ESG para “inglês ver”
Falar sobre ESG finalmente se tornou normal no Brasil. Antes visto com desconfiança, o mercado brasileiro tem focado mais incisivamente sobre o tema
Publicado em 17 de maio de 2021 às, 15h42.
Por Márcia Scaramela
Falar sobre as questões Ambientais, Sociais e de Governança (ESG, na sigla em Inglês) finalmente se tornou uma normalidade na análise de investimentos do Brasil. Antes visto com desconfiança, ou até mesmo preconceito, o mercado financeiro brasileiro tem, nos últimos dois anos, focado mais incisivamente sobre esse tema, seguindo uma tendência global. Na Europa estima-se que em cinco anos todos os investimentos serão padrão ESG.
Os Estados Unidos não ficam muito atrás: uma pesquisa recente da Man’s group indica que em 2020 houve uma captação recorde de recursos para essa estratégia, que consolidava a soma de mais de USD 17 trilhões. Em outras palavras, um em cada três dólares investidos dos EUA está em algum tipo de mandato ESG, um aumento de 43% em dois anos.
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A TAG como gestora alocadora, talvez por gerir recursos de clientes institucionais e de grandes famílias, muitas delas com essa preocupação em mente, incorporou, há bastante tempo, em seu processo de seleção de fundos de investimentos, uma análise apurada com base em estudos internacionais e inúmeros artigos científicos neste sentido.
Incorporar de fato esses princípios, não é uma tarefa trivial. E nossa preocupação reside em já percebemos nesse despertar de interesse, um movimento grande de camuflagem das atitudes reais diante do tema. Conhecido como greenwashing, ou "lavagem verde”, termo em inglês que se refere a apelos de empresas, produtos ou serviços que usam as mídias e marketing para se rotularem como aderentes às práticas ESG, e mostrarem uma imagem positiva junto à opinião pública e o mercado, é o que mais temos visto.
Nosso papel como alocador reside justamente na tarefa de separar o joio do trigo e verificar se os produtos oferecidos aos clientes são realmente aderentes às melhores práticas de investimentos e princípios ESG. Para seguir nesse papel, preferimos investir um longo tempo para formalizar nossas análises e desenvolver, enfim, as métricas de análise qualitativa e quantitativa para cada letrinha do ESG, de forma a testá-las e desenvolver um Scorecard proprietário para este fim. Acreditamos com isso ter desenvolvido um roteiro que pode ajudar outros investidores a identificar e incorporar ESG aos seus investimentos
Existem basicamente quatro formas de se integrar essas letrinhas ao seu portfólio:
Exclusão: Essa é a forma mais antiga, e a mais comum. Identificando países, setores ou companhias considerados como um risco elevado, cria-se uma lista de ativos “proibidos”. É comum encontrar nas Políticas de Investimentos globais vedações a empresas de setores como arma, tabaco, ou que tenham se envolvido em escândalos recentes, por exemplo.
Impacto: São investimentos que buscam agregar mudanças positivas em seus meios. Com um efeito mais indireto no resultado dos investimentos, são menos comuns no portfólio, mas ainda assim são vistos como uma forma de adicionar (ao invés de excluir) medidas positivas e consequentemente melhorar o “rating de ESG” do portfólio total.
Engajamento: Sob a ótica das companhias a participação dos investidores através do voto, ou a pressão nos conselhos por medidas “pró-ESG”, como aquelas alinhadas com as diretrizes de SDG (Sustainable Development Growth) da ONU, tem crescido significativamente.
Integração: Por último, e talvez mais importante, vem a abordagem que considera os riscos ligados a ESG como parte do processo de avaliação de um determinado investimento, agregando esses aspectos à avaliação tradicional. Desta maneira, ao invés de excluir uma determinada companhia, busca-se estimar quão exposta ela está a riscos como falta de água no mundo, inundações, escândalos de corrupção, risco de imagem por pressões sociais nas mídias etc.
O início do processo para levantamento e confronto de informações, consiste em realizar perguntas direcionadas para nortear a visão sob a ótica de quem investirá:
- Como os fatores ESG influenciam nas decisões da Gestão?
- Qual é a forma como você avalia as questões ESG nas empresas que vocês investem?
- Quais são as principais questões de governança que vocês estão avaliando no momento?
- Como você vê as discussões de composição das diretorias e conselhos?
- Qual é a sua política de votos para questões que ferem os princípios ambientais sociais e de governança?
- Como as novas regulamentações ambientais, ou sociais e de governança podem impactar no preço dos ativos avaliados por vocês (exemplo: regulamentação europeia sobre o peso da carne)?
- A pauta ESG é conduzida por alguém do senior management da empresa?
A análise destas respostas pode guiar o investidor na busca do que faz mais sentido para ele naquele momento, e claramente separa os gestores de recursos que têm levado o tema a sério dos que ainda estão engatinhando, mas querem lucrar com isso.
Por fim, toda gestora é também uma empresa. E os critérios ESG devem ser também colocados em prática dentro de casa.
No caso da TAG Investimentos, temos um forte compromisso com a sustentabilidade buscando impulsionar a inovação disruptiva, a coerência entre discursos e ações e, principalmente, o agir ético, o aprimoramento da liderança, a colaboração e a total transparência. Há muitos anos nos preocupamos com esses temas, seja adotando atitudes internas conscientes e organizadas, para o cumprimento destes parâmetros, bem como para ser um balão de ensaio: Sentir na pele, e distinguir quais as ações um gestor adota efetivamente(!) neste sentido, não apenas tentando um status de “empresa sustentável”, ou um selo para Inglês ver!
Levamos isso a sério e sabemos que muitos que nos leem também, por isso esperamos ter ajudado a elucidar um pouco como colocar esse emaranhado de letrinhas na prática.
Márcia Scaramela é Sócia atuante na Área Comercial Gestão de Patrimônio e Francisca Brasileiro é responsável por Alocação Estratégica da TAG Invest.