Inovação: Brasil representa 77% do mercado de startups na América Latina (patpitchaya/Getty Images)
Panorama Econômico
Publicado em 7 de maio de 2025 às 21h18.
Por Ricardo Guimarães, co-CEO da Tori*
Em 2025, o conceito de legado deixou de ocupar apenas discursos sobre sucessão ou filantropia. Cada vez mais, ele se consolida como tese de investimento: uma forma de pensar a alocação com horizonte ampliado, que leva em conta não só o retorno financeiro, mas também o impacto de longo prazo, a coerência com valores e a permanência do capital ao longo dos ciclos.
Essa mudança de perspectiva não apenas transforma o destino dos recursos, mas redefine a forma como risco e retorno são avaliados. O investimento orientado por legado busca resiliência. Não se trata de abrir mão de performance, mas de compreender que o desempenho sustentável nasce de fundamentos sólidos: setores relevantes, modelos de negócio robustos, governança eficaz e visão intergeracional. Não é sobre previsibilidade — é sobre preparação.
Na prática, isso se traduz em maior exposição a ativos e setores capazes de atravessar diferentes ciclos econômicos, como empresas ligadas à saúde, tecnologia, infraestrutura, educação e energia. São investimentos conectados a transformações em curso — e que se sustentam independentemente da direção dos juros ou do ciclo político. É uma abordagem que prioriza consistência no lugar de movimentos táticos e episódicos.
A lógica do legado impõe outra disciplina: a de filtrar ruídos e aprofundar a análise sobre onde o capital realmente faz diferença ao longo do tempo. Em um ambiente global mais fragmentado, o horizonte de longo prazo volta a ser bússola. Investir com horizonte é investir com convicção — e com clareza sobre o impacto gerado ao longo do caminho.
Esse movimento exige também uma mudança cultural. Legado como investimento não se mede apenas em rentabilidade, mas na capacidade de atravessar ciclos mantendo alinhamento com os princípios de quem aloca o capital. Em uma era em que liquidez e velocidade são supervalorizadas, o verdadeiro diferencial passa a ser a paciência estratégica — uma virtude escassa, porém decisiva. Mais do que escolhas financeiras, investir com mentalidade de legado envolve a preservação de valores e a construção de governança familiar robusta.
Há, ainda, um desafio pouco debatido, mas essencial: a conciliação de diferentes visões dentro de uma mesma estrutura familiar. Em muitos casos, o legado precisa ser construído enquanto passa por transições de liderança, de geração e de
território. Essa pluralidade de interesses exige processos bem definidos, governança clara e capacidade de mediação. Investir com mentalidade de legado também significa escutar, alinhar e transformar divergências em estratégia.
O legado, como tese, não é a negação do presente, mas a construção deliberada do futuro. Exige método, exige visão e exige tempo. Mas talvez seja exatamente isso o que diferencia capital que passa — de capital que permanece.
*Ricardo Guimarães é sócio da Tori. Possui 22 anos de experiência no mercado financeiro, com atuação nas tesourarias de instituições como Goldman Sachs, Morgan Stanley e Macquarie, em São Paulo e Nova York. Durante 14 anos, foi trader proprietário, estruturando estratégias com derivativos voltadas para mercados emergentes. No Goldman Sachs, ocupou a posição de Co-Head da área de derivativos para esses mercados. Em 2016, fundou a Vita Investimentos, com o propósito de oferecer uma gestão patrimonial independente, voltada para famílias. Na Vita, foi responsável pela seleção e recomendação de investimentos. É graduado em Engenharia Civil pela Escola Politécnica da Universidade de São Paulo – POLI-USP.