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Diversificação sem fronteiras: o caminho para um portfólio mais seguro e eficiente

Por que investir além das fronteiras pode proteger seu patrimônio e ampliar oportunidades

Investimentos em dólar são complementares ao portfólio denominado em reais, já que oferecem diversificação em relação aos riscos domésticos. (Getty Images/Getty Images)

Investimentos em dólar são complementares ao portfólio denominado em reais, já que oferecem diversificação em relação aos riscos domésticos. (Getty Images/Getty Images)

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Panorama Econômico

Panorama Econômico

Publicado em 9 de setembro de 2025 às 13h42.

Quando se fala em investimentos, talvez o brasileiro seja um dos povos que menos investem em outras geografias. Comparativamente, concentramos muito em ativos domésticos e muito pouco em ativos globais. Os estudiosos em psicologia financeira denominam esse viés como home bias, cuja tradução literal é “viés de casa”. De forma mais clara, no mundo dos investimentos, trata-se do investidor que possui apenas ativos locais, acreditando que os investimentos no Brasil superam todas as alternativas disponíveis em outros países.

Segundo a Forbes Brasil, em 2022 apenas 2% da poupança dos brasileiros estava aplicada fora do país. Para se ter uma ideia, países comparáveis ao Brasil, como Chile e México, possuem percentuais muito maiores: cerca de 50% e 16%, respectivamente, da poupança alocada em ativos no exterior.

Existem alguns fatores que exacerbam esse viés: historicamente, o Brasil tem uma taxa de juros muito alta; há a percepção de risco cambial e, consequentemente, de maior volatilidade no portfólio de investimentos; soma-se a isso a falta de conhecimento sobre como investir no exterior e, por fim, a burocracia do processo de internacionalização dos investimentos.

O principal argumento para essa distorção é justamente a taxa de juros elevada. Não cabe aqui detalhar, mas essa taxa é tão alta devido a uma série de problemas estruturais do país. Convivemos, há muito tempo, com juros médios de dois dígitos. Dessa forma, o investidor acaba pressupondo que a melhor alternativa seria alocar 100% de seus recursos no CDI, em vez de diversificar em outra moeda. Mas será que essa inferência está correta?

Se o investidor observar janelas de mais longo prazo, por exemplo, de 2015 até hoje, e comparar o resultado de uma carteira aplicada 100% no CDI com outra aplicada em ativos que rendessem 5% ao ano em dólar, ficará nítida a importância da diversificação. Nesse período, a taxa cambial do dólar saiu de R$ 2,70 para R$ 5,45. Enquanto isso, o CDI rendeu 163,71% em dez anos. Já a carteira dolarizada, considerando a valorização cambial somada ao retorno de 5% ao ano em dólar, teria rendido 440,69%, ou 270% do CDI.

Um estudo recente conduzido pela FGV mostra que o impacto do câmbio no consumo dos brasileiros é maior do que se imagina. A pesquisa conclui que entre 16% e 18% da cesta de consumo das famílias está exposta às variações cambiais. Na prática, isso significa que mesmo quem nunca investiu no exterior já sofre os efeitos cambiais diariamente — seja ao abastecer o carro, comprar medicamentos ou pagar por eletrônicos. Quando somamos a isso os benefícios clássicos da diversificação global — acesso a setores não disponíveis na B3, redução de risco político e geográfico e ampliação de oportunidades — o percentual recomendado tende a ser ainda mais elevado.

Outro ponto que poderia assustar é a volatilidade. As fortes oscilações do dólar podem incomodar o investidor que não tem perfil adequado para suportá-las. Essas flutuações costumam ser um obstáculo para quem é muito conservador em seus investimentos no Brasil. Outro desconforto comum é a dúvida sobre como investir lá fora. Por muito tempo, não havia uma base de informação acessível, mas hoje a realidade é diferente. Nos últimos anos, houve grande sofisticação do mercado de capitais brasileiro; a internet e a imprensa especializada se desenvolveram e oferecem informações abundantes sobre o tema. O ecossistema foi criado para atender a esse público, fornecendo informação e reduzindo a burocracia do processo.

Nota-se, ainda que de forma tímida, um movimento de dolarização dos ativos no Brasil. Esse fenômeno acompanha o financial deepening do mercado local, ou seja, a sofisticação do sistema financeiro. Nesses anos, vimos as principais plataformas de investimento lançarem fundos espelho de grandes fundos globais; a própria B3 passou a negociar BDRs; corretoras ofereceram contas globais; e, no segmento private, bancos americanos e suíços se estruturaram em parceria com Multi-Family Offices para atender melhor esse público.

Como defendido acima, o investidor com perfil mais sofisticado deve pensar em uma maior diversificação global. Os benefícios são muitos: descorrelação da carteira, redução do risco local (especialmente frente às crises brasileiras), amplo acesso a produtos e, consequentemente, construção de uma carteira mais sofisticada. Outro ponto importante é que, com uma carteira diversificada, o investidor pode criar um sistema de balanceamento bem definido entre a parcela Brasil e a internacional, aproveitando a volatilidade tanto do câmbio quanto dos ativos locais.

Usando essa ideia, suponha que um investidor possuísse uma carteira diversificada com 50% em renda fixa no Brasil, 25% em fundos multimercados e renda variável no Brasil e 25% em ativos dolarizados em uma conta no exterior. Em 2024, os ativos domésticos tiveram desempenho muito ruim — até mesmo a renda fixa local performou mal, e os ativos de risco, ainda piores. Nesse ano, os multimercados renderam bem abaixo do CDI e a bolsa caiu mais de 10%. Se o investidor tivesse ativos prefixados ou atrelados ao IPCA, seu resultado seria ainda mais negativo. Por outro lado, houve uma desvalorização cambial de cerca de 27%. Se a carteira internacional tivesse rendido 5% em dólar (um pouco acima dos títulos da dívida americana), no conjunto total, somando câmbio e performance, essa parcela teria rendido mais de 32% em 2024 — uma simples diversificação que mais do que compensou o desempenho da “carteira Brasil”.

Esse investidor sofisticado certamente passaria de forma mais tranquila pelos momentos complicados de mercado. Ele poderia, inclusive, rebalancear sua carteira: como a parcela dolarizada se valorizou muito acima dos 25% originais, venderia o que subiu e compraria o que caiu, criando uma sistemática de vender o que está “caro” e comprar o que está “barato”. No longo prazo, uma prática como essa tende a melhorar a performance da carteira. Vale destacar que, em um ano em que a economia brasileira estivesse em alta, o dólar poderia cair e os ativos locais performarem bem. Por isso, em muitos casos, é recomendado manter uma parcela de renda variável local para compensar movimentos contrários. O ano de 2019, por exemplo, foi exatamente o oposto de 2024. A estruturação profissional de uma carteira de investimentos deve sempre buscar esse balanceamento de riscos.

Ao longo do tempo, a tendência é que o brasileiro busque maior dolarização dos ativos, mesmo que abaixo do ritmo considerado ideal. As novas gerações têm acelerado esse processo. O investidor deve considerar essas possibilidades em suas alocações. Esse movimento deve contribuir para a construção de um portfólio mais moderno, descorrelacionado, seguro e eficiente.

 

*Carlos Henrique Chaves Pessoa, fundador, CEO e CIO da Vêneto Multi Family Office