Muita gente acredita que, para investir na Bolsa, é preciso operar algum tipo de milagre ( Virojt Changyencham/Getty Images)
Panorama Econômico
Publicado em 9 de junho de 2025 às 14h47.
Última atualização em 9 de junho de 2025 às 14h49.
Por Tonico Dias*
É muito comum ver agentes de mercado e veículos de notícia criarem narrativas de curto prazo que deixam o investidor desconfortável — no fim das contas, muita gente ganha quando você movimenta seu dinheiro. Por isso, é comum vermos um excesso de informação que mais confunde do que ajuda: é perecível, muitas vezes inútil e, não raro, alarmista.
Quando o assunto é investimento de longo prazo focado em dividendos, muita gente já começa a torcer o nariz. É uma estratégia que não tem emoção, exige paciência e praticamente não envolve giro — ou seja, tudo o que muita gente do mercado prefere evitar.
Meu objetivo aqui é destrinchar as três principais falácias relacionadas aos temas “dividendos” e “investimento de longo prazo”.
#1 – Ações de dividendos não crescem
Para esse tópico, é importante trazer luz ao que são os dividendos de uma empresa. Dividendos são a parcela do lucro das empresas destinada aos acionistas como “prêmio” por terem deixado seu capital alocado em grandes projetos, gerando empregos, impostos e valor, de forma geral, para a sociedade.
Luiz Barsi Filho, o maior investidor pessoa física da Bolsa brasileira, percebeu muito cedo algo simples, mas poderoso: a ideia de que os controladores das grandes empresas não viviam exclusivamente de seus salários ou pró-labores, mas que a maior parte de suas rendas era proveniente dos dividendos a que tinham direito por serem sócios de bons negócios.
Com essa ideia fundamental, Barsi desenvolveu, ao longo das últimas cinco décadas, uma estratégia muito coerente de investimentos. Ele se considera um pequeno dono de grandes negócios, um parceiro de longo prazo da companhia e um direcionador de recursos para “projetos futuristas”, como ele mesmo gosta de colocar.
Essa coerência foi — e ainda é — a pedra fundamental para seu sucesso como investidor. Tornou-se bilionário e gera para si vultuosos dividendos anuais. Por ano, Barsi recebe, em dinheiro limpo na sua conta, nada menos que centenas de milhões de reais — mais do que o suficiente para levar uma vida muito confortável e, ainda, comprar muitas ações todos os anos, ampliando sua participação nas mesmas companhias que o remuneram.
"Tá certo, mas ele começou há mais de 50 anos, por isso tornou-se bilionário", você deve estar se perguntando. É aí que você se engana.
Peguemos como caso prático o Itaú Unibanco, hoje o maior banco da América Latina. Nos últimos cinco anos, saiu de um lucro de R$ 26,5 bilhões em 2019 para mais de R$ 40 bilhões em 2024 — um crescimento composto de quase 9%, ou seja, IPCA + 2,5% a 3%.
Aparentemente, não é um resultado muito animador para se tomar um risco na renda variável, afinal, tivemos janelas de IPCA + 7% no Tesouro IPCA de prazo longo.
Aí é que mora o “pulo do gato” na estratégia de investimento em dividendos: enquanto o IPCA + 7% garante um excelente retorno em um prazo determinado, há o risco de reinvestimento — ou seja, será que, ao final desse prazo, haverá algum título pagando esse mesmo retorno?
Enquanto investidor de dividendos, ao comprar uma ação do Itaú Unibanco, você se expõe a um título sem vencimento (a ação), que paga cupons mensais simbólicos (dividendos mensais) e, pontualmente, cupons maiores (dividendos intercalares). Ao receber esses dividendos, é possível alocá-los em outras ações da sua carteira — seja outro banco mais descontado, uma empresa de transmissão de energia elétrica ou, até mesmo, uma seguradora.
Em outras palavras, você usa empresas que geram retornos satisfatórios e pagam dividendos para potencializar esse retorno, comprando outras empresas da sua carteira que estejam descontadas — na prática, você usa o mercado a seu favor, aplicando uma estratégia simples e prática que, com disciplina e bons preços de entrada, pode buscar retornos superiores a IPCA + 7% no longo prazo.
#2 – É preciso ser especialista em investimentos para vencer na Bolsa
Muita gente acredita que, para investir na Bolsa, é preciso operar algum tipo de milagre, ser um grande gênio ou até receber informações privilegiadas.
Nada disso é necessário — são apenas lendas urbanas.
Para vencer na Bolsa e garantir uma aposentadoria digna para você e uma vida confortável para sua família, são necessárias três coisas: (i) uma metodologia que você siga pelo resto da vida, faça chuva ou faça sol, (ii) aportes consistentes e (iii) tempo.
Imagine dois investidores. Um deles recebe uma herança de R$ 500 mil e se dedica a acompanhar o mercado dia e noite, lê todos os balanços, notícias, acompanha conferências de resultados e obtém um retorno de 15% ao ano por 10 anos — atingiria R$ 2 milhões. Um segundo investidor começa com 70% a menos de capital inicial, R$ 150 mil, foca no seu trabalho para melhorar como profissional, poupa R$ 8 mil por mês e alcança uma rentabilidade bem menor, de 11% ao ano. Este último termina com mais dinheiro do que o primeiro: R$ 2,1 milhões.
No geral, se você seguir uma estratégia básica cinquentenária, desenvolvida por um simpático bilionário chamado Luiz Barsi Filho, a conta é: se você começar do zero, o valor mensal do aporte será o valor que você receberá em dividendos em um prazo próximo de cinco anos. Se você tiver um bom aporte inicial, esse processo se acelera ainda mais.
Traduzindo: aporte e tempo são muito mais importantes do que buscar a grande porrada. Isso significa que investir recorrentemente em boas empresas, que geram bons lucros e pagam bons dividendos a preços adequados, já basta para atingir sua liberdade financeira em poucos anos.
#3 – Vou seguir o que o bilionário está fazendo e ficar rico
Por mais simples que seja a metodologia desenvolvida por Barsi, é preciso ter cuidado.
É muito comum ver investidores iniciantes comprarem ações de empresas que estão em um momento delicado de endividamento ou de ciclo de negócio apenas porque ouviram algum investidor bilionário dizer que estava comprando.
É preciso ter humildade para entender que cada realidade é única — e isso exige uma postura diferente no mercado de ações.
Uma senhora aposentada, sem renda ativa e com capital restrito para viver, não pode ter uma carteira semelhante à de um empresário de 30 anos de idade, que consegue aportar R$ 50 mil mensais. São pessoas, momentos e tolerâncias diferentes.
Dessa forma, entendemos que existem três abordagens para aplicar uma boa estratégia de dividendos:
1. A estratégia pura e simples adotada por Barsi no início de sua jornada como investidor: focar em setores altamente perenes, respeitar os preços-teto médio e projetivo de 6% de dividendos, comprar, comprar, comprar e, de preferência, nunca vender. Aqui, importa muito mais a qualidade da carteira do que o dividendo que a ação proporciona — embora seja fundamental respeitar o preço-teto. O alvo é de 6% a 10% ao ano em dividendos.
2. A segunda abordagem seria voltada para aquela aposentada que mencionei: trata-se de privilegiar ações que estejam pagando excelentes dividendos (em torno de 8% a 12% ao ano), mesmo que se sacrifique um pouco da qualidade da carteira. Em outras palavras, as trocas de ações (venda para compra de novas) se tornam práticas comuns para garantir um bom dividendo vitalício.
3. Por último, a abordagem voltada para o investidor com alta capacidade de aporte e uma renda ativa confortável. Esse pode ter exposição não apenas a ativos que pagam bons dividendos hoje, mas também àqueles que poderão pagá-los no futuro — como commodities e empresas de setores perenes que estejam em um momento delicado. O objetivo aqui são dividendos de 5% a 7% ao ano, com expectativa de rentabilidade maior no longo prazo.
A desmistificação de todas essas afirmações é um trabalho constante de educadores e gestores de investimentos como nós. São necessários muitos anos para mostrar à sociedade que um mercado de ações fortalecido e saudável tornará nosso país muito mais próspero do que simplesmente aceitar aplicar nossos recursos na renda fixa, onde há muito menos geração de valor para as próximas gerações.
Investir na Bolsa, além de fundamental, é um excelente benefício para a consciência daqueles que acreditam que nosso país pode ser muito melhor.
Por fim, uma provocação: você conhece algum bilionário da renda fixa?
*Tonico Dias é gestor de investimentos da AGF Wealth e sócio do AGF, grupo fundado em 2019, focado em educação para investidores, utilizando a metodologia de investimento em ações de dividendos de Luiz Barsi Filho. O AGF tem uma comunidade de mais de 400 mil investidores, 35 mil alunos formados em cursos, consultoria de investimentos e gestora de recursos.