Complexidade disfarçada: surgem ETFs “ativos de fachada” que confundem o investidor (Getty Images)
Panorama Econômico
Publicado em 30 de setembro de 2025 às 21h05.
Por Marcelo Miranda*
Imagine pagar caro por quem promete vencer o mercado — e, na maioria das vezes, falha. O SPIVA, estudo de referência da S&P Dow Jones, é claro: a grande maioria dos fundos ativos não supera seu índice de referência em horizontes de 10 a 15 anos. No caso da América Latina, por exemplo, 72% e 58% dos fundos ativos ficaram atrás do benchmark em janelas de 10 e 15 anos, respectivamente. Em outras regiões, esse número chega a impressionantes 93% dos fundos de ações e 79% de renda fixa que ficam atrás do benchmark em janelas de 10 anos. É como jogar adivinhação com o seu patrimônio, e apostar contra o peso da estatística.
E o que dizem os investidores e especialistas, mesmo fora dos relatórios oficiais? No Reddit, um usuário escreve:
“Quando você compõe os resultados por 20 anos, cerca de 90% dos fundos ativos têm retornos inferiores aos dos fundos de índice de baixo custo e ETFs indexados.”
Ou seja: se você busca consistência e retorno no longo prazo, investir através de ETFs parece um caminho mais interessante. Vamos ver o porquê.
ETFs e gestão passiva: simples, eficaz e poderosa
Custos baixos e transparência total
ETFs passivos carregam custos de gestão significativamente menores do que fundos ativos. A taxa média de ativos passivos pode ser tão baixa quanto 0,10%, enquanto fundos ativos cobram muito mais, corroendo seu rendimento ao longo dos anos.
Além disso, a transparência é total: os ETFs divulgam suas posições diariamente — você vê exatamente no que está investindo.
Eficiência fiscal e flexibilidade de negociação
A mecânica dos ETFs minimiza o impacto de ganhos de capital, ajudando a manter os impostos baixos. E, diferente dos fundos tradicionais, você pode comprar ou vender ETFs ao longo do pregão, com preços alinhados ao valor dos ativos subjacentes, que são geralmente garantidos por um formador de mercado contratado pelas gestoras desses ETFs.
Estabilidade de performance
Ao replicarem índices, os ETFs entregam exatamente o desempenho do mercado — de forma previsível e constante. Se a grande maioria dos fundos ativos não bate seus benchmarks, replicar um índice em termos de retorno significa estar acima da média.
Mas e a gestão ativa? Ainda há quem busque vantagem…
Nos últimos anos, surgiram mais ETFs com gestão ativa. Nos EUA, 51% dos ETFs listados já são ativos, impulsionados por menos barreiras regulatórias e crescente demanda. Além disso, na Europa, esses ETFs têm triplicado os aportes, chegando a €19,1 bilhões em 2024, e a gestora BlackRock projeta um crescimento de 7% para 16% em ETFs ativos até 2030.
Esses veículos oferecem:
· Potencial de retornos superiores;
· Maior flexibilidade para gestão de risco e alocação dinâmica perante cenários voláteis.
Mas ainda assim, muitos custam mais e, estatisticamente, não garantem vantagem sustentável.
O que falta para tracionar (ainda mais)?
Se a passiva entrega mais com menos custo e maior simplicidade, por que os ETFs ainda não dominam completamente o mercado? Eis algumas forças poderosas em jogo:
· Conflito de interesses na indústria: fundos ativos pagam comissões gordas para distribuidores, enquanto ETFs remetem menos incentivo financeiro a quem vende — e isso explica boa parte da resistência à mudança.
· Inércia estrutural e cultural: muitos players ainda estão presos ao modelo “quem cuida faz melhor” — mesmo que os dados mostrem o contrário dessa narrativa.
· Complexidade disfarçada: surgem ETFs “ativos de fachada” que confundem o investidor, diluindo a percepção do que é um ETF genuinamente passivo.
· Desconfiança regulatória: a transparência exigida dos ETFs ativos inviabiliza estratégias mais sigilosas. Mesmo com novidades, como os ETFs semi-transparentes na Europa lançados pela Fidelity, que escondem o portfólio diário para evitar front-running, o mercado reage com cautela.
Agora, se me permite, uma breve provocação:
Se 80% a 93% dos fundos ativos fracassam ao superar seus benchmarks no longo prazo, por que continuamos pagando caro por isso? A resposta está menos no desempenho e mais no sistema — nos incentivos, na tradição e na conveniência dos intermediários.
Até quando você, investidor, vai continuar financiando o lobby do intermediário, em vez de usar seu patrimônio para crescer de verdade?
Quem gosta de discussão com propósito e alinhada aos objetivos financeiros, mais do que de mera retórica, pode se interessar em conversar sobre um modelo de consultoria que olha para resultados reais, e não para produtos.
*Marcelo Miranda é sócio e gestor comercial na Fatori Invest, um Multi Family Office de Santa Catarina. Possui mais de 10 anos de experiência no mercado financeiro focado na gestão patrimonial de clientes e é especialista de investimentos ANBIMA (CEA).