazendo com que as empresas tenham dificuldades em obter financiamento para as suas operações.

Também foram afetadas marcas como Light, Oi, Nexpe, Grupo Petrópolis e muitas outras, resultando em mais de 200 empresas entrando em recuperação judicial apenas nos primeiros três meses de 2023.

Com o cenário adverso, investidores venderam posições no mercado secundário e solicitaram resgates de fundos de renda fixa, gerando uma pressão vendedora. Para cumprir as obrigações de resgate, os fundos tiveram que vender suas posições no mercado, gerando um movimento técnico em todo o mercado de crédito brasileiro.

Dentro desse cenário de impacto na abertura dos spreads de crédito, identificamos uma excelente oportunidade de investimento em empresas de alta qualidade, com baixa necessidade de financiamento de curto prazo, boas margens e perfil de dívida prolongado e uniforme. No entanto, em momentos de estresse, é essencial realizar uma análise detalhada de cada emissor para separar as oportunidades de investimento dos riscos.

Após a abertura dos spreads médios das debêntures, medidos pelo índice de IDEX-DI que chegou 2,9 , o que corresponde a um aumento de 100bps em relação ao spread médio observado no início deste ano de 1,9. Revisamos cuidadosamente cada emissor presente em nossa carteira e enxergamos uma grande oportunidade de manter para nossos clientes um carrego satisfatório nos próximos meses, especialmente quando o movimento técnico de liquidação das debêntures no mercado se encerrar e os spreads começarem a fechar, permitindo que possamos surfar uma onda de retornos excepcionais.

Seguiremos atentos aos desafios e mudanças do mercado de crédito brasileiro, analisando e mantendo uma gestão prudente, com uma abordagem estratégica e voltada ao perfil do cliente, para, assim, atingirmos retornos satisfatórios mesmo em períodos turbulentos do mercado de crédito brasileiro.

*Rafael Gama é CFA é graduado em engenharia de produção pela Universidade de Fortaleza com extensão pelo Deggendorf Institute of Technology. Possui experiência na área de assessoria de investimentos e hoje é sócio e Analista Chefe da Grifo Asset Management, gestora independente que atua dois braços: Wealth Management, responsável pela gestão patrimonial de grandes fortunas e Asset Management, que opera na gestão de fundos de investimento.